Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Luiz Garcia - O homem é Putifar

Antigamente, vinganças da natureza contra traições do homem não eram, como, hoje, anunciadas com antecipação de décadas ou séculos., No velho Egito, por exemplo, o faraó Putifar teve num sonho o anúncio de uma tragédia ecológica ainda em seu reinado. Ele se viu passeando pelas margens do Nilo quando se deparou com sete vacas gordas sendo devoradas por sete vacas magras; em seguida, encontrou sete gordas espigas de milho, logo engolidas por sete espigas magrinhas., O escravo hebreu José interpretou o sonho: era um recado de Deus (o registro histórico não esclarece se foi Jeová, deus de José, ou uma das muitas divindades egípcias; de qualquer forma, alguém do lado de lá), avisando ao Egito que se preparasse: depois de sete anos de bonança, viriam sete de fome e miséria. Putifar agradeceu e tomou previdências para proteger seu povo., Hoje, as mensagens não vêm por via onírica. São cientistas que há anos avisam: pela mão do homem, o planeta está ficando quente demais. Os países mais ricos são os que mais contribuem para o aquecimento: há relação direta entre prosperidade e culpa pelo esquentamento da atmosfera. Ou, mudando um pouco o foco: entre a produção de riqueza e uma atitude na base de “os outros que se danem”., Há anos, profecias pessimistas — não amparadas em sonhos, mas em pesquisas longas e sérias — vêm brigando com o otimismo interesseiro das economias movidas a carvão e petróleo. O último inverno contribuiu para o debate mostrando provas visíveis do aquecimento, como a falta de neve nos Alpes., Esta semana, organizações internacionais ligadas à ONU, como o Serviço Mundial de Monitoramento de Geleiras e o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, anunciaram que este século assistirá a uma escassez de água e alimentos jamais vista., Há diferença notável entre esse aviso e todos os anteriores. Desta vez, o prazo é relativamente curto e as previsões não poderiam ser mais negras: sofrerão com a falta de água, dizem os cientistas, algo entre um e três bilhões de pessoas; com a escassez de alimentos, de 200 a 600 milhões., Importante: as vítimas não serão tribos perdidas na África negra nem moradores de ilhas asiáticas periodicamente visitadas por tsunamis. China, Austrália e partes da Europa e dos Estados Unidos estão na mira da catástrofe., O fato de que algumas das grandes potências mundiais serão alvos preferenciais da vingança da natureza seria dado positivo — se assim se pudesse dizer — da tragédia anunciada. Pelo menos, entre as nações na lista das vítimas anunciadas estão algumas daquelas que podem fazer alguma coisa para reduzir o impacto da catástrofe., Outro dado um tanto animador é a forte possibilidade de que, daqui a três anos, o governo americano passe para as mãos do Partido Democrático., Historicamente, ele tende a ser mais sensível que o Republicano em face de problemas ambientais. Portanto, chegar ao poder em Washington um faraó que dê atenção às profecias da comunidade científica mundial pode fazer diferença., Quanta diferença é difícil saber desde já. Mas, pelo sim, pelo não, deve valer a pena, para os eleitores americanos, votar num Putifar.

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