Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 17, 2006

Dora Kramer Acabou-se o que era doce

Estado
A partir de agora, além de falar, Lula vai precisar ouvir e saber se
defender

O tom do programa de televisão e do discurso do PFL na convenção do
partido no Distrito Federal, ambos na quinta-feira, mostrou que a
temporada de ataques eleitorais ao governo fará do presidente Luiz
Inácio da Silva seu personagem principal - como de resto era o
esperado - e sinalizou que o armamento será pesado.

Lula não vai mais falar sozinho como fez nos últimos cinco meses. Vai
ouvir e precisará saber se defender com argumentos melhores que os
utilizados na sexta-feira pelo presidente do PT. Ricardo Berzoini
apontou a falta de "moral" dos oposicionistas para atacar o
presidente e acusou o "nervosismo" do adversário.

Além de não contar novidade - é patente o desassossego na chapa PSDB-
PFL -, o petista e seu partido não estão exatamente numa posição
confortável para cobrar moral ao alheio.

Ao PT não sobra autoridade para falar de corrupção nem de coerência
em relação ao passado, pois não se constrangeu em adotar, uma vez
eleito, prática oposta à proclamada na campanha de 2002. Pregou uma
coisa, fez outra e, ainda que tenha feito o correto ao esquecer suas
bandeiras da vida toda, agora paga o preço imposto pelas
circunstâncias de ser governo.

O próprio presidente Lula ontem ensaiou resposta, alegando que não
cairá no "jogo rasteiro" da oposição. Esqueceu-se de que ele mesmo
pediu que seus adversários usassem as investigações das comissões de
inquérito na campanha. Lançou o desafio não faz duas semanas, foi
atendido e, portanto, não está em posição de reclamar.

Quanto à frase que rendeu manchetes dita pelo candidato a vice de
Alckmin, senador José Jorge - "O presidente não trabalha, só viaja e
bebe muito" -, acompanhou o mesmo diapasão de deselegância do jogador
Ronaldo. Com a diferença de que o rapaz não disputa nada, estava se
dirigindo ao presidente de seu país e o senador, ao contrário,
atacava um oponente eleitoral que usa a condição de presidente para
se comportar como candidato.

E à resposta de Ronaldo Lula não reagiu. Pediu desculpas, procurou
dar o dito pelo não dito, fez de conta que não viu ofensa na
referência ao hábito de beber em excesso e sequer lhe passou pela
cabeça considerar a declaração um ato "rasteiro" do jogador. Claro,
isso lhe renderia risco de prejuízo eleitoral bem calculado.

Quando ele mesmo, Lula, se põe sistematicamente em palanque usando os
instrumentos ao alcance de seu poder sem observar os limites da lei
nem as restrições do cargo, convenhamos, dá ao inimigo o direito de
revidar usando também as armas à mão.

E estas são, além da palavra, os fatos ocorridos durante o governo do
postulante à reeleição. No programa do partido, o PFL nada mais fez
que mostrar uma retrospectiva dos escândalos, destacando as relações
dos principais envolvidos com o presidente da República.

Lula havia assegurado destemor quanto ao uso do material das CPIs
como quem a ele não confere muita importância ou potencial negativo
sobre a candidatura. Pela reação ao cumprimento do desafio, é de se
supor que a estratégia de defesa do governo será a mesma de sempre: a
tentativa de desqualificar o denunciante, na impossibilidade de
desmentir a denúncia.

Nisso, a tarefa avizinha-se grandiosa, pois Lula não terá contra si
na linha de ataque apenas o PFL e o PSDB. Outros dois personagens se
preparam para entrar em cena e, goste-se deles ou não, ambos -
Anthony Garotinho e Roberto Jefferson - têm seu público e seu poder
de influência.

Garotinho fará do PSC uma trincheira e do candidato à Presidência da
República, Rodrigo Vargas, um "laranja" que lhe possibilitará usar o
horário eleitoral gratuito para trabalhar contra Lula, a quem ele
atribui o enterro de seus planos de sair candidato pelo PMDB.

Jefferson perdeu o mandato e os direitos políticos durante oito anos,
mas nada o proíbe de atuar como cabo eleitoral da oposição a partir
de palanques do PTB ainda controlados por ele.

Os dois foram eleitores e defensores de Lula em 2002, por motivos
diversos, consideram-se traídos e contra ele descarregarão sua fúria
com a sem-cerimônia de quem não está com a cabeça diretamente em jogo.

Ao cenário de uma nova e mais espinhosa fase que se inicia,
acrescente-se a disposição do PSB e do PC do B de não formalizar
aliança com o PT.

Parece pouco, levando-se em conta o peso dos dois partidos, mas é
bastante no tocante ao tempo de televisão, reduzido a menos de seis
minutos contra nove do PSDB-PFL, caso o PT siga mesmo sozinho
sustentado no candidato e seu carisma.

Monopólio

Faz 10 dias, a Mesa Diretora da Câmara fechou um acordo com a Brasil
Telecom pelo qual a operadora tem o monopólio de todas as ligações
feitas da Câmara e dos apartamentos funcionais.

O ato fere o princípio da livre escolha por parte do usuário e lança
uma suspeita: o ganho da Brasil Telecom é evidente, mas a recíproca
já não é tão transparente. A Câmara precisa explicar as vantagens e
motivações de tal acerto.

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