Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, março 06, 2007

Dora Kramer - Ouvir e ser ouvido



O Estado de S. Paulo
6/3/2007

O encontro do presidente da República com os governadores, hoje em Brasília, pode acabar muito bem ou muito mal. Na concepção do governador de Minas Gerais, Aécio Neves, não há meio-termo.

Se o presidente der algum sinal concreto de que pretende levar em conta as reivindicações dos Estados, nem precisa anunciar ganhos objetivos agora, terá crédito para prosseguir nas negociações. Mas, se resolver ignorar a agenda dos governadores e transformar a reunião num monólogo ufanista sobre as realizações federais, terá dificuldades adiante.

“A primeira conseqüência de uma reunião onde prevaleçam só os interesses do governo federal é que ela pode ser a última”, diz Aécio, cuja expectativa em torno da reunião não vai além de uma sinalização positiva. “A nossa parte é comparecer”, mas, acrescenta, para serem ouvidos e não só para ouvir.

“O momento da negociação é mais à frente, quando estiver em jogo no Congresso as renovações da CPMF e da desvinculação das receitas constitucionais. Agora o importante é o governo se dispor a criar um roteiro bem definido de ações que nos levem à administração mais descentralizada das receitas.”

Por “descentralização das receitas” entenda-se aumentar a participação dos Estados e reduzir a da União na arrecadação de impostos e contribuições. Por que o governo federal aceitaria isso, ainda mais sabendo que entre os governadores estão dois fortes candidatos à Presidência da República (Aécio Neves e José Serra) e, portanto, ameaças potenciais à continuidade do projeto petista de poder?

“Esse raciocínio é simplista e um tanto mesquinho política e administrativamente falando. Justamente porque, se há Estados que podem prescindir mais da União, são São Paulo e Minas. Os outros, quase todos governados por aliados de Lula, ficam numa situação difícil até para se viabilizar politicamente”, analisa Aécio Neves.

Na opinião dele, o presidente da República ganharia mais fazendo um “gesto generoso de compartilhar a paternidade dos sucessos administrativos” do que se tentar manter para si todos os dividendos e ainda à custa de fazer dos governadores meros ouvintes de um discurso sobre suas realizações.

Escaldados pelo histórico presidencial de reuniões do mesmo tipo, nos últimos dias vários governadores - principalmente os aliados de Lula - fizeram chegar ao Palácio do Planalto a informação de que seria conveniente, para o bem-estar da reunião, que o presidente Lula tomasse a iniciativa de mostrar interesse sobre a pauta de reivindicações entregue ao governo federal há mais de um mês.

Se ele não o fizer, poderá haver constrangimento, pois a combinação é a seguinte: se sentirem que a reunião se encaminha para o fim sem nenhuma solução no horizonte, eles tomam a palavra para cobrar atenção de Lula a seus pedidos. Tudo muito civilizado, mas no tom de quem não está disposto a ver de novo o filme de um protagonista só.

O porta-voz escolhido para a cobrança muito provavelmente será o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda. Por razões óbvias, não poderia ser um aliado e, para não dar uma conotação de conflito eleitoral, ficam de fora Serra e Aécio. Além de não integrar lista de presidenciáveis, Arruda tem a justificativa de governar o DF, sede da reunião.

Se o presidente insistir em tergiversar, os governadores estarão liberados para não se empenharem na agenda de interesse federal quando das votações da prorrogação da CPMF e DRU.

Noves fora

Em sã e objetiva consciência, os participantes da reunião prevista para durar o dia inteiro entre o presidente da República e os governadores de todo o País sabem que vão passar a terça-feira em Brasília só para produzir uma fotografia, dar entrevistas manifestando confiança no fortalecimento da federação e exaltar as boas intenções das relações civilizadas entre os Estados e a União.

Isso posto, voltam todos para casa de mãos vazias e a sensação do tempo perdido. Quem gosta de eventos festivos e acha que toda publicidade é bem-vinda, seja ela sob que forma for, ainda sai razoavelmente satisfeito. Aos que não gostam do exercício da conversa pela conversa e comparecem só para não incorrer em descortesia, restará o ofício da administração do tédio e do discurso genérico no final.

Na melhor das hipóteses, porque em reunião de tanta gente sem uma pauta muito bem “amarrada” há sempre o risco de algo dar errado.

Logotipo

O simples fato de o governo batizar as medidas educacionais que pretende tomar alegadamente para melhorar o setor de PAC da Educação - sem uma denominação específica que traduza o conteúdo do plano - já demonstra o caráter de marca fantasia da sigla.

Serve para qualquer iniciativa. Para a economia o termo “crescimento” ainda guarda relação com a coisa em si. Mas “crescimento” na educação, convenhamos, é no mínimo uma idéia desprovida de sentido lógico.

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