Entrevista:O Estado inteligente

sábado, maio 05, 2007

Medina pendura a toga


Ministro do STJ se afasta do cargo, mas fica
com casa, carro e o salário de 23 200 todo mês


Alexandre Oltramari

Jorge Campos/STJ
Paulo Medina, acusado de vender sentenças: furacão de suspeitas

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Perguntas e respostas: Operações da PF

O ministro Paulo Medina, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), está há quase um mês no olho do furacão que varre o Judiciário. Desde que seu irmão foi preso, acusado de vender sentenças do ministro, não passa uma semana sem que surjam novos indícios do envolvimento de Medina com traficâncias de decisões judiciais. As suspeitas, que levaram o Ministério Público Federal a denunciá-lo por prevaricação, corrupção passiva e formação de quadrilha, fizeram com que Medina se afastasse de suas funções, por força de um atestado médico, até o próximo dia 16. Na semana passada, diante da divulgação de mais uma saraivada de diálogos comprometedores, o ministro pendurou a toga. Pediu afastamento do STJ para se defender das acusações. O pedido foi aceito pelo tribunal. Poucos brasileiros acusados criminalmente terão tantas oportunidades de se defender como Paulo Medina. Mesmo sem trabalhar, ele continuará morando em um apartamento funcional, terá um automóvel à disposição e continuará recebendo o salário de 23.200 reais.

A mais recente denúncia envolvendo o ministro aparece num diálogo telefônico, gravado pela PF em dezembro passado, no qual ele adianta sua decisão para o advogado interessado. Além disso, dá dicas de como o acusado deve proceder para safar-se da acusação de uso de documento falso. "Manda ele fazer... Manda ele fazer sustentação, xará. Manda ele fazer sustentação", diz Medina. O advogado, Paulo Eduardo Almeida de Mello, agradece. Medina arremata: "Você manda! Você manda, viu? Você manda!". No dia seguinte, Medina, relator do caso, votou a favor do réu e, como é costume no STJ, foi acompanhado pela maioria dos outros ministros. O diálogo não revela nenhum pedido de propina por parte do ministro e, diante de tudo o que já se sabe sobre ele e seu irmão, parece um fato menor, mas não é. Um magistrado não pode, em circunstância nenhuma, orientar um advogado e depois ainda decidir em seu favor.

Joedson Alves/AE
O ministro Barbosa, do STF, preside inquérito em que se investigam três ministros do STJ: bomba

A ofensiva sobre os homens da toga produziu mais desdobramentos na semana passada. O STJ, a corte que só afastou Medina a pedido do próprio investigado, decidiu mandar para casa o desembargador Dirceu de Almeida Soares, do Tribunal Regional Federal com sede em Porto Alegre. Ele foi denunciado por advocacia administrativa, estelionato e formação de quadrilha. Segundo a denúncia, aceita pelo STJ, o desembargador pressionava seus colegas para que decidissem favoravelmente aos interesses de advogados com quem tinha estreita ligação. Um dos advogados é Roberto Bertholdo, preso em dezembro de 2005 sob a acusação de comprar sentenças judiciais. A investigação sobre as traficâncias de Bertholdo, que derrubaram o desembargador, atinge outros integrantes do TRF de Porto Alegre e envolve três ministros do STJ. O envolvimento de ministros do STJ está sendo apurado com o máximo sigilo, em inquérito presidido pelo ministro Joaquim Barbosa, do STF. Ele nega a investigação. Mas ela existe – e pode ser a próxima bomba a estourar no colo da Justiça.

Abril de 2007
As operações da
Polícia Federal




Revelada no dia 13 de abril de 2007, a operação Hurricane (furacão, em inglês) mostrou à sociedade uma face desconhecida da Justiça brasileira. A ação da Polícia Federal (PF) prendeu bicheiros e advogados acusados de envolvimento em jogos ilegais, mas também juízes e desembargadores suspeitos de vender sentenças aos interessados. Começava, assim, a maior devassa na Justiça do país. Entenda como funcionam as operações especiais da PF.


1. Como são planejadas as operações da PF?
2. Em que momento a PF decide tornar pública uma investigação secreta?
3. Quais foram as principais operações realizadas nos últimos anos?
4. Qual o número de agentes mobilizados nessas ações?
5. As operações sempre resultam em prisões?
6. As operações são corretas do ponto de vista legal?
7. Já houve abusos?
8. As operações sempre têm nomes curiosos. Quem os escolhe?
9. Quais os benefícios das ações da PF para a sociedade?
10. A PF já investigou desvios dentro da própria corporação?

1. Como são planejadas as operações da PF?

O planejamento das operações da PF leva, em geral, meses ou até anos. Exemplo disso é a Hurricane. Ela teve início por acaso, quando uma juíza de Niterói (RJ) autorizou a realização de escutas telefônicas, que acabaram revelando a ponta do iceberg da corrupção na Justiça. Ao menos seis meses antes da cinematográfica deflagração da operação, investigadores já atuavam como verdadeiros arapongas: entre outras ações, eles entraram em segredo no escritório de um dos suspeitos para fotocopiar documentos. Muitas vezes, são utilizados agentes disfarçados, que se infiltram nos grupos criminosos para obter informações e provas. Nessa primeira fase, todos os movimentos são realizados em absoluto sigilo.

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2. Em que momento a PF decide tornar pública uma investigação secreta?

As operações só vêm à tona quando a PF reúne indícios e provas suficientes para iniciar inquéritos e ações na Justiça. Por isso, muitas vezes, a instituição se vê obrigada a permitir que o esquema criminoso continue a funcionar em sigilo, até que os agentes tenham provas substanciais. Só então começa a parte visível da operação, com sirenes e prisões. Esse método permite que, além de pequenos operadores criminosos, sejam capturados os indivíduos graduados do esquema.

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3. Quais foram as principais operações realizadas nos últimos anos?

Houve várias operações, com destaque para:
- Têmis, Hurricane: venda de sentenças judiciais favoráveis aos jogos ilegais
- Sanguessuga: compra superfaturada de ambulâncias com dinheiro público
- Hidra: combate ao contrabando
- Anaconda: venda de sentenças judiciais
- Águia e Planador: tráfico internacional de drogas
- Zaqueu: corrupção nas delegacias do trabalho
- Matusalém e Zumbi: fraudes no INSS
- Lince: extração ilegal de diamantes
- Lince 2: adulteração de combustíveis e roubo de carga
- Farol da Colina: remessa ilegal de dinheiro para o exterior
- Soro: falsificação de leite em pó
- Sucuri e Trânsito livre: facilitação de contrabando
- Pandora: extorsão de empresários
- Vampiro: fraude em licitação de hemoderivados
- Isaías: extração ilegal de madeira

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4. Qual o número de agentes mobilizados nessas ações?

Em geral, dezenas e até centenas de agentes. Só na operação Têmis, por exemplo, cerca de 300 profissionais cumpriram 70 mandatos de busca e apreensão num só dia; no caso da Hurricane, foram 400 agentes. Essa, porém, é só a face visível da atividade da PF: por trás dela, outras dezenas de agentes atuam na áreas de inteligência e investigação.

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5. As operações sempre resultam em prisões?

Nem sempre. Muitas vezes, elas visam apenas obter provas que podem cooperar com as investigações. Isso impede, por exemplo, que os suspeitos se adiantem aos longos inquéritos e destruam provas. De qualquer forma, tanto as prisões quanto a apreensão de provas dependem de autorização da Justiça. Ao ser deflagrada, a operação Têmis não realizou prisões, mas coletou centenas de documentos e discos rígidos de computadores de suspeitos; já a Hurricane prendeu 25 pessoas, além de recolher duas toneladas de documentos, 19 armas, mais de 500 jóias, 51 carros de luxo e milhões em dinheiro vivo.

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6. As operações são corretas do ponto de vista legal?

Legalmente, as ações dos agentes federais têm de ser autorizadas pela Justiça. Isso serve tanto para os mandados de busca e apreensão de provas quanto para as prisões. O mesmo vale para a realização das escutas telefônicas - tão úteis nesses processos. Sendo autorizadas pela Justiça, as operações são legais.

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7. Já houve abusos?

Invariavelmente, os investigados acusam a PF de abuso. No caso da operação Hurricane, por exemplo, os advogados dos envolvidos presos afirmaram que seus clientes não tiveram acesso às acusações e, por isso, se recusaram a prestar depoimento. A todos eles, vale lembrar, cabe o recurso à Justiça para pedir reparo contra eventuais abusos e erros processuais.

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8. As operações sempre têm nomes curiosos. Quem os escolhe?

Os nomes são escolhidos por delegados da PF. As denominações devem fazer alguma referência ao caso estudado e, simultaneamente, manter o assunto em sigilo. A operação Isaías, por exemplo, sobre extração ilegal de madeira, era uma referência ao seguinte texto do profeta bíblico: "Restarão tão poucas árvores em sua floresta, que um menino poderá contá-las." Já Têmis, sobre o envolvimento de membros do Judiciário em crimes, usou o nome da deusa grega da Justiça.

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9. Quais os benefícios das ações da PF para a sociedade?

Os benefícios são evidentes: desbaratar ações criminosas que atrapalham o cotidiano dos brasileiros. Isso fica mais claro quando são revelados e interrompidos esquemas como tráfico de drogas e contrabando, fontes de violência e prejuízo para o país. Também quando são iluminadas as relações espúrias entre ações ilícitas e servidores públicos - sejam eles políticos, policiais ou membros do Judiciário. A corrupção é um câncer que prejudica o desempenho dos órgãos públicos e se coloca como um entrave ao desenvolvimento nacional.

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10. A PF já investigou desvios dentro da própria corporação?

Sim. Desde 1997, várias ações ajudaram a separar o joio do trigo - algumas delas exclusivamente dedicadas a expurgos dos maus elementos. Além disso, várias operações que tinham como foco outros temas acabaram por encontrar maus policiais. Entre 2003 e 2004, por exemplo, 110 agentes federais foram incriminados. O trabalho de "limpeza", porém, deve ser constante.

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