Entrevista:O Estado inteligente

domingo, fevereiro 11, 2007

MERVAL PEREIRA -Ser governo

LISBOA. O Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, tem uma análise clara da situação atual, em que as pressões vêm do lado político e também de setores empresariais. Para ele, fazendo formalmente parte do governo, embora tenha atuação autônoma, o BC passa a ser parte também de disputas políticas, sejam propriamente partidárias, sejam reflexos de posições corporativas. Na verdade, tendo se transformado em ministro para ser protegido por fórum especial quando foi acusado de sonegação fiscal — o processo foi para o Supremo, onde nada de irregular foi comprovado — , Meirelles acabou tendo enfatizada a porção-governo do Banco Central, em vez de sua independência.

Na sua passagem por Lisboa, para participar de um seminário da Fundação LusoBrasileira, o presidente do Banco Central teve uma confrontação silenciosa e elegante com um de seus principais críticos, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, que evitou uma crítica direta ao Banco Central, mas falou muito em crescimento da economia e elogiou o PAC como sendo o começo de um projeto de investimento em infra-estrutura do governo que poderá levar o país ao crescimento sustentado.

Indiretamente, porém, endossou a crítica dos que dizem que o BC não está agindo dentro do espírito desenvolvimentista do PAC.

E foi irônico quanto à apresentação de Meirelles sobre os números da economia. Nela, o presidente do BC mostrou todos os bons indicadores econômicos, mas fez questão de ressaltar que o nível do câmbio está em consonância com a média de uma cesta de 15 moedas, com oscilações para mais ou para menos.

Disse que os fluxos líquidos de câmbio estão positivos em 2006, tanto o comercial quanto o financeiro, e que o investimento direto estrangeiro mantém-se em uma média em torno de US$ 18,8 bilhões, apenas acima dos dois anos anteriores. Com isso, quis mostrar que não há grandes diferenças do momento atual para outros, e que o dólar encontrará seu equilíbrio naturalmente.

Paulo Skaf dirigiu-se a um grupo de jornalistas e investidores e comentou que era daquele jeito que a equipe econômica convencia o presidente Lula de que tudo vai bem na economia do país.

“Até eu me convenci com aqueles gráficos todos”, disse ele, sorrindo. Meirelles queixouse depois de que, sentado ao seu lado durante o almoço, Skaf não fizera críticas à apresentação.

Mas incluiu o episódio na conta da politização do tema: “Os políticos, os representantes de corporações se sentem no dever de criticar as decisões do BC, para dar satisfação à sua clientela particular”.

O presidente do Banco Central coleciona declarações de todos os críticos à política de juros, e garantiu que nenhum deles imaginava pedir que a taxa de juros real estivesse em torno de 8% ao ano a esta altura de 2007. Ele parece desesperançado de conseguir a independência formal para o Banco Central, medida que as agências de risco dizem que reforçaria uma decisão de transformar o país em “investment grade”, e está preocupado com a crescente politização do tema.

As viagens ao exterior têm servido para melhorar sua autoestima, ele diz, pois recebe homenagens por onde anda.

Na sexta-feira mesmo, no seminário da Fundação LusoBrasileira, onde apresentou dados sobre as perspectivas econômicas do país, recebeu um elogio público do banqueiro João Rendeiro, presidente da Fundação, que classificou seu trabalho à frente do Banco Central de uma garantia de tranqüilidade para os investidores estrangeiros. Rendeiro fez questão de dizer que os investidores estrangeiros esperam que Meirelles continue à frente do Banco Central no segundo mandato de Lula.

Meirelles não acredita que o comentário de Lula sobre não ter medo de aumento da demanda tenha sido uma resposta à ata do Copom que se referiu ao aumento da demanda como um dos limitadores da redução dos juros. Ele diz que a ata não critica o aumento da demanda, e diz até mesmo que as perspectivas são positivas porque a oferta está aumentando também. A análise do Copom sugere apenas que é preciso acompanhar o desempenho da demanda para não haver surpresas.

Segundo Meirelles, Lula quis dizer que os investidores podem vir para o Brasil porque haverá demanda para seus projetos, no que ele também acredita. Henrique Meirelles parece não apenas disposto, mas desejoso de continuar, e não vê nenhum problema em mudar a composição da diretoria do Banco Central, como pressionam alguns setores políticos e econômicos.

Mas a tranqüilidade de Meirelles não está na aceitação das pressões, mas na convicção de que o que importa não é o nome que sai, mas o nome que entra na vaga.

Ele lembra que já trocou nove diretores do Banco Central desde que assumiu a presidência, no início do governo Lula, alguns nomeados por ele mesmo. Até agora, nenhuma das substituições indicou uma mudança de tendência no Banco Central.

Meirelles encara com bastante tranqüilidade essa troca, pois diz que é muito difícil conseguir segurar um profissional do mercado financeiro por mais de dois ou três anos, pois são profissionais muito bem remunerados. Os de carreira do BC tendem a permanecer mais tempo, pois têm a possibilidade de receber um salário maior.

O caso mais comentado é o do diretor de Política Econômica, Afonso Bevilacqua, tido por setores petistas como o mais intransigente diretor do Banco Central. Meirelles disse que avisou aos diretores que, até que seja confirmado pelo presidente Lula, não conversará com nenhum deles sobre o futuro: “Se você quiser ficar, eu não saberei o que dizer. Se você quiser sair, eu não vou deixar. Então é melhor todo mundo ficar onde está, trabalhando normalmente”. No caso de Bevilacqua, que já está completando quatro anos na diretoria do banco, Meirelles diz que não será surpresa se ele desejar sair, mas se isso acontecer não será certamente pelas pressões contra ele.

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