Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, setembro 20, 2005

Luiz Garcia Crimes & castigos

O GLOBO



Algo me diz que esta pergunta é pertinente e atual: qual seria a melhor maneira de punir — somando castigo, exemplo e compensação para a sociedade — os culpados de crimes financeiros?


Nos Estados Unidos, esse tipo de delito é freqüente. Diferentemente de outros países, as punições não são raras, e às vezes se revelam exemplares. Um caso clássico, de 20 anos atrás, foi de um nova-iorquino manipulador do mercado financeiro chamado Ivan Boesky. Ele ganhou centenas de milhões de dólares com fraudes variadas. Descoberto e preso, ajudou as autoridades a fisgar um outro espertalhão chamado Michael Milken, especialista em mutretas com ações de empresas sem valor.

Nenhum dos dois passou muito tempo na cadeia: Ivan, 18 meses; Milken, três anos. Mas não ficaram em penitenciárias comuns, com traficantes e assassinos profissionais. Os EUA têm prisões para criminosos de gravata, onde não correm risco de vida. Mas — o que é fundamental — perdem todos os benefícios de seus delitos. Ivan pagou 200 milhões de dólares de multa ao Tesouro; de Milken não sei a cifra, mas é certo que perdeu rigorosamente tudo o que tinha.

Pouco tempo depois de libertado, Boesky foi fotografado numa rua de Nova York: parecia um vagabundo, desses que vagam sem destino com todos os seus bens em sacolas de papel. A miséria o destruíra, mais do que o tempo de cadeia.

Um bom sistema, não parece?

Supondo que Paulo Maluf tenha realmente os muitos milhões de dólares já localizados em paraísos fiscais, parece que seria realista — e menos desumano que guardá-lo numa penitenciária dominada por facções de traficantes — mantê-lo por alguns anos numa instituição onde não corresse risco de vida. Afinal, ele não matou, não estuprou, não envenenou jovens com drogas.

A prisão especial não é necessariamente antidemocrática e elitista: bastaria que se mantivesse fiel ao conceito da punição equivalente ao delito. E valendo tanto para Malufs como para modestos passadores de cheques sem fundo e pequenos praticantes de contos-do-vigário.

A diferença seria estabelecida por exigência rigorosa: devolução de todo o dinheiro obtido ilicitamente. Isso poderia dar ao Estado recursos para financiar obras de interesse público e livraria os beneficiados de uma virtual condenação à morte, na convivência com os "comandos" que dominam as penitenciárias. Em outras palavras, num caso como o que está nas manchetes, o Estado proporia um bom negócio possível aos especialistas em negociatas: ou bolsos vazios e uma dieta com alguns quibes e poucos sobressaltos, ou algo do gênero de Bangu I.

Certamente é sonho impossível, mas o repatriamento de todos esses dólares talvez até permitisse ao Ministério da Justiça e a governos estaduais criar um sistema penitenciário mais humano para quem está lá dentro e mais seguro para o pessoal aqui fora.

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