Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

A parceria EUA-Brasil, a política e a economia

A parceria EUA-Brasil, a política e a economia

Leiam o que vai no Estadão On Line. Depois retomo:

Representantes do Brasil, da Índia, da China, Estados Unidos, União Européia e África do Sul vão se reunir, até o final deste mês, para discutir o tema da padronização do etanol. De acordo com o embaixador brasileiro nos Estados Unidos, Antonio Patriota, ainda não há data nem local definidos para esse encontro, que, segundo ele, não será de nível ministerial. "O debate sobre esse tema (padronização) avançará neste ano", previu Patriota.
A padronização é um passo necessário para que o álcool combustível (etanol) passe a ter status de uma commodity no mercado internacional. "Poderemos ter novidades em breve, em termos de coordenação plurilateral", informou. O embaixador informou ainda que Brasil e EUA estão elaborando uma agenda de visitas bilaterais futuras - de chanceleres e presidentes da República. Ressaltou, entretanto, que ainda não há condição de anunciar nenhuma data.
(...)
Ele disse também que a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, tem interesse em vir ao Brasil, mas não citou datas. "Diferentes datas estão sendo analisadas", disse. E acrescentou que ele e o chanceler Celso Amorim gostariam que Rice fosse a Salvador (BA), uma vez que ela já manifestou interesse em conhecer a Bahia. "Ela é muito engajada no fato de o Brasil e os Estados Unidos serem as maiores democracias multiétnicas da Região", disse o embaixador brasileiro.

Voltei
Como vocês viram na edição desta quarta, o subsecretário de Estado americano para Assuntos Políticos, Nicholas Burns, veio ao Brasil para debater o que pode vir a ser uma parceria estratégica entre Brasil e Estados Unidos, que passa pela produção de etanol. O produto, para ser considerado, de fato, uma matriz energética, precisa obedecer a certos critérios internacionais — além de ter estoques reguladores. É bom lembrar que cana-de-açúcar ou milho podem não estar sujeitos às variações de humor de Alá, mas estão sujeitos a uma variável às vezes mais instável: excesso de chuvas, falta delas, pragas etc. So o etanol, um dia, passar a ser tão vital para a economia dos países como é hoje o petróleo, é preciso que se tenha a segurança, como se tem hoje em relação ao dito-cujo, de que o produto não vai faltar. Afinal, como sabemos, gostamos de odiar titio Bush, mas a gente sabe que ele é a garantia de que o Ocidente não pára, não é mesmo?
Para o Brasil, trata-se, evidentemente, de uma chance formidável, que tem implicações econômicas de longo prazo. As políticas, de que trato primeiro, estão bem mais próximas. Burns não fez qualquer exigência, é claro, mas foi explícito numa sugestão-pergunta: nas Américas, o parceiro do Brasil são os Estados Unidos ou é a Venezulea? O ditador venezuelano tem dois grandes apoiadores estrangeiros, ambos entusiasmados: Lula e Mahamoud Ahmadinejad, aquele terrorista que governa o Irã. Burns foi ao ponto: “A energia tende a distorcer o poder de alguns Estados que nós achamos que têm um peso negativo no mundo, como a Venezuela e o Irã. Então, quanto mais pudermos diversificar nossas fontes de energia e nos tornarmos menos dependentes do petróleo, melhor ficaremos. Estou falando de uma perspectiva americana. O Brasil deve falar por si mesmo".
Por que o Brasil interessa aos EUA? Porque é quem foi mais longe na tecnologia do etanol e no desenvolvimento de produtos — carros — que o utilizam como fonte de energia: renovável e mais limpa do que a gerada pelos combustíveis fósseis. A maior economia do mundo, que o Brasil tem trado com um misto de ignorância dos idiotas e descaso dos arrogantes, chama o país para uma parceria, também de olho no papel que tem tem na região. Mas está claro: se o Brasil der uma de besta, há outros países que não hesitarão em entrar nesse mercado e aceitar a parceria. É questão de tempo.

Longo prazo
No longo prazo, o Brasil precisa pensar para onde vai a sua economia. Parece que o etanol surge, de fato, no horizonte como a possibilidade de uma matriz energética — veio, portanto, para ficar. Leiam, em azul, trecho de uma coluna do ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, publicada na Folha no dia 12 do mês passado. Numa alusão à “doença holandesa” (vejam o que é na Internet), Mendonça identificava o risco da “doença brasileira”. Acompanhem:

Posso ver hoje algumas das conseqüências dessa incipiente "doença brasileira", apesar do tempo longo que nos separa ainda do longínquo ano de 2017. A Embraer não mais produzirá aviões no Brasil, com a perda de mais de 20 mil empregos qualificados; nossa indústria automobilística vai reduzir o valor agregado de sua produção local, transformando-se em mera montadora alimentada por importações; não mais teremos fábricas de sapatos, de produtos têxteis e eletrônicos. Em razão disso, os empregos migrarão para o interior, os salários serão mais baixos, e a mão-de-obra terá menor qualificação.
Já assistimos hoje ao início desse fenômeno, mas as mudanças vão se acelerar de forma dramática nos próximos anos. A necessidade de produzir combustíveis limpos a partir da agricultura será o eixo principal dessas transformações. E o Brasil, fora do continente africano, é a única grande economia com uma área agriculturável para responder por essa nova demanda. Nesse movimento, que hoje parece irreversível ao analista cuidadoso, nosso saldo comercial vai crescer de forma expressiva, aumentando a sobra de dólares que já existe nos mercados de câmbio. O real vai se fortalecer ainda mais e tornar ineficiente a política do Banco Central de defender a taxa de câmbio via aumento de nossas reservas cambiais.
O ponto central dessa previsão é a certeza que tenho hoje de que a questão do aquecimento global será enfrentada de forma vigorosa nos próximos anos. No momento em que escrevo esta coluna, a imprensa nos informa que o presidente George W. Bush vai tratar da questão dos combustíveis limpos em seu discurso anual no Congresso americano. Se isso acontecer, será uma mudança significativa na posição do maior opositor a uma ação coordenada dos países mais ricos no mundo nessa questão. Tony Blair, o primeiro-ministro britânico, já há algum tempo comprou essa idéia. Outras decisões nesse sentido já estão sendo tomadas, como a do governo japonês de adicionar 10% de etanol à gasolina vendida no país nos próximos três anos.
Nos Estados Unidos, o país que mais consome gasolina no mundo, a utilização crescente do álcool de milho já está provocando modificações importantes na economia. O crescimento da área plantada desse produto e o aumento de seu preço por conta de uma demanda crescente por álcool estão deslocando a produção de soja e trigo e tornando a indústria de frango um setor ameaçado de extinção. Nos dois casos, o Brasil sairá ganhando à medida que essa tendência se consolidar. Daí a importância, para nós, do discurso de Bush.
No Brasil, segundo dados coletados pela MB Consultores Associados, temos uma disponibilidade de mais de 100 milhões de hectares para a produção de cana ou de soja. Nenhum outro país, com agricultura competente e capacidade técnica para produzir com eficiência, tem essa margem para crescer sua produção agrícola. Se esse movimento, que já vemos hoje, continuar, poderemos agregar em alguns anos várias dezenas de bilhões de dólares de exportações, a partir da agricultura, em nossa balança comercial com o exterior.
Mas esse cenário, se confirmado, trará para nós dois problemas sérios: o primeiro será um aumento significativo no preço dos alimentos; o segundo, uma valorização perene do real e uma pressão ainda maior sobre a competitividade de nossa indústria.

Eis aí. Há, pela frente, uma possibilidade e tanto de o Brasil se firmar como um país líder numa nova matriz energética, mas também de vir a ter severos problemas por conta disso. Dadas essas possibilidades, precisamos é de governantes que saibam pensar a longo prazo e que estejam, hoje, de olho no que ocorrerá nas próximas duas décadas.

Arquivo do blog