Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 14, 2008

André Petry


As coisas estranhas

"Se Teixeira tinha permissão para usar o nome de Lula, é bomba de nêutrons. Se não tinha, talvez Lula queira censurá-lo, até romper com ele pelo abuso da amizade e pela prova cabal de deslealdade"

Uma das leis clássicas da política informa que político jamais diminui seu poder por vontade própria. Pode renunciar a ele, mas, enquanto não o fizer, moverá montanhas para mantê-lo ou ampliá-lo. Reduzi-lo, jamais. É por isso que político nunca antecipa sua sucessão. Fazê-lo equivale a encurtar seu mandato, expor-se ao risco de deixar o ponto mais iluminado do palco ou ter de dividi-lo com outros. Equivale, no leilão diário de impressões e informações de que se constitui a política, a apresentar-se menor, enfraquecido, como ficam todos os políticos às vésperas de perder a potência. Um pato manco, como dizem os americanos. Por isso, o movimento do presidente Lula na semana passada fere uma lei clássica da política. E isso é estranho.

Lula disse, pela primeira vez com clareza, que a ministra Dilma Rousseff é "o nome do PT" para suceder-lhe em 2010. Lula está antecipando a disputa por sua sucessão, faltando ainda trinta meses para ir embora. Políticos não fazem isso. Por que Lula fez? Será que Dilma não é o "nome do PT", e Lula apenas o soltou para ver se cola no partido? Será que quer jogar Dilma às feras, distraindo as feras do verdadeiro candidato?

É estranho… Lula encarregou-se de explicar seu gesto precoce. Disse que Dilma é perseguida porque é candidata. A prova seria a cascata de denúncias. Primeiro, foi o dossiê com os gastos do ex-presidente FHC. Agora, veio a pressão para vender a Varig à Gol por preço módico. Com tanto canivete chovendo, Lula quis proteger a ministra, oferecendo-lhe um abrigo. Então, lançou-a candidata sabendo que é perseguida por ser candidata? E colocou-a sob suas asas, correndo o risco de reduzir seu próprio poder?

É estranho… Lula nunca reduziu seu poder para defender quem quer que seja. Reformulando, em nome da precisão: entre José Dirceu e Matilde Ribeiro, Lula já defendeu quem quer que seja, sempre pondo "a mão no fogo" pelo acusado da hora, mas para preservar seu poder, nunca para reduzi-lo. Por que faria isso agora por Dilma? Por que a ministra habita seu coração e fazê-la sua sucessora é a meta superior de Lula, ainda que isso lhe custe nacos de poder a dois anos e meio do fim?

É estranho… O escândalo da Varig é do tipo que faz muito ziguezague, mas acaba no coração do governo. Denise Abreu, ex-funcionária graduada, acusou Dilma de pressioná-la para facilitar a venda da Varig à Gol. Como não há provas materiais, a ministra poderá defender-se na linha tênue que separa pressão de pressa. Mas Denise Abreu também fez uma acusação fortíssima: disse que sofreu pressão "imoral" do advogado Roberto Teixeira, compadre de Lula, que dizia falar em nome do presidente. E nada acontece?

É estranho… A acusação precisa ser esclarecida. Denise Abreu está mentindo? Se o advogado tinha permissão para usar o nome de Lula, é bomba de nêutrons. Se não tinha, talvez Lula queira censurá-lo, até romper com ele pelo abuso da amizade e pela prova cabal de deslealdade. Em vez disso, Lula preferiu lançar Dilma, proteger Dilma, defender Dilma. É a receita perfeita para Dilma nunca mais deixar os holofotes. Considerando que na política, tal como na física, dois corpos não ocupam o mesmo espaço, talvez nada disso seja tão estranho.

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