Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, setembro 06, 2005

Luiz Garcia O furacão de cada um

O furacão de cada um


O"New York Times" não poderia ser mais cruel ou preciso: a primeira reação do presidente Bush à tragédia em Nova Orleans foi um discurso com a eloqüência e a importância de uma celebração do Dia da Árvore perante uma platéia de escoteiros.


A reação quase unânime dos formadores de opinião e da classe política fez soar despertadores na Casa Branca, e o governo americano começou a se mexer, com todas as dificuldades impostas pela sua incapacidade de prever uma tragédia reiteradamente anunciada. E tudo influenciado pela seqüência aparentemente inexorável de erros políticos e militares no Oriente Médio. Destaque-se o fato de que há ligação concreta entre uma coisa e outra: a Guarda Nacional, corpo de reservistas que normalmente deveria ser mobilizado para ajudar no socorro a Nova Orleans, está com substancial parte de seus efetivos matando e morrendo no Iraque.

É desse tipo de coincidência que muitas vezes se produzem as mais óbvias lições da História: por exemplo, que raramente estão a salvo de surpresas desagradáveis os governantes com idéias fixas e mentes estreitas.

É sempre bom aprender com nossos erros: melhor ainda, aprender com erros alheios.

As trapalhadas de Bush bem poderiam ser motivo de meditação para o presidente Lula. No momento, um furacão de denúncias começa a fazer vítimas (não inocentes como as americanas, mas nenhum exemplo é perfeito) no Congresso e na classe política. Como a maioria esmagadora é de membros e aliados do governo, é ele, no fim das contas, a principal vítima. Possivelmente, a pessoa do presidente será poupada. Mas não seu prestígio, sua capacidade de liderar e agir: estão desaparecendo na enxurrada das águas podres. Diferentemente do que acontece nos EUA, o pior ainda não passou. Lá, o desafio é reconstruir. Aqui, essa tarefa só pode começar de fato quando o nível das águas baixar e for possível ter uma idéia precisa sobre o que dá para salvar, sobre como libertar dos escombros a autoridade e a força moral do centro do poder.

Nos EUA, Bush começa a se recuperar — mal e mal, dentro dos limites possíveis a um chefe de governo sem atributos de estadista. Aqui, ainda sequer sabemos se o furacão começa a perder forças e que rumo tomará.

O único pronunciamento público do presidente teve emoção demais, pedido de perdão — e nenhum anúncio de ações concretas. A ele nada se seguiu, vindo do Planalto: é como se a crise política se limitasse ao mau comportamento de parte do PT, um pedaço do Congresso e meia dúzia de vivandeiras que se locupletaram em campanhas eleitorais.

Até agora, Lula fez apenas o seu discurso do Dia da Árvore. Faltam-lhe, por enquanto, vontade e forças para encarar o olho do seu furacão pessoal.


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