Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 03, 2005

O homem que sabia de menos Luiz Weiss

   
 

Nem o gélido José Dirceu – de quem os gringos diriam que neve não derreteria na sua boca e que só perdeu o eixo quando ouviu que já tinha nascido arrogante –, nem o seu operístico acusador Roberto Jefferson, todo cheio de caras, bocas e pausas retóricas, foram ao fundo da questão.

Quem o fez foi o pefelista baiano José Carlos Aleluia, um dos três mais competentes arguidores da jornada. Os outros foram o seu conterrâneo e correligionário Jairo Carneiro, relator do processo contra Jefferson no Conselho de Ética da Câmara, e o tucano paranaense Gustavo Fruet, sub-relator da CPI dos Correios.

Aleluia mostrou por que Dirceu ficou na situação de que se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.

No papel do homem que sabia de menos, Dirceu não convenceu nem a velhinha de Taubaté. Com todo o respeito, nem a senhora sua mãe, lá em Santa Rita do Passa Quatro, há de ter acreditado que o filho todo-poderoso e todo-controlador e os Delúbios que ele plantou na Executiva do PT viviam em galáxias diferentes.

A alternativa, naturalmente, seria ele dizer: sim, eu sabia. Para não dizer, sim, eu mandei. Mas – e aí é que entra o brilhante raciocínio de Aleluia – se ele admitisse até a mais branda versão possível do seu envolvimento no caixão 2 em que a cúpula do PT sepultou a honra perdida, em nome de um projeto de poder, só faltaria dizer, com todas as letras, que o presidente Lula também sabia. No mínimo.

Porque, mesmo se ele matasse no peito, como diria Jefferson, a integral responsabilidade pela compra por atacado de políticos, a idéia de que ele aprisionou o presidente no buraco negro da absoluta ignorância do que faziam ele e os seus companheiros seria ainda menos crível do que os rechaços e repilos do seu depoimento.

Não que, em tese – e põe em tese aí - isso não pudesse ter acontecido. Mas nesse caso Dirceu não seria o Dirceu da "obediência canina" ao chefe, o Dirceu que nada fazia à sua revelia e o Dirceu que só fazia o que ele mandava.

Portanto, para não colocar o presidente na frigideira, ele só podia passar por bobo, sabendo que ninguém seria bobo de acreditar na bobagem.

A conexão portuguesa

Mas não tem escapatória: quando ele for cassado e recorrer ao Supremo, como anunciou - sob o previsível argumento de que não só não ofendeu o decoro parlamentar, porque é inocente, mas nem podia, porque estava no governo e não na Câmara - decerto será alvo de um processo por crime de responsabilidade.

Ou, a crer na miragem a que o homem-forte do governo e do PT recorreu para se declarar "inocêncio" no Conselho, por crime de irresponsabilidade.

E como fica o desavisado Lula, que disse que o seu destino está nas mãos da mídia, mais ou menos na mesma hora em que o seu canino ex-auxiliar tratava de livrar-lhe a cara?

Depois que Jefferson jogou na mesa a conexão portuguesa com certeza das tratativas heterodoxas com a Telecom de lá, o ex-ministro ficou ainda mais enrolado nos fios da trama petebo-petista-valeriana (como diria o Estadão dos velhos tempos).

Banco – sem jogo de palavras – o que escrevi ontem aqui:

O impeachment do presidente pode ser inviável por uma série de razões. A sua alegada inocência não há de ser uma delas.


   

Brevíssimo guia para seguir o caixão 2
 

Quanto menos tempo você tiver para ler jornal e ver TV, mais você deve se concentrar nas matérias e comentários que focalizem uma das duas questões essenciais, presumivelmente interligadas, do escândalo da compra de políticos pelo PT desde o ano da eleição de Lula. Chame-se isso caixa 2, mensalão ou caixão 2.

Primeira questão: de onde saiu o dinheiro repassado pelo grão-operador Marcos Valério – R$ 55,8 pelas revelações mais recentes.

Nesse sentido, que é o que interessa, a decisão da CPI dos Correios sobre a quebra do sigilo bancário dos fundos de pensão é incomparavelmente mais importante do que os favores de Valério à ex-mulher do então ministro José Dirceu, do que a renúncia do deputado Valdemar, além dos que o imitarem, do que a verdadeira identidade do tal Marques, que poderia ser, ou não, o amigo de Dirceu autorizado pela repassadora da SMPB de Valério a sacar cinqüentinha do Rural.

É mais fácil José Dirceu ser o próximo presidente da República do que ficar comprovado que o meu, o seu e o nosso não foi a principal substância que correu por aquilo que vem sendo chamado de valerioduto.

Possibilidades não excludentes: dinheiro de contratos superfaturados com repartições e empresas do governo; dinheiro de pedágios cobrados de fornecedores de bens e serviços (sem o que perderiam a chance de os fornecer, fazendo a compensação nas faturas); dinheiro dos fundos de pensão aplicado em bancos que menos confiáveis do que outros, mas de onde jorrariam mais recursos, a juros de mercado, para as necessidades do caixão; dinheiro saído indiretamente das estatais "vendidas" a interesses da empreita.

A segunda questão essencial, obviamente, é a do grau de envolvimento do presidente Lula no caixão. Vejam bem: digo "grau" porque é mais fácil José Dirceu ser o próximo presidente da República do que ficar comprovado que o envolvimento do atual era nulo.

Ontem, mestre-blogueiro Ricardo Noblat exumou uma matéria do jornalista Bob Fernandes, publicada na Carta Capital depois da vitória de Lula, que descreve com assombrosa verossimilhança a compra, por R$ 10 milhões, do apoio do PL ao tetracandidato petista, que deu a vice a José Alencar.

Dentro de uma sala estavam Valdemar Costa Neto – é, o mesmo –, Dirceu e Delúbio. Esperando do lado de fora, Lula e alguns menos votados. Quando a criança nasceu, Lula ficou sabendo imediatamente.

O impeachment do presidente pode ser inviável por uma série de razões. A sua alegada inocência não há de ser uma delas.


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