Entrevista:O Estado inteligente

sábado, maio 05, 2007

A pornografia cresce nos EUA e quer ser respeitada

Pornô com carteira assinada

A indústria pornográfica americana cresce, adota
novas técnicas empresariais e agora quer vender
a idéia de que tem "valores"e é "respeitável"

O único momento em que a indústria de pornografia dos Estados Unidos costuma demonstrar algum recato é na hora de exibir seus números. Mas já faz tempo que o dinheiro movimentado pelo "entretenimento adulto" – para utilizar o eufemismo consagrado no setor – está na casa dos bilhões. Estima-se que os americanos gastem de 7 bilhões a 14 bilhões de dólares por ano em material pornográfico. Peter Acworth encontrou seu lugar no meio desse mercado competitivo atendendo a uma demanda especializada. Ele tem um portal na internet dedicado ao sadomasoquismo e ao bondage – a prática do sexo com participantes atados ou acorrentados. Seu portal traz imagens cruas, chocantes até, mesmo pelos parâmetros da pornografia: mulheres amarradas, torturadas com choques elétricos e seviciadas por máquinas. Mas também tem uma seção, com o singelo título de "valores", na qual estão listados os parâmetros éticos que supostamente regem a empresa. A relação inclui de vantagens trabalhistas a normas de segurança para a filmagem de cenas de sexo (veja exemplos no quadro abaixo). Os tais valores revelam o surgimento de uma nova "cultura corporativa" no mundo pornô. Os "empresários" de medalhão no peito e palito de dente na boca estão dando lugar a jovens com formação universitária, métodos de administração modernos e um discurso mais asséptico, que tenta enquadrar a pornografia como uma espécie de normalidade alternativa. Um dos mais populares sites eróticos dos Estados Unidos promete "entretenimento adulto saudável e americano".

Tony Avelar/AP
Peter Acworth, dono de um site de sadomasoquismo: chicotinho comportado


Nos Estados Unidos, a pornografia sempre deu ensejo a discussões jurídicas sobre a extensão da liberdade de expressão. O consenso que se tem firmado é que a pedofilia é inadmissível. De resto, virtualmente tudo o que for feito de livre e espontânea vontade por dois (ou três, quatro...) adultos está valendo. A aceitação social da pornografia foi crescendo à medida que a tecnologia permitiu que o seu consumo se tornasse cada vez mais privado. O videocassete, a partir dos anos 80, ampliou o público dos filmes pornô, ao poupar o espectador do constrangimento de ser visto na fila de um cinema-espelunca. A indústria de filmes continua forte em DVD: lançou 7.000 novos títulos no ano passado. O sistema pay-per-view, porém, está roubando parte desse público – afinal, ele dispensa a visita a uma locadora. No ano passado, estima-se que a pornografia tenha respondido por um terço do 1,6 bilhão de dólares que os americanos pagaram por filmes pay-per-view.

A internet também é um grande veículo para o pornô. Peter Acworth percebeu isso em 1998, quando abandonou um curso de pós-graduação em administração na Universidade Columbia para se dedicar ao seu novo negócio. Os assinantes de seu portal hoje somam 60.000, cada um deles pagando 30 dólares por mês para ter acesso a vídeos com as mais variadas esquisitices sexuais. Os propalados "valores" do site querem dar um certo sentido educacional ao conteúdo vendido ali. O objetivo seria combater o preconceito que cerca o sadomasoquismo. Antigos heróis da pornografia, como Larry Flynt – criador da revista Hustler, que enfrentou vários processos nas cortes americanas –, apresentavam-se como transgressores, à margem da moral dominante. Um tanto edulcorado na versão cinematográfica de Milos Forman (O Povo contra Larry Flynt), Flynt é um tipinho desagradável, que sempre ganhou a vida com a sujeira e lutou pelo direito – garantido pela Constituição americana – de continuar sujo. Sintonizado no discurso da "tolerância" propagado pela correção política, Acworth tem outras reivindicações: deseja ser aceito, abraçado como um membro produtivo da sociedade.

A sociedade nem sempre é tão compreensiva. A empresa de Acworth comprou, no início do ano, um prédio histórico de São Francisco, o antigo arsenal da Guarda Nacional, em um negócio de 14,5 milhões de dólares. É hoje a sede da empresa, incluindo os estúdios de filmagem. Moradores da vizinhança montaram protestos contra a presença da companhia. Acworth respondeu em um artigo no jornal San Francisco Chronicle. Argumentou que o prédio, reformado, estava recuperando sua "beleza histórica" e ainda serviria de cenário para filmes que ele qualifica de "artísticos" – ainda que a arte, é claro, não entre nessa história nem amarrada.



CRIMES ANÔNIMOS NO

Na semana passada, um caso de pedofilia aprofundou a controvérsia sobre o anonimato na popular comunidade de relacionamentos Orkut. Um usuário com o apelido de "Tenente C" expôs em seu álbum pessoal doze fotos, a maioria de meninas nuas, algumas delas sendo abusadas. A ONG SaferNet Brasil, que coleta casos de crimes on-line e os encaminha ao Ministério Público, recebeu mais de 1 000 denúncias sobre o fato, o que levou o Orkut a retirar do ar a página criminosa. "O que temos visto nesses casos é que a página sai do ar, mas não há punição. Isso incentiva o criminoso a continuar", diz Thiago Tavares Nunes de Oliveira, presidente da SaferNet. Foi o que aconteceu. O Tenente C criou mais três perfis (o nome que recebem as páginas pessoais no site), divulgando as mesmas fotos. O Orkut – site filiado ao Google – diz que está tomando providências para garantir o "conteúdo saudável" do site, incluindo filtros tecnológicos, monitoramento de conteúdo e parcerias com autoridades brasileiras. No caso do Tenente C, essas medidas se mostraram insuficientes. Somente divulgando o IP (espécie de assinatura digital dos computadores na rede) do criminoso é que se poderia identificá-lo. O Orkut ainda não fez isso, alegando que os dados estão sob custódia da matriz americana do Google. Os anônimos aproveitam-se dessa morosidade para propagar o crime na internet.





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