Entrevista:O Estado inteligente

domingo, fevereiro 18, 2007

Quaresma política

Nada diferencia PT, PMDB, PTB, PC do B; toda a base do governo Lula se orienta pelo raciocínio fisiológico e aparelhista

ADIADA EM razão de inúmeros pretextos -das eleições para a presidência da Câmara dos Deputados às férias de verão de Lula e Marisa no litoral paulista-, a nomeação do novo ministério entra em seu último compasso de espera ao som dos acordes festivos do Carnaval.
Cumpre esperar que, nos tempos mais sóbrios da Quaresma, decida-se enfim o elenco dos assessores imediatos do presidente. Está em jogo, em última análise, a qualidade administrativa de seu próximo mandato.
Um dilema curioso, ainda que infelizmente habitual na vida política brasileira, parece estar por trás das delongas de Lula nessa questão. Não seria errado supor que o interesse pessoal do presidente da República se concentre na realização de um governo eficiente, capaz de cumprir as promessas irrealizadas em seu primeiro mandato.
Ao mesmo tempo, a reeleição de Lula -com tudo o que significou, para as partes diretamente interessadas, de autoconcedida anistia aos escândalos do passado recente- aviva os apetites da máquina petista. Máquina evidentemente combalida, mas capaz de renovar-se em audaciosos e impenitentes exemplos de arrogância e sede de poder.
Algumas postulações do PT a cargos no ministério já visam, com certeza, às eleições de 2010. Mais do que o espírito de colaboração com os projetos administrativos do Planalto (mas existem?), move-as um ímpeto pessoal que, a rigor, entra em contradição com o desejo, igualmente pessoal, que se pode supor da parte de Lula no sentido de realizar um governo bem-sucedido.
A essas pressões, que caberia qualificar como provenientes de um "fogo amigo", somam-se as irrecorríveis cobranças da base aliada. O PMDB -que nada mais é além de uma confederação de interesses paroquiais e nanicos, revestida de certa pátina histórica- assume empostações de participante decisivo nas veleidades desenvolvimentistas deste segundo mandato.
Micropartidos, legendas de aluguel, destroços de dissidências e cadáveres de doutrinas esquecidas também esperam, do presidente da República, um alento de vida e de poder.
No fundo, nada distancia o PT do PMDB, do PTB, do PC do B, ou do PR. Toda a base do governo Lula se orienta pelo mesmo raciocínio fisiológico e aparelhista. Foi-se o tempo em que era possível distinguir, na política brasileira, entre partidos "ideológicos" e "fisiológicos".
A fisiologia é a lei de todos. Contra essa lei, torna-se frágil a expectativa de que, ao fim de uma disputa deprimente, prevaleçam critérios técnicos e racionais na composição do futuro ministério. É como se o personalismo presidencial fosse a única e vacilante garantia de que isso venha a acontecer.
O país está à espera; diferentes blocos políticos se põem em movimento, seguindo entretanto um único enredo, tradicional no sistema partidário brasileiro. Mais do que em qualquer outra data, palavras como técnica, racionalidade e eficiência estão fora de pauta no momento.

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