O Globo
A saída do deputado Severino Cavalcanti da presidência da Câmara deixou de ser, em questão de horas, uma disputa política da oposição em torno de um clima favorável a eventual processo de impeachment político do presidente Lula, para se transformar em um símbolo da reconquista da credibilidade do Congresso brasileiro, tão desacreditado por essa crise que se arrasta há mais de três meses.
Especialmente agora, depois do relato minucioso do concessionário do restaurante da Câmara, revelando toda a baixeza da extorsão de que foi vítima pelo então primeiro-secretário da Mesa, tornou-se imperativo que os deputados façam um resgate moral da instituição, corrijam o erro que cometeram ao elegê-lo presidente, o terceiro homem na sucessão presidencial.
Todos os que estavam tomando posição política no episódio voltaram atrás. A oposição deixou de imaginar que poderia se aproveitar do momento para impor um nome seu para a presidência da Câmara, e assim criar clima político propício para contestar mais abertamente o presidente da República. Até mesmo o Palácio do Planalto, cuja primeira reação foi apoiar Severino para impedir esse movimento oposicionista, voltou atrás ao entender que se ligar a ele poderia ser um erro político fatal.
Os políticos entenderam, não tão rápido quanto a opinião pública, que o que estava em jogo era a imagem da Câmara como instituição, pois a atuação de Severino já estava incomodando antes mesmo do surgimento da denúncia do mensalinho. Sua tentativa de interferir no andamento das investigações, ora defendendo penas mais brandas para seus apaniguados, ora participando de uma farsa para explicar o R$ 1 milhão que o líder de seu partido, deputado José Janene, recebeu de Marcos Valério, já justificaria o pedido de cassação por quebra de decoro parlamentar.
Mas faltava a prova documental, que tirou os temores e suspeitas do plano subjetivo e os levou para a realidade política, onde um poder fragilizado como o Legislativo tem em Severino Cavalcanti a prova ambulante de suas mazelas. Uma pesquisa realizada pelo Ibope Opinião, entre os dias 18 e 22 de agosto em todo o país, mostra bem a percepção da opinião pública a respeito dos políticos. O estudo sobre o grau de confiança dos brasileiros nas instituições mostra, em sua última edição, que 90% dos brasileiros não confiam nos políticos, o índice mais alto desde 1989, quando começou a ser feito e já mostrava que 81% não acreditavam em políticos.
O perigo é que esse descrédito em relação aos políticos e às instituições como os partidos alcança o mais alto índice comparado ao ano de 89, quando foi eleito presidente Fernando Collor, um político que se dizia diferente dos demais, indicado por um pequeno partido. Naquele ano, a desconfiança dos brasileiros nos partidos políticos atingiu 70%, e hoje chega a 88%. Sintomaticamente, em 1992, ano do impeachment de Collor, os índices melhoraram um pouco: caiu para 67% o índice dos que não confiavam em partidos políticos, e para 77% os que não confiavam em políticos de maneira geral.
Outras instituições viram corroerem-se as expectativas da população em relação a elas, como a Câmara dos Deputados, que hoje não tem a confiança de 81% dos brasileiros, índice que em 2003 era de 63% ; e o Senado Federal, desacreditado por 76% da população, sendo que em 2003 o índice era de 57%. A reação da sociedade também pode ser medida pelas últimas manifestações populares contra a corrupção, ocorridas em diversos pontos do país. Em várias delas, havia cartazes contra os políticos, sem distinção de partidos ou ideologias.
Há também um temor de que as próximas eleições provoquem o retorno da campanha pelo voto nulo, que teve seu auge não por acaso também nas eleições de 1989, quando houve um índice de 44% de votos brancos e nulos nas eleições para a Câmara. Na última eleição, o comparecimento do eleitorado aumentou, e o índice de votos brancos e nulos chegou a apenas 8%, muito devido às urnas eletrônicas, mas também pelo entusiasmo do eleitorado com a perspectiva de mudanças.
Já há na internet um movimento pelo voto nulo, baseado na informação equivocada de que se houver 50% mais 1 de votos nulos no segundo turno da eleição presidencial, ela será anulada e os dois candidatos finalistas não poderão disputar a nova eleição. Pela legislação eleitoral em vigor, no entanto, não existe essa possibilidade. Será considerado eleito o candidato que obtiver maioria dos votos válidos, descontados os brancos e nulos.
Todos esses temores estão fazendo convergir as atenções dos políticos para a necessidade de fazer uma limpeza no Congresso, a começar pelo seu presidente. Diante das provas e evidências acumuladas, já não existe mais a possibilidade de o corregedor, seu afilhado deputado Ciro Nogueira, não encaminhar ao Conselho de Ética o processo por quebra do decoro parlamentar contra Severino Cavalcanti, que será apresentado pela maioria dos partidos da Câmara na próxima semana.
Muito menos há possibilidade de, retornando de Nova York, Severino Cavalcanti continuar presidindo a Câmara. Se insistir, mesmo com um processo correndo contra ele, provocará uma obstrução sem precedentes nos trabalhos da Câmara, até que decida se afastar. A melhor solução, do seu ponto de vista eleitoral, será renunciar ao próprio mandato, não sendo suficiente mais renunciar à presidência da Câmara, pois o processo de cassação prosseguirá na Comissão de Ética da Câmara. Situação e oposição já negociam nomes para uma escolha de consenso, conscientes de que não é hora de disputas políticas.
Entrevista:O Estado inteligente
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