Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN -"Se o País crescer, não será por causa do PAC "


Para o professor de economia da Universidade Princeton, o bom momento da economia mundial e as ações adotadas por Lula em seu primeiro mandato assegurarão o bom desempenho do País


Por lana pinheiro

O economista José Alexandre Scheinkman é um brasileiro inquieto. Formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Ph.D. em economia pela University of Rochester (EUA), foi professor da Universidade de Chicago, co-editor do Jornal of Economic Theory, vice-presidente do banco de investimento Goldman Sachs e consultor da Mckinsey Global Institute. O currículo dos seus 58 anos vai longe. Hoje divide-se entre palestras ao redor do mundo, aulas na Universidade Princeton (EUA) e estudos minuciosos sobre a economia brasileira. E, como bom cidadão, não está satisfeito com o que vê. Para o economista, o "Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) marca uma contradição entre os dois governos de Lula" ao trazer de volta o gigantismo do Estado. A saída, aponta, passaria necessariamente por uma reforma fiscal que foi deixada de lado no pacote. "O PAC é pequeno demais e não terá muito impacto na economia", afirma. Avesso a fazer projeções sobre o crescimento do PIB, avisa que o País só crescerá se aumentar investimentos em infra-estrutura e educação, melhorar as condições de negócio e criar normas seguras de atração de capital privado.

DINHEIRO – O presidente Lula, em seu discurso de apresentação do PAC, afirmou que o plano tem como objetivo "ajudar a fundamentar uma verdadeira cultura produtiva". O sr. concorda com ele?
JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN
– O PAC mostra uma contradição entre os dois governos Lula. Neste segundo mandato, o papel do governo como investidor ganhou ênfase e não só nas áreas consideradas estratégicas, mas também em direção dos investimentos privados. Isso não condiz com a atual situação fiscal do governo. No fundo o PAC é uma coisa muito pequena.

DINHEIRO – Por quê?
Scheinkman
– Por que não dá para esperar do PAC grandes efeitos na economia brasileira.

DINHEIRO – Houve um certo retrocesso ideológico no governo, com o aumento do Estado na economia?
Scheinkman
– Não sei se retrocesso, talvez eles achem que foi um avanço. Com certeza, houve uma mudança que para mim foi negativa. Uma mudança ideológica que se choca com a capacidade e vontade do governo de mobilizar recursos.

DINHEIRO – O que deveria ter sido feito?
Scheinkman
– O governo deveria ter se concentrado em dar melhores condições para o setor privado participar do processo de investimento no Brasil. Evidentemente, isso não quer dizer que todo investimento deva ser feito pela iniciativa privada. Há projetos, principalmente em infra-estrutura, que devem ter a participação do governo. Mas a privatização do setor de telecomunicações mostra que, quando o governo permite ao setor privado investir e dá a ele condições mínimas de regulamentação, o setor privado supre as necessidades de investimento do País.

DINHEIRO – Faltou a criação de normas regulatórias?
Scheinkman
– Há muito tempo defendo a tese de que boa parte do mau desempenho do Brasil é explicado pela falta de infra-estrutura. Agora o governo reconheceu isso, o que é um alívio. Mas esse é o primeiro passo: reconhecer. Falta criar condições para resolver o problema.

DINHEIRO – Quais são os caminhos possíveis?
Scheinkman
– Um deles é criar regulamentações que permitam ao setor privado participar do processo. O outro é o governo fazer investimento direto. Nenhum dos dois caminhos é viável hoje por falta de normas claras e pelo aperto fiscal do governo.

DINHEIRO – Quais as grandes falhas do PAC?
Scheinkman
– Faltou melhorar a situação fiscal com cortes nas despesas correntes. Algo como havia sido proposto pelos ex-ministros Antônio Palocci e Paulo Bernardo com as despesas crescendo menos do que o PIB por pelo menos uma década. Ou pelo Delfim Netto, com déficit zero. Se o governo fizesse isso, permitiria corte nos impostos e o aumento de investimentos do governo. Outro ponto esquecido foi a reforma fiscal. Nós temos um sistema de impostos muito caro e extremamente complicado. Hoje o setor formal não tem condições de competir com a informalidade.

DINHEIRO – O Palocci está fazendo falta no direcionamento econômico do segundo mandato?
Scheinkman
– É difícil avaliar, do lado de fora, quem manda no quê. Se o ministro ou o presidente. Não dá para saber se o Lula mudou de direcionamento ideológico porque o Palocci o convencia de certas idéias. Mas a ênfase dada na criação de condições para o setor privado promover o crescimento durante o primeiro mandato está fazendo falta.

DINHEIRO – Faltou ao ministro Guido Mantega força para ocupar o lugar que foi de Palocci no Ministério da Fazenda?
Scheinkman
– É difícil responder isso, mas o Palocci carregava a imagem de uma pessoa que sabia exatamente o que fazer. Isso foi muito importante para o Brasil em 2002, 2003. Mas não julgo o que o ministro Mantega faz hoje.

DINHEIRO – A imagem de pessoa forte do governo foi ocupada pela ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil.
Scheinkman
– Sim. É isso que a gente vê na imprensa. A importância desse ministério depende do governo, mas nos dois mandatos de Lula a Casa Civil sempre teve um papel importante.

DINHEIRO – Caberá à ministra Dilma ordenar o País rumo ao crescimento de 5% pretendido pelo Lula?
Scheinkman
– Falar sobre personalidades foge do que eu sei. Mas acho que o Brasil continua a se beneficiar de uma situação externa muito boa. Além disso, as medidas tomadas no primeiro mandato não foram de efeito imediato e continuarão a beneficiar o crescimento do País. O PAC é muito pouco para ter efeito sobre a economia. Se o Brasil crescer nos próximos anos, não será por causa do PAC.

DINHEIRO – Esse cenário possibilitará o almejado 5%?
Scheinkman
– Não faço projeções. Há um certo consenso entre os economistas brasileiros de que o crescimento será de 3,5%; não vejo nada que desabone essas pessoas.


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