o globo
A nota que o presidente interino do PT, ex-ministro Tarso Genro, divulgou na segunda-feira com críticas ao que classifica de "festival denuncista" da mídia e "covardia" das CPIs faz parte de uma reação combinada com o governo depois de diversas reuniões do novo "núcleo duro" do Palácio do Planalto, que identificou nas CPIs uma manobra de setores minoritários da oposição para tentar derrotar o governo antes das eleições de 2006.
O chamado gabinete de crise, formado pelos ministros Luiz Dulci, da Secretaria-Geral da Presidência; Márcio Thomaz Bastos, da Justiça, e Dilma Rousseff, da Casa Civil, considera a CPI dos Bingos, onde ontem depôs o doleiro Toninho da Barcelona, a mais fora de controle do que seria parâmetros políticos normais, e há quem no governo já pense até em recorrer ao Supremo Tribunal Federal para impedir que as CPIs assumam investigações paralelas, em vez de se aterem aos chamados "fatos determinados".
É na CPI dos Bingos, onde a oposição tem a maioria, que os depoimentos polêmicos são realizados, depois que muitas vezes são barrados pela situação nas demais CPIs. Foi o caso do doleiro, que só depôs graças a uma artimanha do senador pefelista Antonio Carlos Magalhães, que pediu a convocação de um senhor Antônio Oliveira Claramunt, que os governistas não identificaram como sendo o doleiro.
O governo cobra também da oposição uma postura cuidadosa em relação à economia do país, alegando que as acusações ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e a seu irmão, e a convocação de doleiros para depor no Congresso, pode inquietar os investidores internacionais, que se sentiriam inseguros com a politização dessas questões.
Também a convocação do irmão do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel, que acusou membros do PT de atuarem ilegalmente na arrecadação de financiamentos de campanhas eleitorais irritou o governo, que alega que a investigação do assassinato do ex-prefeito nada tem a ver com a investigação sobre os bingos, e deveria estar restrita ao Ministério Público de São Paulo. A convocação de Gilberto Carvalho, chefe-de-gabinete do presidente, acusado de ser o recolhedor do dinheiro do PT no interior paulista, foi tida como uma provocação pelo Palácio do Planalto.
Outra possibilidade que deixa o governo em estado de alerta é a convocação do juiz Rocha Mattos, outro preso condenado que se oferece para depor no Congresso com acusações ao PT no episódio de Santo André. A tentativa de ligar o assassinato do ex-prefeito a um esquema nacional de corrupção, que teria sido montado pelo PT, é vista pelo governo como um sinal de que há setores oposicionistas que ainda não desistiram de relacionar o Palácio do Planalto a atos criminosos, com o objetivo de obter o impedimento do presidente Lula.
Nas análises dos governistas, a bancada do PT está agindo desde o início da crise política com exagerado defensivismo, devido a um sentimento de culpa que impede uma atuação política mais definida. O depoimento do ex-ministro Luiz Gushiken na CPI dos Correios é tido como exemplar desse ponto de vista, pois ele rebateu todas as denúncias sobre supostas influências nos fundos de pensão, e ainda teve condições de defender o governo com vigor.
O fato é que o Palácio do Planalto está identificando sinais positivos em pesquisas de opinião pública que, se não mostram uma recuperação do prestígio do presidente Lula, indicam que o eleitorado já estaria detectando sinais de politização excessiva das CPIs, e cansando das inúmeras denúncias que são feitas sem conclusão.
Alguns emissários do governo já estão em campo conversando com líderes oposicionistas que consideram "mais equilibrados", para tentar circunscrever as apurações das CPIs a fatos concretos. Nessas conversas, o recado tem sido sempre o mesmo: o governo admite que o PT tem que pagar pelos desvios de conduta que cometeu, mas não é aceitável que se queira interromper um governo legitimamente eleito com acusações infundadas.
A insistência com que a oposição tenta levar até o presidente Lula as acusações de corrupção faz com que o Palácio do Planalto retorne à tese do golpismo, que foi sua primeira reação quando estourou a crise política, e também o PT retomou esse tema na nota que divulgou na segunda-feira.
Os interlocutores do presidente garantem que ele não pretende voltar a tensionar essa crise com discursos de acusações às elites golpistas, como chegou a fazer no início da crise, mais motivado, alegam, pelas acusações pessoais à sua família do que por um desejo político de confrontar-se com a oposição através dos movimentos sociais.
Mas há implícita nessas conversas, também, a mensagem de que o Palácio do Planalto tem mantido esses movimentos sociais sob controle, mas pode apelar a eles caso considere que a atuação das oposições esteja passando dos limites políticos que considera aceitáveis.
Assim como Tarso Genro disse que se enganam os que pensam que o PT está "adormecido" pela crise, o governo já está se sentindo com força suficiente para reagir ao que considera "excessos" dos adversários políticos. Ou reúne as forças que lhe restam para lutar contra o que classifica como ato deliberado da oposição de ligar o Palácio do Planalto a crimes, com o objetivo de conseguir o impedimento do presidente Lula.
Entrevista:O Estado inteligente
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