Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, junho 21, 2006

Élio Gaspari - O inchaço da máquina do Estado é lorota

O Globo
21/6/2006

Lula inchou a máquina do Estado e torrou o dinheiro dos impostos do
funcionalismo. Um bom “choque de gestão” permitiria que esse dinheiro
custeasse as obras de infra-estrutura necessárias para tirar a
economia brasileira do atoleiro. Quem quiser acredite, mas essa
crença é uma lorota.

Três economistas (Samuel Pessoa, Mansueto Almeida e Fábio Giambiagi)
produziram um estudo que informa: “A percepção de que houve
inchamento dos gastos com funcionalismo ao longo dos últimos dez
anos, em particular, está errada. (...) Julgar que seja possível
implementar um ajuste fiscal duradouro, que permita o crescimento do
investimento público e a redução da carga tributária, com base apenas
em um maior controle dos gastos mais diretamente ligados ao
funcionamento da máquina pública, é, a nosso ver, um equívoco.”

Aos números:

Entre 2003 e 2005 os gastos com servidores ativos ficou onde estava
(2,3% do PIB). O rombo poderia vir das aposentadorias. Ao contrário:
corresponderam a 2,5% do PIB em 2002 e fecharam em 2,2% em 2005.

Se os vilões não foram os servidores, por certo teria sido a gastança
com a máquina do Estado. Falso. Essas despesas baixaram de 2,3% do
PIB em 2002 para 2% em 2005.

Tudo bem, mas entre 2001 e 2005 os gastos não-financeiros do governo
federal pularam de 16,1 % do PIB para 17,7% e a carga tributária está
em 37% da produção. Se a máquina do Estado não bebeu o ervanário,
quem o bebeu?

Resposta: ele foi comido pelos programas sociais, custeando uma
política iniciada no segundo governo governo FFHH. As transferências
de renda dobraram, de 0,7% para 1,4% do PIB. As despesas com
programas sociais passaram de 2% do PIB em 2002 para 2,7% no ano
passado. Um aumento de 20% ao ano, numa economia que cresce a taxa
média de 2,5%.

A boa notícia é que esse investimento encheu a geladeira do andar de
baixo, diminuiu as desigualdades sociais e ampliou o mercado
consumidor. A má notícia: nesse mesmo período o investimento caiu de
0,9% do PIB para 0,6%. Como é o investimento que gera a produção,
chega-se ao dilema do bolo que não deve ser comido enquanto cresce.

Nos anos 70, quando essa metáfora entrou em circulação, o andar de
cima comeu o melhor bocado. Agora, segundo os três economistas, trata-
se de dizer ao andar de baixo que ele precisa parar de comer ou
contentar-se com o que tem no prato, sem querer mais.

O trio sugere que se pise no freio, para que “o crescimento dos
gastos sociais e da previdência (gastos do INSS) aumente a um ritmo
menor do que o crescimento do PIB nominal. (…) É importante que a
sociedade se conscientize de que esse padrão de gasto público está
intrinsecamente associado a um crescimento modesto. Na perspectiva de
que a população discuta os rumos do país nos próximos anos, no
contexto do debate eleitoral de outubro, é importante que esses
dilemas sejam expostos claramente aos eleitores.”

É o segundo lance da Dúvida de Garrincha. Querem que o técnico
Vicente Feola convença Gavril Kachalin do brilho de sua armação. Em
1958, Kachalin era o técnico da seleção russa. Tinha um futebol
científico e perdeu por 2 x 0, gols de Vavá.

• Sob o título “Gastos sociais deveriam crescer a ritmo menor do que
o PIB” , o trabalho está anunciado no sítio do IPEA, o Instituto de
Pesquisa e Economia Aplicada.

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