Americanos retomam um de seus
esportes favoritos: reabilitar a
"essência da masculinidade"
Adriana Maximiliano
Pobres homens. Principalmente, pobres homens americanos. Nos últimos cinqüenta anos, só os muito, mas muito seguros de si souberam como se posicionar na sociedade de uma forma que, ao mesmo tempo, expressasse masculinidade e não ferisse sentimentos a torto e a direito. Onde se enquadrar, sem extrapolar na ternura, entre qualificações como metrossexual, emo (de emotivo) boy, übersexual (um pouco mais macho, mas ainda sensível e doce)? Nesse cenário tão, com o perdão da palavra, melindroso, de tempos em tempos surgem movimentos que buscam reeditar a essência da masculinidade perdida. Em 1990, o poeta Robert Bly escreveu Iron John e virou guru de engravatados que, nos fins de semana, dando forma literal a suas ponderações, enfurnavam-se na floresta, tocando tambor e entrando em contato com seu "ele" interior. O tempo passou, David Beckham fez escola com cortes de cabelo e unhas pintadas e eis que agora, nas livrarias e na publicidade, presencia-se a reinvenção do herói despudoradamente machão, daqueles que não sabem se vestir, não penteiam o cabelo e não fazem sequer a barba, quanto mais as unhas. "As diferenças entre homens e mulheres estão sendo negadas. Quando os gêneros se confundem, o homem perde sua força", proclama Harvey C. Mansfield, professor da Universidade Harvard e autor de Manliness (Masculinidade), que chegou ao 38° lugar na lista dos mais vendidos do site Amazon.
A leitura considerada meio difícil restringe o potencial de venda do livro de Mansfield. O mesmo não acontece com The Alphabet of Manliness (O Alfabeto da Masculinidade), um texto muito menos elaborado que explica, de A a Z, como ser machão e que às vésperas do lançamento era o número 1 na lista de reservas do site. "Queremos agir como machos e não queremos ser julgados. Estamos fartos, por exemplo, da perseguição dos fiscais da moda. Não há nada de errado em um cara ter mau gosto para se vestir. Um homem malvestido é de uma honestidade tocante", brada Maddox, pseudônimo (sem sobrenome) do ex-programador de computadores George Ouzounian, que, numa entrevista, admitiu: "Eu não tenho tese nenhuma. Se houver um único fato em meu livro que possa servir de subsídio para os leitores, para mim vai ser surpresa". Outro destaque dessa lucrativa vertente literária é Tucker Max, 31 anos, autor de I Hope They Serve Beer in Hell (Espero que Sirvam Cerveja no Inferno). No livro e em seu site, Max conta episódios de sua vida em que bebeu até cair, fez sexo com desconhecidas e deu vexame em público. Recebe centenas de e-mails por dia de homens que o elogiam e de mulheres que o convidam para sair, mesmo correndo o risco de ter foto e história publicadas no site.
Fotos divulgação |
Músculos à mostra: no anúncio de cerveja, de sanduíche e de papel-toalha |
Nada a ver com valores como força, coragem, proteção – essa nova busca da masculinidade perdida nos Estados Unidos valoriza mesmo é soco na mesa e palito no dente. Na propaganda da cerveja Miller Lite, dez incontestáveis machões – entre eles o ator Burt Reynolds, o campeão de luta livre Triple H e o alpinista Aron Ralston, que amputou o próprio braço depois de um acidente em uma escalada – discutem em torno de uma mesa o que chamam de "Leis de Homem" (veja o quadro). Exemplo: brinda-se com o gargalo ou o fundo da garrafa de cerveja? (Resposta: com o fundo. No gargalo, "salivas se encontram, como num beijo".) O propósito da cervejaria era ampliar o leque de consumidores da Miller Lite, cerveja menos calórica e pouco associada a paladares masculinos. Não se sabe se conseguiu, mas a série de comerciais causou furor e milhares de novas leis foram sugeridas e comentadas por internautas no site da campanha, o ManLaws.com. Repercute mais forte ainda nos instintos masculinos a propaganda da rede de fast-food Burger King em que um homem recusa a porção microscópica em um restaurante requintado, larga a namorada sozinha na mesa e marcha para a lanchonete mais próxima. Uma multidão de machões enfurecidos se une a ele, dando socos, destruindo carros, arrastando caminhão, queimando cuecas, tudo com megassanduíches nas mãos. No fim, o slogan: "Coma feito homem". Também muito macho é o garoto-propaganda do papel-toalha Brawny, um lenhador charmoso que passa o dia dando duro na floresta e ainda mantém a casa limpa. No comercial, ele aparece fazendo a barba com faca, dando mamadeira para filhote de crocodilo e empurrando uma caminhonete ladeira acima. "Na minha opinião, o metrossexual veio, foi embora e a maioria dos homens nem entendeu o que aconteceu", analisa Michael Yeon, diretor de marketing da masculiníssima revista Maxim, que lançou uma bem-humorada campanha contra a extinção do macho, com direito a teste de masculinidade e desenho animado em que um fiscal vive no encalço de homens que andam de patins e cortam o cabelo em salão de beleza. "Queremos mostrar ao leitor que entendemos e apoiamos seu propósito de continuar sendo macho", diz Yeon. Assim será – até que a próxima chamada à sensibilidade estrague tudo outra vez.
REGRAS DE CONDUTA
Uma cervejaria americana reuniu na internet sugestões de leis que devem reger o comportamento dos verdadeiramente machos do planeta. Entre as mais citadas:
• Telefonema de homem para homem não pode durar mais do que cinco minutos. Sem exceção
• Dente é o único cortador de unha aceitável do homem
• Homem jamais paga para alguém trocar o pneu do carro
• Homem não dá apelido aos órgãos genitais. Nem permite que a mulher dê
• Homem solteiro não tem gato como animal de estimação
• O cabelo do homem não pode ser mais comprido que o da mulher. E cortar, só no barbeiro
• Dois homens de verdade nunca ficam lado a lado no banheiro público. Se não houver intervalo adequado, é melhor voltar depois
• Homem que é homem usa cueca samba-canção