Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, setembro 21, 2005

DORA KRAMER As flores da ambigüidade

 

O ESTADO DE S PAULO

PMDB arcou com o ônus e agora pode recolher o bônus de ser um partido dividido As voltas do mundo, velozes e não raro surpreendentes quando o assunto é a política, podem transformar o PMDB no beneficiário da mesma ambigüidade que tantos prejuízos já impôs à imagem do partido. A fonte das dores, a dubiedade, o levaria agora a recolher as flores.

A ausência de nitidez nas posições, a presença na legenda de opiniões para todos os gostos, sejam eles de governo ou de oposição, e os atributos pessoais de moderação e experiência anterior no ramo fazem hoje do presidente do PMDB, deputado Michel Temer, o nome mais provável para assumir a presidência da Câmara no lugar de Severino Cavalcanti.

Isso se a opção do colegiado for por uma solução negociada de consenso, bem entendido; caso os partidos resolvam disputar o poder no voto, o resultado é imprevisível, bem como o número e os nomes dos candidatos.

Temer seria assim uma espécie de escolha por exclusão: presidente da Câmara por duas vezes durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, embora seja aliado ao grupo de pemedebistas próximo ao tucanato, Michel Temer é tido como um legalista cuja atuação não daria margem a temores do governo com relação, por exemplo, à aceitação de um possível pedido de impedimento contra o presidente da República com base em argumentos primordialmente políticos.

Uma vantagem em relação a candidatos de partidos de posições nítidas e, por isso mesmo potencialmente produtoras de conflitos. O PSDB e o PFL teriam a restrição dos governistas e o PT seria vetado pelos oposicionistas. Candidaturas desses três partidos levariam automaticamente à apresentação de nomes adversários, impedindo a realização do cenário ideal do consenso.

No PMDB, o trabalho é intenso em favor de Michel Temer. Fernando Henrique e José Serra já foram consultados pelo deputado Geddel Vieira Lima, bem como o presidente do PPS, Roberto Freire, o deputado Fernando Gabeira - na condição de ícone da crise Severino - e também alguns pefelistas. A reação foi favorável. O mais novo filiado do partido, Delfim Neto, iria ontem defender a oportunidade da candidatura junto ao presidente Luiz Inácio da Silva, sob a alegação de que Temer seria o nome mais próximo da neutralidade que o governo, fragilizado politicamente, poderia almejar.

Evidentemente, trata-se de uma isenção em termos, dado o alinhamento do presidente do PMDB à oposição desde a posse de Lula.

Por isso mesmo, até os pemedebistas mais firmemente contrários ao governo estão vestidos com o figurino da conciliação. De olho na presidência da Câmara e na acumulação do poder no Congresso, pois o presidente do Senado também é do partido, fazem o discurso da moderação total.

Argumentando o seguinte: conflagrada e desmoralizada como está, a Câmara não significará para seu futuro presidente a mesma fonte de poder que representa em tempos normais. Sendo eleito como produto de consenso, teria necessariamente de se submeter aos ditames do colegiado, sem margem de manobra para imposição de uma agenda, seja ao Planalto, seja ao conjunto da Casa.

A dubiedade e a divisão do PMDB também favorecem a sustentação da tese segundo a qual o partido, mesmo acumulando comandos, não seria assim tão absolutamente poderoso quanto um partido com unidade interna de ação e pensamento.

Há resistências, o convencimento ainda não é suficiente para dizer que o caminho do consenso está construído em torno de Temer. Mas, o que anima seus aliados, é o fato de nas conversas preliminares o presidente do PMDB ser pelos menos uma segunda opção palatável aos outros partidos e não ter recebido o veto preliminar de nenhum deles.

De qualquer forma, o jogo para valer começa hoje, logo após a renúncia de Severino e a convocação oficial da eleição do novo presidente daqui a dez eletrizantes dias.

Gentil patrocínio

Severino Cavalcanti não tem do que reclamar. Nas suas 48 horas finais como presidente da Câmara ganhou vários presentes de despedida.

Do presidente Lula, a garantia da manutenção de seus afilhados no governo federal, da Mesa da Câmara, a preservação dos empregos dos parentes, entre os quais a nora e a filha. Do presidente do Conselho de Ética ganhou o maior deles: o atraso do início do processo de cassação, de modo a lhe permitir renunciar sem perder a prerrogativa de se candidatar em 2006.

O gesto, legal, porém ilegítimo diante da natureza e da comprovação das denúncias de corrupção, ao menos evidencia o absurdo de permitir o uso da renúncia como atalho ao perdão de penitentes de ocasião.

Terra em transe

A política na Bahia ferveu ontem com o anúncio da transferência do ex-prefeito Antônio Imbassahy do PFL para o PSDB. Com isso, o grupo de Antonio Carlos Magalhães sofre importante baixa e, para tentar se precaver do isolamento, despachou ontem mesmo o governador Paulo Souto ao encalço de antigos adversários, em busca de uma conversa amiga.

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