Mauro Chaves
Não será um valor ético fundamental a pura sinceridade, a correspondência entre a palavra, o pensamento, a convicção e o comportamento? E, sendo assim, haverá sinceridade em achar que é possível aos católicos jovens se abster de manter relações sexuais antes do matrimônio, dispensando, por esse motivo, o uso da camisinha? Ou será benéfico o deslavado engodo, pelo qual se finge seguir uma norma e não se a segue - seja no banco dos templos, na janela dos confessionários ou no recôndito dos conventos?
Que explicações a dar para a manutenção do celibato clerical? Se a família é a célula mater da sociedade, se a Igreja Católica é a maior defensora da família, por que justamente àqueles encarregados do ministério sacerdotal é vedada a constituição de uma família? O motivo alegado no passado, de que a missão do religioso não pode ser dificultada por compromissos familiares, não se choca com o observado em todas as demais religiões? Os que exercem seu ofício - sejam pastores, rabinos, pais-de-santo ou que qualificação se dê a sua profissão religiosa - não são sempre ajudados por sua própria família? Por que, então, só a família do religioso católico atrapalharia seu trabalho?
Que condições terá para dar orientação sobre relacionamento conjugal quem jamais experimentou uma relação conjugal? Ou será que a vivência pessoal de nada vale? Melhor não seria, então, que a Igreja revelasse os verdadeiros motivos pelos quais preserva o antinatural celibato, tão oposto à divina exortação do “crescei e multiplicai-vos”? Não seria mais digno e respeitoso confessar para seu rebanho que a razão do celibato é apenas de sucessão hereditária e de ordem previdenciária? Por que não revelar que a Igreja é testamentária ou legatária de todas as pessoas que entram numa de suas ordens religiosas e que, numa sucessão hereditária, seria preterida por filhos e cônjuges, caso não houvesse o celibato? E por que não confessar sua enorme preocupação em ter de assumir eventuais encargos sobre órfãos de seus sacerdotes?
Por que uma pessoa que se separou - e apenas é capaz de entender as razões de uma separação quem já experimentou a vivência de uma união -, caso não tenha sofrido a viuvez, está impedida, se professa o catolicismo, de unir-se a outra pessoa e até de construir uma nova família? Será desejável para a Igreja Católica que os filhos dos segundos casamentos (de pais católicos) permaneçam com a mesma religião ou o objetivo da Igreja é excluí-los, de vez, de seu meio? Se não é, por que a exclusão dos divorciados da Igreja? Mesmo que esta não consiga impedir divorciados católicos de formar novas famílias, e os filhos? Verão seus pais portarem crachás de excomungados?
Qual o verdadeiro motivo pelo qual as mulheres não têm o mesmo direito de ministrar todos os Sacramentos da Igreja - não apenas em casos in extremis? Por que não existem sacerdotisas, bispas e religiosas que possam integrar o Conselho de Cardeais que, no Vaticano, elege o papa? E por que não uma papisa (de verdade, não disfarçada de homem)? Por acaso para a Igreja Católica a mulher é considerada menos capaz de exercer o ofício religioso, com menor grau de religiosidade ou com menos habilidade (e menos experiência) para a orientação espiritual das famílias?
Qual o motivo das vestes exuberantes do papa, dos cardeais e dos bispos? Por que os mantos de tecidos preciosos, as roupas resplandecentes que apenas evocam riqueza e opulência, em contraste chocante com a situação dos pobres do mundo? Será que a idéia que permanece, vinda de tempos imemoriais, é a de que tais vestes inspiram a sensação de poder e de força? Mas não seria desejável que os carentes do mundo - aqueles que mais necessitam do apoio da Igreja - mirassem o exemplo justamente contrário, de humildade, de despojamento, de recusa aos sinais exteriores de riqueza, o que estaria muito mais consentâneo à imagem emblemática do próprio Cristo - e à expressiva referência de um São Francisco? Enfim, o que tem que ver toda a pompa papal e cardinalícia com Jesus Cristo?
Os templos católicos não deveriam estar sempre abertos para quem quer que neles pretendesse entrar e fazer suas orações, independentemente de rígidos horários - como se fossem repartições públicas -, já que as necessidades espirituais das pessoas nem sempre surgem com hora marcada? Terá sentido trancar as portas das Igrejas com cadeados? E o que dizer dos templos católicos em que existem até cercas eletrificadas para impedir a entrada de “estranhos” - sejam quais forem os problemas de “segurança” que enfrentem, já que a violência do eventual furto jamais poderá ter como resposta outra violência certamente maior, como seria a da eletrocução de um ladrão, no muro de uma Igreja?
Que caridade haverá para uma mulher, ao impedi-la de interromper uma gravidez gerada por violento estupro, ou exigir que passe pelo sofrimento de preservar em seu ventre um ser sem cérebro, com nula possibilidade de sobrevivência?
Eis algumas questões que mereceriam percucientes respostas do Sumo Pontífice nesta visita que nos faz, especialmente porque Sua Santidade tem como traço mais forte a racionalidade, já que não possui carisma, não lhe fizeram trilha sonora (do tipo “A bênção João de Deus”) e nem lhe seria conveniente usar, numa eventual showmissa, uma canção do “rei” Roberto Carlos (do tipo Amigo), pois a imagem do piedoso cantor, no momento, está mais associada à intolerante queima de livros do Index Librorum Prohibitorum, dos tempos das fogueiras da Inquisição (cruz-credo!).
Mauro Chaves é jornalista, advogado, escritor, administrador de empresas e produtor cultural. E-mail: mauro.chaves@attglobal.net