Entrevista:O Estado inteligente

domingo, fevereiro 18, 2007

Os resultados do Bolsa-Família

Utilizado pelo presidente Lula como um de seus principais trunfos eleitorais na campanha pela reeleição, o Bolsa-Família se converteu num dos temas mais debatidos em seminários acadêmicos. O debate mais recente foi promovido pelo Núcleo de Estudos de Políticas Públicas e pelo Núcleo de Estudos da População, vinculados à Unicamp, com o objetivo de avaliar um importante estudo realizado pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) sobre a contribuição desse programa de transferência de renda para a redução das desigualdades sociais no País. O órgão pertence à Universidade Federal de Minas Gerais e o trabalho foi discutido por sociólogos, demógrafos e economistas de diferentes tendências.

Segundo esse estudo, quando se suprime da renda das famílias mais pobres o benefício do Bolsa-Família, a desigualdade de renda no País aumenta 3,56%. Os participantes do encontro concluíram que foi positivo o efeito do programa junto às famílias em situação de pobreza (com renda mensal por pessoa entre R$ 60 e R$ 120) e extrema pobreza (com renda mensal por pessoa de até R$ 60). Mas concluíram também que seus resultados são limitados, em termos de inclusão social, e que o Bolsa-Família, por si só, jamais será capaz de interromper o 'fator intergeracional da pobreza' - a miséria que passa de pais para filhos, sem que nenhum integrante da família consiga sair da condição de penúria e ignorância.

A demonstração disso, segundo eles, pode ser encontrada cruzando-se os últimos indicadores sociais do IBGE e os resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb). Pesquisa feita pelo IBGE em 15.240 domicílios constatou que o Bolsa-Família estimulou muitas famílias pobres a matricular seus filhos no ensino fundamental. Mas, por falta de um sistema escolar com um mínimo de qualidade, essas crianças não tiveram sucesso na progressão escolar, recebendo as notas mais baixas nas avaliações do Saeb.

Essa é uma das principais contradições do Bolsa-Família. Embora a transferência direta de renda ajude as famílias mais pobres, o programa está longe de erradicar a pobreza. 'Muita gente avalia o Bolsa-Família como uma política educacional e ele não é. Não se pode fazer uma coisa ou outra: transferência de renda e qualidade na educação têm de vir juntas', afirma o coordenador da pesquisa do Cedeplar, Eduardo Rios-Neto. Na sua opinião, para dar certo o Bolsa-Família deveria estar articulado com outras medidas governamentais no setor educacional, especialmente na pré-escola e no ensino infantil. 'Estou cada vez mais convencido de que, se não pegar essa criança desde seu nascimento e não desenvolver seu aparato cognitivo e nutricional, nenhum programa social vai conseguir quebrar a miséria intergeracional', diz ele.

Muitos participantes do encontro reclamaram da falta de ações integradas entre os Ministérios da Educação, da Saúde e do Desenvolvimento Social. Outros criticaram a superposição de programas sociais, chamando atenção para o desperdício de recursos públicos por eles causados e lembrando que as políticas de focalização tendem a perpetuar as condições do atraso e da pobreza. Mas um dos temas mais discutidos durante o encontro foi a relação de custo/benefício do Bolsa-Família. Os resultados desse programa justificam a vultosa soma de dinheiro que o governo vem gastando para mantê-lo? Ou não seria mais lógico, sensato e racional concentrar recursos escassos em creches, no ensino pré-infantil e no ensino fundamental, cujos efeitos positivos sobre a distribuição de renda e a redução da pobreza são sobejamente conhecidos?

Assim colocada, essa é uma falsa questão. O Bolsa-Família é um programa que impede que milhões de famílias caiam na mais extrema miséria. Tem inegável importância social e, por isso, não pode ser extinto. Mas precisa ser aperfeiçoado, e com urgência. Afinal, não basta garantir condições mínimas de sobrevivência para aquelas pessoas. É preciso, além disso, oferecer-lhes a 'porta de saída' da pobreza. E isso se faz com educação de boa qualidade.

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