Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Chavismo à moda da casa: o governo federal quer assaltar o Bradesco

Chavismo à moda da casa: o governo federal quer assaltar o Bradesco
Certo, leitor amigo, fica chato dizer que um banco pode ser vítima da truculência do governo. A se acreditar em certa esquerda, sempre acontece o contrário. Mas a verdade é que o triângulo "governo Lula-Banco Postal-Bradesco" expõe um arreganho escancaradamente chavista do Planalto. A se concretizar de fato, a primeira coisa que está indo para o brejo é a segurança jurídica. Junto com ela, o bom senso e até o decoro argumentativo. E noto: o Bradesco é sabidamente uma empresa que mantém relações amistosas com o governo Lula. Dá para imaginar o que essa gente não gostaria de fazer com inimigos. Para quem não sabe do que estou falando, uma explicação rápida.
Em 2001, o governo federal resolveu fazer uma licitação entre bancos para que agências dos correios pudessem funcionar com postos bancários. O objetivo principal era levar o serviço a algumas cidades que haviam ficado sem banco por conta do enxugamento do número de agências, que veio com a reestruturação do setor bancário. Três empresas participaram da licitação: Bradesco, Itaú e Caixa Econômica Federal. Ganhou o primeiro, com uma proposta de R$ 201 milhões e mais repasses de parte das taxas cobradas dos clientes pelos serviços. A atividade rende aos Correios hoje algo entre R$ 10 milhões e R$ 12 milhões. O contrato vai até 2010. Pois não é que o ministro das Comunicações, Helio Costa, decidiu simplesmente romper o contrato? O argumento não poderia ser mais vagabundo: o Bradesco está lucrando demais.
Elio Gaspari escreveu uma nota na Folha de domingo a respeito e concluiu assim: “O lucro do banco não é da conta do ministro. Se a privataria tucana vendeu a concessão a preço de banana, é aí que ele deve procurar a anomalia.” Gaspari é informado o bastante para ser tão simplório na sua sanha antiprivatizante. “Privataria” por quê? Tem a obrigação de explicar a seus leitores se não quer ficar, a esta altura da carreira, fazendo embaixadinha para a torcida. Suponho que não precise disso. Quanto valia, Gaspari, um serviço que não existia? Sob que argumento se pode dizer que R$ 210 milhões, mais o que o serviço rende mensalmente, são preço de banana?
Na opinião do jornalista, o Bradesco correu ou não algum risco quando decidiu operar o sistema? “Banana” foi também a moeda que disseram ter sido usada para comprar os 19% (!) de ações da Telebras, que renderam aos cofres públicos R$ 22 bilhões. Um ano depois, as ações valiam quase a metade em Bolsa. Ou seja: foram vendidas a peso de ouro, não de banana! Considerando os investimentos feitos e os impostos pagos, fica fácil demonstrar que a privatização da Telebras rendeu ao Brasil R$ 265 bilhões, R$ 135 bilhões só de investimentos em infra-estrutura. Investimentos permanentes, não consumidos pelo pagamento da dívida — já que essa é a crítica mais freqüente que se faz às privatizações.
Sempre que a “banana” vira moeda na boca ou na pena de alguém, fico muito irritado porque acho a crítica populista e obscurantista. Que os idiotas optem por isso, vá lá. Talvez a ignorância lhes perdoe a tolice. Que alguém informado o faça, aí é indesculpável. Não se fez privataria nem na Telebras nem no Banco Postal. Quem, agora, está se comportando como pirata, como ladrão, é o governo federal, que quer roubar o Bradesco.
Hélio Costa disse que vai constituir uma comissão para indenizar o banco. Vejam só: não sei se vocês estão entendendo. Uma empresa tem um contrato para gerir um serviço. Para tê-lo, disputou e venceu uma licitação. O governo olha para a coisa, descobre que o negócio deu certo, que ele é bom — e só é assim porque está funcionando direito —, e decide, então, tungar a empresa privada, tomar a coisa de volta, rasgando o contrato. E quais são os argumentos do ministro? “O contrato é injusto porque o Banco Postal é um enorme sucesso, mas os Correios lucram pouco”. É mesmo? E se a operação desse prejuízo, ministro? Costa diz ainda que o governo não pode deixar de levar em consideração que “o Banco Postal é um sucesso”. Então fique longe dele, meu senhor!
Vejam só: até admito que, num contrato de dez anos, as partes possam, a pedido de qualquer uma delas, a qualquer momento, sentar para rediscutir as novas circunstâncias que envolvam o que está combinado. Isso é muito mais comum do que a gente supõe, inclusive entre empresas privadas. Anunciar que se vai jogar no lixo o contrato e discutir a indenização justamente no momento em que o governo espera que a iniciativa privada ajude a alavancar o tal PAC é ação delinqüente de um governo estúpido. Nos seus delírios, Lula diz esperar que, com o apoio do capital privado, o programa de crescimento atinja R$ 1 trilhão — quase R$ 600 bilhões só da iniciativa privada. É uma bobagem, eu sei. Ainda que fosse um décimo disso, já seria muito: por que confiar num governo que rasga contrato?
Atenção: não há nenhuma boa razão para o governo fazer isso com o Bradesco e não fazer o mesmo, a qualquer momento, com outra empresa privada que tenha conquistado um contrato em licitação. Fiquemos atentos ao desdobramento desse caso. Ele é de tal sorte absurdo, que me pergunto se um governo que cria tantas dificuldades inúteis não está correndo atrás de facilidades úteis.
Em tempo: a pressão de sindicatos ligados à CUT, cobrando o rompimento, é grande. Segundo Costa, só a marca “Banco Postal” valeria hoje um R$ 1 bilhão. Os companheiros estão babando. Tão logo o serviço seja estatizado, vocês sabem muito bem o que vai acontecer. Sem contar que, bem, bastam uns dois anos para que o serviço, hoje muito lucrativo (segundo o ministro), comece a dar prejuízo.
PS1 - O Bradesco rivaliza com o Itau para saber qual é o maior banco privado do país. Mesmo sendo um gigante, leva uma dessa. Se os que são menores ficarem quietinhos, acho que devem desconfiar de que coisa pior pode vir a qualquer momento.
PS2: Alguns poderão dizer que fiquei mais exaltado com o caso do que o próprio Bradesco. O banco, a esta altura, deve estar preocupado em ser o mais moderado possível porque, claro, não quer entrar em rota de colisão com o governo. De maneira geral, o capital privado costuma ter uma prudência com o Estado que beira a subserviência. A coisa é assim mesmo, leitor amigo. Sou um pouco mais pobre do que o Bradesco e não tenho nada com o negócio. É que considero a economia de mercado e o Estado de Direito coisas muito sérias para ficar dependendo só da reação dura de banqueiros.
Por Reinaldo Azevedo
5/2/2007

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