Entrevista:O Estado inteligente

sábado, setembro 10, 2005

A pátria mandou recado

VEJA

No 7 de Setembro, Lula é aplaudido e
vaiado – o que, no seu caso, é péssimo


Otávio Cabral


Celso Junior/AE
MIL PALAVRAS
Lula, no desfile de 7 de Setembro, em Brasília: só faltava essa, mas a foto foi "desmentida" pelo governo...


No ano passado, o presidente Lula chegou às festas do 7 de Setembro em Brasília no auge de sua forma política: desfilando em carro aberto, foi aplaudido, distribuiu sorrisos e deixou a festa acenando para uma multidão recorde de 60.000 pessoas. Na semana passada, a cena era inteiramente outra. Lula chegou em carro aberto sob forte esquema de segurança. Foi aplaudido e vaiado. Havia 30 000 pessoas, pouco mais da metade do esperado. Quando o locutor anunciou a chegada do presidente e da primeira-dama Marisa Letícia, ouviram-se as primeiras vaias. Quando Lula pegou o microfone para abrir a festa, ouviu-se novo coro de apupos, sempre vindos das arquibancadas mais distantes, onde um cartaz dizia o seguinte: "Lula, que traição! Tirou do povo para pagar o mensalão!". Os protestos foram até discretos, mas seria um erro encará-los como desprezíveis alaridos de troça. As vaias são um péssimo sinal para Lula.

Numa democracia, protestos não são novidade nem motivo para alarme. Que atire a primeira pedra o dirigente de um país democrático que não tenha sido alvo de uns apupos. Mas no caso de Lula a situação é um pouco diferente. Lula construiu sua carreira como um líder de massas, talvez seja a mais carismática liderança política surgida no país desde o fim da ditadura militar e – para coroar isso tudo – chegou ao Palácio do Planalto a bordo de uma votação excepcional. Apesar de perder três eleições em uma década, Lula sempre fora, digamos assim, um "político pop". Sua ascensão na vida pública, de líder sindical a presidente da República, deu-se sempre em contato com as multidões – em assembléias, palanques, caravanas. Por isso, as vaias contra Lula chamam mais atenção do que se fossem dirigidas a seu antecessor Fernando Henrique, um egresso do meio acadêmico que jamais eletrizou as massas. As vaias a Lula rompem um dique de popularidade e carisma que outrora pareceu tão sólido – e de cuja robustez nenhum outro presidente da era democrática desfrutou.

O prestígio de Lula se esboroa em público na mesma medida em que a crise à sua volta se avoluma. Na noite do dia 7 de setembro, Lula fez seu segundo pronunciamento em cadeia de rádio e televisão sobre a crise. Garantiu que não vai chancelar "acordos subalternos" e se dirigiu a uma parcela de brasileiros a quem chamou de "mal-intencionados", aos quais disse que as "turbulências políticas não vão tirar o governo de seu rumo". Sobre o essencial, nenhuma palavra: nada sobre o fato de que a crise saiu de seu governo, nada sobre o fato de que seu partido, o PT, girou o carrossel da corrupção. Nesse sentido, foi um pronunciamento de sonâmbulo. Só não foi inteiramente sonambúlico porque, diante da câmera de televisão, era visível o esforço de Lula para acreditar nas próprias palavras. Em tempo: a foto que ilustra esta reportagem foi feita pelo fotógrafo Celso Junior, da Agência Estado, e contestada em carta pela assessoria do Palácio do Planalto, ao que o jornal O Estado de S. Paulo respondeu: "Salvo melhor juízo, esta é a primeira vez na história da imprensa em que se tenta desmentir uma foto".

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