Site vende arquivos de som como drogas digitais
que devem produzir efeito psicodélico virtual
Montagem sobre fotos de Alexandre Schneider |
Jackson Araújo, que testou algumas das "drogas" numa pesquisa: só barulho |
Um computador, um arquivo sonoro, um par de fones de ouvido e disposição para ouvir durante meia hora sons desconexos em alto volume. Essa estranha combinação tem atraído milhares de internautas para o site I-Doser. O motivo é que tais ruídos são vendidos como drogas digitais, com poder de provocar sensações idênticas às de drogas reais, como cocaína, maconha e heroína. Os efeitos prometidos não têm respaldo científico algum. Mas despertam curiosidade. Na semana passada, o site lançou 25 novos produtos – entre eles LSD e orgasmo. Em 24 horas, foram feitos 150.000 downloads de seu novo aplicativo. O catálogo contém 75 produtos que chegam por e-mail, a preços entre 2,50 e 4,50 dólares a dose. Há ainda a opção de testar amostras grátis, direto da página do I-Doser.
A idéia de usar sons como droga surgiu em 2001 com John Ashton, um programador de áudio nova-iorquino de 31 anos. Sua primeira invenção foi a maconha, lançada em 2005. "Demorou muito para as pessoas acreditarem no potencial do I-Doser", disse Ashton a VEJA. O princípio da droga digital é a técnica binaural beats, descrita pelo físico alemão Heinrich Dove em 1839. Segundo o cientista, se freqüências distintas são reproduzidas em cada ouvido, o cérebro produz um terceiro sinal, correspondente à diferença entre os sons originais. A nova freqüência teria o poder de alterar o estado de consciência do usuário.
Quase 170 anos depois, a eficácia da técnica não foi comprovada. Nos últimos anos, foram publicados sete estudos sobre a binaural beats em jornais científicos internacionais. Todos com resultados inconclusivos. "As promessas do I-Doser não são sustentadas por nenhuma evidência científica", afirma Helané Wahbeh, pesquisadora americana que coordenou dois estudos sobre a técnica na Faculdade Nacional de Medicina Natural, em Portland. Para Helané, o mais provável é que os arquivos sejam placebos, ou seja, drogas de mentira, com resultados provenientes de auto-indução. O I-Doser tem pelo menos uma vantagem real: não é ilegal. "São experiências sonoras. Não há incitação ao tráfico ou ao uso de drogas", observa Antônio Cabral, do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV-RJ.
O site chamou a atenção da consultoria brasileira Box1824, que estuda tendências de comportamento, e motivou um projeto de pesquisa. Jackson Araújo, de 42 anos, foi um dos que testaram o I-Doser a pedido da consultoria. Com as doses de ópio e maconha, ele teve apenas uma sensação de sossego, semelhante à provocada por outras músicas relaxantes. Já a dose de cocaína causou irritação, ansiedade e uma baita dor de cabeça. "Não agüentei nem dez minutos. Parecia uma turbina de avião", diz.
A página da empresa na internet: 75 produtos |