Entrevista:O Estado inteligente

domingo, novembro 19, 2006

JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN Em pesquisa, é preciso concentrar recursos


Não basta aumentar as verbas; é preciso também que os recursos adicionais sejam investidos da forma eficiente


A ANDIFES (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) apresentou, às vésperas do primeiro turno, um documento com indisfarçável apoio à reeleição do presidente Lula (www.andifes.org.br/files/061020-001.pdf). A Andifes faz a habitual reclamação contra a expansão do ensino superior privado e, é claro, pede mais dinheiro. Há poucas propostas concretas de como as instituições federais podem fazer melhor com os recursos dados pelos contribuintes.
As instituições de ensino superior freqüentemente têm uma função dupla: educação e pesquisa. Nas últimas décadas, tornou-se claro que a capacidade para criar e absorver novas tecnologias é fundamental para o desenvolvimento de um país. Nesse processo, as universidades têm um papel central, realizando pesquisas e transferindo, ou até mesmo comercializando, as novas tecnologias que daí resultam. Além disso, a atividade de pesquisa, aliada à pós-graduação, produz novos professores e pesquisadores universitários e também pesquisadores para laboratórios nacionais e empresas privadas.
O nosso governo investe uma proporção muito baixa do PIB em ciência e tecnologia, quando comparado com o que exemplos de sucesso, como a Coréia do Sul, investiram quando tinham a nossa atual renda per capita. Há, no Brasil, bons pesquisadores, que produziriam mais se dispusessem de mais recursos. Mas não basta simplesmente aumentar as verbas; é preciso também que os recursos adicionais sejam investidos da maneira eficiente.
O manifesto da Andifes reclama a descentralização de verbas para pesquisa e pede "uma política que permita a superação das desigualdades regionais no que diz respeito, particularmente, à oferta de cursos de graduação e de pós-graduação e aos investimentos em pesquisa". O melhor desenho para um sistema de apoio à pesquisa vai depender das características individuais de cada país, mas isso não impede que examinemos outras experiências para aprender o que funciona.
A eficácia do sistema de apoio às pesquisas norte-americano é admirável. Mais uma vez, em 2006, todos os Prêmios Nobel de ciências foram para pesquisadores de instituições nos EUA. Além disso, os Estados Unidos construíram uma formidável liderança tecnológica em áreas como informática e biotecnologia. É verdade que os americanos gastam proporcionalmente mais com o ensino superior e a pesquisa do que outros países com o mesmo nível de riqueza, mas eles também gastam melhor.
Uma das características da produção de pesquisa é que, quanto melhor forem os colegas, mais produtivo é um pesquisador. Harvard, Princeton ou o MIT conseguem contratar professores de universidades menos prestigiosas, às vezes até pagando salários inferiores, pois o pesquisador sabe que lá vai encontrar melhores colegas e alunos. Esse efeito de aglomeração é tão pronunciado que a melhor divisão de trabalho na área de pesquisa consiste, na medida do possível, em agrupar os melhores professores e estudantes em uma especialidade.
Uma diferença importante entre os Estados Unidos e o Reino Unido, de um lado, e a Europa continental, de outro, é que até muito recentemente os responsáveis pela política de apoio à pesquisa nos países do continente europeu relutavam em privilegiar com verbas adicionais as instituições mais bem-sucedidas, a fim de garantir um maior "equilíbrio regional". Movida pelo sucesso do modelo anglo-saxão de concentração de recursos, a Europa está mudando. Na sua recente "iniciativa de excelência", o governo alemão confiou a um grupo de pesquisadores a escolha de três universidades para receber 13 milhões adicionais por ano cada uma para incrementar as atividades de pesquisa. Todas as três instituições escolhidas estão no sul do país, duas em Munique e a terceira em Karlsruhe. Na França, apesar do protesto de um "sindicato de pesquisadores" contra a centralização de verbas, o governo decidiu financiar uma rede de pesquisa avançada com 13 pólos, dos quais 6 na região parisiense.
Também no Brasil precisamos fazer exatamente o contrário do que pede a Andifes -uma política eficiente de ciência e tecnologia que concentre recursos nos melhores centros de pesquisa, muitos deles, mas certamente não todos, no Sudeste.

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