O Estado de S. Paulo
27/6/2006
O Fomc vai trabalhar na quinta-feira. Vai definir o novo nível dos
juros no mercado americano e passar o seu recado de praxe sobre o
comportamento da economia.
Apenas para os desacostumados com siglas assim, Fomc é o Copom
americano, cujo nome e sobrenome é: Federal Reserve Open Market Comitee.
Há muitos anos uma decisão sobre o tamanho dos juros nos Estados
Unidos não causa tanta expectativa. Curiosamente, desta vez, poucos
especialistas apostam em avanço dos juros superior a 0,25 ponto
porcentual, para 5,25% ao ano. A trajetória dos juros futuros
apontada nos negócios financeiros, por exemplo, já prevê uma alta
dessas proporções, nem menos nem mais.
Então, cabe a pergunta: se está tudo tão previsível, por que tanta
comoção? A resposta: porque as pessoas agora querem alguma indicação
do que vem a seguir: what next?
Uma das características do mercado financeiro é sua baixa tolerância
a incertezas. Se, por exemplo, tivesse uma boa indicação de que os
juros básicos continuariam sua marcha de alta de 0,25 ponto a cada
reunião do Fomc até o máximo de 6,0% ao ano, o mercado financeiro
talvez reagisse com mais serenidade do que se a incerteza se
limitasse a uma faixa mais baixa, entre 5,5% e 5,75% ao ano.
Por isso, quer saber melhor o que pensa o Federal Reserve (Fed, banco
central dos Estados Unidos). Mesmo se for atendido nesse item, o
mercado tende a continuar inseguro, porque tem saudades de Alan
Greenspan, o presidente anterior, que deixou o Fed em janeiro. Piada
recorrente é o que Greenspan dizia a suas platéias: "Se vocês
entenderam o que acabei de dizer é porque não me expressei bem."
Enfim, as pessoas confiavam em Greenspan, mesmo quando ele não dizia
nada ou, simplesmente, quando enrolava. Hoje, mesmo sendo mais
transparente e mais claro do que Greenspan, Bernanke ainda não
conquistou confiança. Por isso, sempre lhe pedem um sinal a mais.
No depoimento que deu dia 15, Bernanke disse duas coisas: que as
pessoas precisam ter confiança na capacidade do Fed de combater a
inflação; e que não devem exagerar ao avaliar as conseqüências da
inflação porque exageros assim correm alto risco de se autocumprirem.
Num primeiro momento, essa fala de Bernanke provocou alívio geral. A
sensação foi de que, afinal, falou coisa com coisa. Depois, voltou o
nervosismo, porque o mercado questionou se o presidente do Fed não
foi complacente demais com a inflação, algo inadmissível em quem
ocupa seu cargo.
Isso significa que, por mais claro que o Fed seja ao projetar o
futuro da inflação e dos juros, o mercado financeiro continuará
inseguro. Até quando? Até que tenha suficiente confiança em Bernanke,
algo que acontece no domínio dos corações e mentes e pouco tem de
objetivo.
A volatilidade externa tem provocado alguns estragos na economia
brasileira. Os capitais de investimento estão mais arredios; as
aplicações estrangeiras na Bolsa quase sumiram; o índice de risco
saltou dos 214 pontos para 263 pontos, ou seja, ficou mais caro
atrair capitais para a cobertura da dívida brasileira.
No entanto, essa reação externa se parece mais com reflexos
condicionados a crises passadas do que o resultado da análise do
atual estado da economia. A turbulência externa não provocou fuga de
capitais, mesmo nessa fase pré-eleitoral. À medida que entender que
não há o que possa virar essa canoa, o mercado tenderá a mudar seu
diagnóstico e sua percepção sobre a economia brasileira.