Terrorista na ditadura, terrorista na democracia,
o grupelho agora incita a morte de jornalista
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A NOTA COVARDE |
No último dia 27 de abril, o jornal Hora do Povo, panfleto de propaganda de um grupelho intitulado Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), usou sua primeira página para incitar a morte de um jornalista. O alvo da ameaça foi Diogo Mainardi, colunista de VEJA. O pretexto para o ataque foi um artigo do colunista que fazia referência a Eduardo Leite, o Bacuri, militante da antiga Ação Libertadora Nacional (ALN), assassinado em 1970 quando era prisioneiro das forças de repressão da ditadura militar. O artigo de Mainardi contava que parte da imprensa, na ocasião com estreitas ligações com o regime, soube com antecedência que Bacuri seria assassinado. Mainardi comparava o caso a uma sentença que o punia antes mesmo de ser apresentada sua defesa em uma disputa judicial com Franklin Martins, ministro da Secretaria de Comunicação Social do governo federal (Secom) e ex-militante da organização, da qual se desligou há 25 anos. O juiz Sergio Wajzenberg condenou-o, em primeira instância, a indenizar o ministro em 30.000 reais. A sentença, porém, havia sido antecipada por um jornalista da Folha Online.
O MR-8 e a ALN foram duas das organizações esquerdistas que, sob a bandeira da luta contra o regime militar, promoveram seqüestros, roubos a banco e atos de intimidação. Com a volta da democracia, o MR-8 abandonou as armas mas continuou um terror, desta feita no terreno da fisiologia. Seus integrantes passaram a vender seus serviços sujos de atemorização a quem pagasse mais.
FOI SÓ CHORAR UM POUQUINHO |
O MR-8, cujo nome faz referência à data da morte de um dos mais frios assassinos da história, o argentino Ernesto "Che" Guevara, está desde 1979 abrigado no PMDB. É uma "corrente" do partido. Nessa condição, chegou a dar ao então presidente José Sarney o título de "comandante da nação". Também já serviu de tropa de choque a políticos de biografia conturbada – para dizer o mínimo -- como os ex-governadores Orestes Quércia e Anthony Garotinho. Sabe-se muito bem em troca de quê. O serviço dos garotos de programa do MR-8 inclui todo tipo de arruaça. Em 1998, na convenção nacional que discutia se o PMDB lançaria candidato próprio à Presidência, o grupelho, contrário à aliança com o tucano Fernando Henrique Cardoso, deu início a uma sessão de socos que resultou na destruição do plenário da Câmara. Hoje, até Quércia prefere, pelo menos em público, manter distância dessa gente: "Eles já me apoiaram, mas agora estão com o Lula. Não tenho nenhuma ligação com esse jornal e acho um absurdo a ameaça a Mainardi", disse o ex-governador paulista.
Em São Paulo, estado em que é mais presente, o grupelho não chega a uma centena de foras-da-lei. Mesmo assim, seu panfleto conta com a generosidade do governo federal. Em março, o Hora do Povo reclamava que já fazia sete meses que o panfleto não recebia anúncio estatal. Não foi preciso chorar muito. Em 2 de maio, a Receita Federal deu-lhe de presente uma propaganda de meia página. A Secom, que cuida das verbas publicitárias, diz que a tiragem superior a 50 000 exemplares do Hora do Povo justifica o anúncio. Curioso critério. Uma publicação de igual circulação que pregasse a violência da mesma forma que o panfleto do MR-8 o faz mereceria um anúncio se fosse, digamos, propagandista do nazismo? Na sua última edição, o jornal publicou nota negando que tivesse a intenção de ameaçar Diogo Mainardi. Mas a tentativa de recuo não convence – a nota que incita a morte do jornalista é bem clara. O colunista de VEJA já entrou com uma representação criminal pedindo a apuração do episódio. Ameaças de morte não são brincadeira. Devem ser sempre levadas a sério.
REPÚDIO À AGRESSÃO
Marcelo Casal Jr./ABR | "Ameaçar um jornalista por discordar de sua opinião é crime de lesa-democracia e um atentado à liberdade de expressão." |
"Os jornalistas precisam exercer o seu ofício a salvo de quaisquer pressões ou coações. Isso é um pressuposto da liberdade de imprensa." | Dida Sampaio/AE |
Marcos D'Paula/AE | "Causa estranheza o silêncio do governo, que até o momento não se manifestou. Parece achar natural que um jornalista receba ameaças públicas." |
"É uma violência contra o estado de direito. Há meios legais para contestar opiniões contrárias sem recorrer às ameaças anunciadas pelo jornal Hora do Povo." | Joedson Alves/AE |
Nilton Fukuda/AE | "Numa democracia, todos têm o direito de dar sua opinião e expressá-la, mas dentro da melhor convivência democrática, sem incitamento à violência." |
"Loucura tem limite, até para um jornal que não é nada sério." | Niels Andreas/AE |
Andre Dusek/AE | "É um fato de extrema gravidade, especialmente quando se sabe que esse jornal recebe publicidade do governo federal." |