Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, junho 26, 2006

VEJA O pit stop da Pixar


Carros não é o melhor desenho
da produtora de Toy Story.
Mas a concorrência continua
uma volta atrás


Isabela Boscov

 

Divulgação
Relâmpago, o velho guincho e o elegantérrimo Hudson Hornet: ode à vida sobre rodas


Há alguns meses, concluiu-se uma operação sui generis na indústria do entretenimento: a produtora Pixar foi comprada pela Disney por 7,4 bilhões de dólares – mas ela é que vai dar as cartas no claudicante departamento de animação de sua nova dona. Oficialmente, então, a Pixar passa a ser um gigante. E esse status parece ter afetado de forma decisiva a recepção a Carros (Cars, Estados Unidos, 2006), que estréia nesta sexta-feira no país. De Toy Story a Os Incríveis, os seis filmes anteriores da companhia chefiada pelo animador John Lasseter fizeram não apenas carreira milionária na bilheteria, como foram também unanimemente elogiados pela crítica. Carros, porém, só tem levado bordoadas. Reclama-se de que ele idealiza o passado e exalta a civilização automotiva bem no momento em que o preço do barril de petróleo está batendo nas alturas – e o planeta, se aquecendo além da conta. Num excesso politicamente correto, Manohla Dargis, do The New York Times, queixou-se de não haver nenhum veículo bicombustível entre os personagens, como se um desenho fosse o responsável por decidir os hábitos dos futuros motoristas americanos. Mas Carros passa muito longe de ser um desastre, e a sensação que essas críticas deixam é que o assunto é outro: a Pixar esgotou a boa vontade regulamentar que se costuma dedicar aos pequenos e valentes.

Como todos os desenhos supervisionados por Lasseter, Carros discorre sobre a importância de fazer amigos e mantê-los. Relâmpago McQueen (na versão original, com a voz de Owen Wilson), um jovem e prepotente carro de corrida, não sabe disso até se perder em Radiator Springs, a caminho da etapa final de um torneio. Outrora um ponto movimentado da legendária Rota 66, a cidadezinha caiu no esquecimento desde que o tráfego foi desviado para a rodovia interestadual. Seus poucos remanescentes – um guincho enferrujado, uma Porsche que trocou a vida veloz de Los Angeles pelo interior e um elegantérrimo Hudson Hornet 1951 (dublado por Paul Newman) – esperam, em vão, que essa espécie de museu a céu aberto dos anos 50 seja redescoberta. Relâmpago, preso por mau comportamento, está ali a contragosto, desesperado para participar de sua competição. Mas, à medida que os dias passam, vai perdendo a pressa e se deixando conquistar pelo jeitão afetuoso de seus conhecidos. No final, quando chegar a seu destino, já será um novo homem – ou melhor, um novo carro.

Se há uma objeção ao filme que faz sentido, ela está aí. Únicos seres "vivos" de Carros, os automóveis não primam pela maleabilidade. Apesar de alguns bons achados, como a manada de tratores ruminantes e as moscas em forma de Fusquinha, animar essas carrocerias rígidas é uma tarefa dura até para o talentoso time da produtora. O resultado é que os personagens demoram mais que o habitual a seduzir, a sutileza com que a Pixar costuma temperar suas mensagens se perde e esse mundo em que nada é nem aparenta ser orgânico se torna algo cansativo (mas só um pouquinho). Carros, enfim, não é o melhor trabalho da Pixar, o que equivale a dizer que um filme de Woody Allen não é o seu melhor: mesmo quando não é ótimo, dá de dez na concorrência.

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