O mundo está nos tratando bem, muito bem. E nós poderíamos tratá-lo melhor para que ele continuasse nos ajudando. Mesmo assim há uma corrente de simpatia mútua entre nós, com o capital e investimento externos afluindo para o Brasil, enquanto consolidamos a estabilidade iniciada pelo Plano Real, com grande êxito no controle da inflação apesar do choque cambial provocado, principalmente, pela falta de reformas complementares.
O erro do ex-presidente do BC Gustavo Franco foi não ter saído quando se convenceu de que as reformas não viriam. O mérito desse governo, no primeiro e no segundo mandatos, foi ter mantido as políticas adotadas nos oito anos passados. E são essas mesmas políticas que estão atraindo os investidores externos.
Mas não é só aí que se revela esse bom trato que o mundo está tendo conosco. Ele também está nos recebendo de braços abertos lá fora. O professor Antônio Corrêa de Lacerda lembra que as emissões de empresas brasileiras na Bolsa de Nova York atingiram US$ 22 bilhões, quase o dobro do que vinha sendo obtido. Internamente, o patrimônio das empresas brasileiras negociadas na Bovespa 'já representa 75% do Produto Interno Bruto (PIB)'. Há um movimento de sinergia, de abertura financeira nos mercados interno e externo.
ELES ESTÃO NOS DESCOBRINDO
Lacerda foi muito feliz ao afirmar que as empresas 'praticamente nos descobrem . Nós não temos uma estratégia articulada para atraí-las', em crítica construtiva à ausência de uma política voltada para os imensos recursos que inundam o mundo há alguns anos em busca de oportunidades. Acharam primeiro a China, depois a Índia, a Rússia e agora aportaram no Brasil, ainda relutantes, mas de forma mais incisiva do que há quatro anos.
Estamos atrasados, sim, mas deixamos de ficar parados quanto à entrada de investimentos externos. Começamos a caminhar este ano, e muito bem pelo menos por agora. Louve-se, aqui, a atração pelo programa do álcool e o desenvolvimento crescente dos parques siderúrgicos e minerais. Se não os atraímos com incentivos especiais que os outros países emergentes oferecem generosamente, pelo menos deixamos de afastá-los com discursos nacionalistas do século passado.
CHEGA DE MOSTRAR OS DENTES
Estamos dando sinais de que são bem-vindos, que terão segurança legal numa economia já estável, apesar dos riscos decorrentes de intervenções nas agências reguladoras. Mas se não estamos apresentando o melhor cenário interno, pelo menos o pior desapareceu. Acabou a ojeriza a tudo o que é 'estrangeiro'. Hoje temos regras e leis que não tínhamos antes e o capital que está vindo cumpre rigorosamente essas obrigações legais. Isso só nos ajuda, não nos prejudica.
Pelo menos é esse o cenário nos quatro primeiro meses do ano. É só aperfeiçoá-lo e poderemos reconquistar um pouco do espaço perdido para outros países emergentes e industrializados também.
O QUE AINDA FALTA
Para melhorar, lembra o ex-ministro Delfim Netto, falta reduzir o peso do Estado sobre a economia. Ele absorve, via impostos, taxas, tarifas e outros subterfúgios, nada menos que 35% do PIB, uma carga tributária brutal considerando o pouco retorno que ele dá. Temos, nós e você leitor, de trabalhar 144 dias por ano para pagar impostos. Em vez de diminuir, a tendência é de aumentar, para poder manter os superávits fiscais.
ACEITAMOS TUDO PASSIVAMENTE
O cientista político Sérgio Abranches, em artigo publicado no jornal Valor Econômico, tocou no ponto central desses aumentos sucessivos, que passaram de 32% do PIB em 2002 para 35% em 2006. E é na realidade mais se avaliarmos o custo do setor privado para recolhê-lo e as insidiosas tributações indiretas. Avalia-se que, na realidade, essa carga já está em 38%, igual à da União Européia. Abranches diz que 'dada a complacência social e a facilidade com que aceitamos aumento de impostos sobre a forma de contribuições eternas, incidindo como fatores geradores já tributados, compensamos a crise fiscal com uma espantosa elasticidade tributária'.
É MUITO PARA NÓS
Há mais. Esse imposto é grande demais para uma economia relativamente pequena e em fase ainda de maturação, num país com grandes diversidades regionais, abrigando bolsões enormes de pobreza. O ex-ministro lembra que a carga de 35% em termos de PIB nominal representou em 2006 uma transferência do setor privado para o estatal de R$ 210 bilhões. É dinheiro que, se deixado com o setor privado, estaria gerando investimento, emprego, crescimento. No Estado, ele se perde. A conclusão evidente, já confirmada pelos números do IBGE, é que o Estado brasileiro é grande demais para uma economia ainda vacilante que, somente agora, começa a se estabilizar e cresceu apenas 2,5% na década de 90 e 2,8% entre 2000 e 2006.
De qualquer forma, estamos mudando, mudamos muito nesses primeiros meses do ano. É só persistir, avançar e ajudar o mundo enriquecido a nos ajudar. Ele está ansioso por isso. E nós, eu, você, as empresas e o governo também. Vamos?
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