Geraldo Alckmin é um político sério e competente. Se ganhar as
eleições presidenciais, tem experiência e liderança para fazer uma
boa administração. Infelizmente, parece que a necessidade de
conquistar votos o está levando a falar sem avaliar o que diz.
Foi o caso de três declarações contra a política econômica e o Banco
Central. Sobre a autonomia legal deste, Alckmin disse que
“teoricamente a medida é acertada”, mas não seria prioridade em seu
governo. “A prioridade é o crescimento da economia.” A autonomia,
disse, não é importante para o PSDB, que tem um “histórico de
credibilidade fiscal”. Ou seja, quem precisa dela é Lula.
Com todo respeito, a declaração não faz sentido. Como mostrei aqui
domingo, a autonomia legal aumenta a confiança, contribui para baixar
os juros e cria a obrigação de prestação de contas. Somente três
países da América Latina não adotaram a medida: Brasil, República
Dominicana e Guatemala. O Banco Central boliviano é legalmente
autônomo desde 1995.
A literatura mostra uma correlação negativa entre autonomia legal e
inflação, ou seja, quanto maior a primeira, menor a segunda. Nos
países que adotam o regime de metas de inflação, como o Brasil, a
autonomia legal reduz a volatilidade do PIB. Estabilidade, juros em
queda e baixa volatilidade do PIB aumentam o investimento privado.
Assim, se a prioridade é o crescimento, a concessão da autonomia
legal é uma das saídas.
A medida transforma o BC em órgão de Estado, com capacidade de
resistir a ações voluntaristas de futuros governos. A importância da
medida não está na credibilidade de determinado partido, mas na
necessidade de dotar o Brasil de boas instituições.
A segunda declaração foi sobre o pagamento da dívida com o Fundo
Monetário Internacional (FMI). Para Alckmin, a decisão foi “burrice,
burrice, burrice”, pois se trocou dívida barata por outra mais cara,
a interna. Pelo raciocínio, o Brasil deveria ter apenas dívida
externa, dado que esta será sempre mais barata, salvo quando o
governo dá calote na dívida interna e limita a remuneração dos
investidores, como no Plano Collor. Felizmente, isso é coisa do passado.
Pagar a dívida com o FMI valeu a pena. Vários países fizeram o mesmo.
A experiência mostra que isso ajuda a obter o grau de investimento
das agências de avaliação de riscos, o que faz cair os juros
internos. Resultado: haveria menores custos para o Tesouro e redução
adicional da vulnerabilidade externa. Para entender a importância de
uma vulnerabilidade menor, basta observar como a recente turbulência
nos mercados financeiros não causou danos à economia.
Na terceira declaração, Alckmin fez uma grave acusação. Aludiu a
“populismo cambial”, sugerindo que o BC promove a valorização cambial
para baixar a inflação e ajudar Lula a reeleger-se. Nada mais
injusto. O BC vem construindo sua credibilidade desde as reformas dos
anos 1980, que lhes deram a feição de autoridade monetária clássica.
No governo de Fernando Henrique Cardoso, ganhou autonomia
operacional. Pragmaticamente, Lula reforçou esse status. Ora, não dá
para imaginar que o BC jogaria fora esses avanços e a reputação de
sua diretoria para atingir objetivos eleitorais.
Ao criticar a política econômica e o BC, Alckmin agrada segmentos
como o do empresariado. Acontece que seus integrantes dificilmente
votariam em Lula. Assim, além de desperdiçar o verbo, o candidato
pode criar problemas para si caso venha a se eleger.
Político inteligente e sensato, ele perceberia as vantagens de
conceder autonomia legal ao BC, continuaria a reduzir a dívida
externa (caso as condições de liquidez internacional o permitissem) e
dificilmente cederia às pressões para promover a desvalorização
artificial da moeda. Seria alvo das mesmas críticas que o PSDB faz a
Lula, isto é, de dizer uma coisa na campanha e fazer outra quando
assume a Presidência.
Sou um admirador do ex-governador Alckmin e peço que me desculpe a
ousadia da sugestão: pare de criticar a política econômica, procure
realçar os desvios éticos do PT e do governo Lula, e convença o
eleitor de que faria melhor nos programas sociais e na gestão do
governo.
Em outras palavras, tente provar que em seu período o Brasil
cresceria em ritmo maior, mas não porque mandaria mudar juros e
câmbio. Felizmente, isso não está mais ao alcance do presidente, a
não ser que assuma os respectivos e enormes riscos políticos.