O Estado de S. Paulo |
9/2/2007 |
Em dezembro de 2002, quando o presidente Lula apresentou o novo presidente do Banco Central, chamou-o de “companheiro Meirelles”. Companheiro é aquele com quem se reparte o pão. De lá para cá, Lula e Meirelles vão engolindo o bocado de cada dia. Às vezes, é pão-de-ló; outras, como agora, pão que o diabo amassou.Há apenas três meses, era doce. Meirelles foi apontado como importante cabo eleitoral do presidente Lula. A baixa da inflação comandada pelo Banco Central foi vista como um dos principais itens da melhora do poder aquisitivo do povo que reconduziu Lula ao segundo mandato. Bastou o dólar escorregar mais do que o esperado para Meirelles ser apontado como traidor da causa operária. Foi o que sugeriu quarta-feira o iluminado ministro do Trabalho, Luiz Marinho, que o acusou de derrubar o câmbio, inviabilizar empresas e arruinar o assalariado.Estão cobrando de Meirelles o que ele não pode dar. Ele foi chamado para empurrar a inflação para dentro da meta. E isso tem conseguido. É rosca sem-fim a discussão sobre se essa tarefa poderia ter tido igual eficácia caso o corte dos juros fosse maior. Em nenhum momento nem o governo Lula nem o modelo adotado exigiram que o Banco Central garantisse um piso para o câmbio.Quem clama pela demissão de Meirelles por suposta lambança na condução do câmbio comete um ou mais entre três equívocos: O primeiro está em supor que o achatamento das cotações do câmbio seja produto de especulação com juros. Por mais que se acirrem as operações de arbitragem com juros, não há entrada física de moeda estrangeira pelos canais financeiros que explique as pressões sobre o câmbio. Quem tem causado a valorização do real é o exportador, que, só em 2006, jogou no câmbio interno US$ 46 bilhões a mais do que foi procurado pelos importadores. O segundo é achar que o Banco Central poderia ter comprado mais dólares de maneira a diminuir a enxurrada verde câmbio adentro. Se tivesse comprado US$ 10 milhões a mais, as reservas externas teriam pulado para além dos US$ 100 bilhões já no fim de janeiro, antecipando a percepção de belezura das contas externas e atraindo mais dólares. O terceiro equívoco é desconsiderar outros fatores externos que têm ajudado a derrubar o dólar internamente: o efeito China, que barateia os manufaturados; a nunca vista antes abundância de dólares no mercado global; a relativa falta de ativos para a crescente procura internacional; a queda dos prêmios de risco; e, last but not least, a melhora dos fundamentos da economia.Enfim, isso é tão irracional como a atitude do italiano que culpa o governo por qualquer coisa, aconteça ou não: Piove, governo ladro; non piove, governo ladro.A gritaria pela demissão de Meirelles põe à mostra a falta de autonomia operacional do Banco Central. A qualquer momento, segmentos da sociedade se sentem à vontade para cobrar a demissão do homem perché piove e não porque tenha transgredido o mandato confiado.Enfim, chova ou faça sol, Meirelles ainda depende de que o maioral do País o considere “companheiro de jornada”. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, fevereiro 09, 2007
Celso Ming - Pão que o diabo amassou
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