Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 21, 2005

Editorial de A Folha de S Paulo MUDANÇAS ELEITORAIS

 É pueril a tentativa do governo federal de explicar os esquemas de corrupção em que se meteu como um caso circunscrito ao financiamento "não-contabilizado" de campanha eleitoral. Tudo indica que o desvio de recursos públicos e o tráfico de influência estão entre as principais irregularidades cometidas por setores do PT em associação com o operador Marcos Valério. Essa constatação, porém, não exclui de cena a existência de problemas no custeio de campanhas suficientes para justificar um aprimoramento legislativo.
O pacote de novas regras que tramita no Senado, como é costumeiro nesses casos, inclui algumas idéias interessantes, uma série de medidas inócuas e alguns despautérios.
Entre os pontos positivos destaca-se a obrigatoriedade de os partidos disponibilizarem pela internet, diariamente, a prestação de contas da campanha -um passo, ainda que tímido, em direção à transparência. Também soa promissora a proibição de publicidade em bens públicos, o que diminuiria a poluição visual e a sujeira nas cidades.
Parece, ainda, alvissareira a redução do horário eleitoral gratuito de 45 para 35 dias. É uma medida concreta para reduzir os custos das campanhas -um pretexto para o caixa dois-, cujo principal gasto costuma ser a produção dos programas que vão para a TV. De resto, é sempre oportuno lembrar que o "gratuito" do horário é apenas um nome. É o contribuinte que paga -e caro-, na forma de descontos no imposto devido pelas emissoras, pelo horário nobre subtraído à programação.
Entre as medidas provavelmente inócuas estão a proibição de showmícios e de distribuição de brindes como camisetas e bonés para os eleitores. O pressuposto dessas providências é que o eleitor vende seu voto pelo valor de uma caneta ou um ingresso para espetáculo musical. Como estapafúrdias podem ser qualificadas as tentativas de proibir a utilização de cenas externas nos programas de TV e a divulgação de pesquisas eleitorais nos 15 dias anteriores ao pleito. Nos dois casos, estamos diante de maldisfarçada censura.
Ainda que a utilização de externas possa ser um ingrediente custoso da planilha, isso parece pouco para justificar tamanha interferência sobre as possibilidades de expressão de um candidato. Filmagens "in loco" podem ser fundamentais para demonstrar o estado de abandono de uma cidade ou de uma obra pública. Externas são também importantes para garantir a exibição de registros históricos, como as próprias CPIs. São, por fim, um elemento fundamental para atrair o eleitor para o horário político. Nada mais aborrecido do que um candidato trancado num estúdio falando sozinho -por mais relevante que seja o que tenha a dizer.
Já o veto às pesquisas na reta final é, além de manifestamente inconstitucional, de um elitismo ímpar. As pesquisas continuariam a ser feitas normalmente e políticos e seus financiadores seguiriam tendo acesso a elas. Só quem ficaria privado de informação relevante seria o eleitor médio. Aliás, em tempos de internet, mesmo isso é relativo, pois as sondagens poderiam ser divulgadas em sites no exterior, hipótese em que estariam fora de jurisdição brasileira.
No frigir dos ovos, é bem-vinda a tentativa do Senado de buscar, sem ambição por grandes reformas, o aprimoramento das regras eleitorais no curto prazo que resta para que as mudanças valham já para o próximo pleito. Seria desejável, contudo, que os senadores se ativessem ao mais essencial e renunciassem à idéia de tentar controlar o conteúdo das campanhas e o acesso à informação.

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