Não percebeu que Gabeira não falava sozinho, muito menos externava posição tão insignificante assim. Talvez Severino desconhecesse o fato, mas naquele mesmo dia o deputado participara de uma reunião do grupo pró-Congresso à qual haviam comparecido 64 parlamentares.
Significativa não é a quantidade de integrantes desse conjunto de deputados e senadores preocupados com a combalida imagem do Legislativo e o dano que o atual comando da Câmara acrescenta a ela com suas atitudes desmedidas, corporativas e sem identificação com as demandas populares.
Considerável é a progressão das adesões ao grupo: duas semanas atrás, eram 12 na primeira reunião; na segunda, somavam mais de 30 e na última, terça-feira agora, já totalizavam seis vezes o número de presentes ao encontro inicial.
Coube ao vice-presidente da Câmara, José Thomaz Nonô, crítico das posições, mas leal a Severino, ter uma conversa séria com o presidente, alertando-o para o risco de se pôr do lado contrário ao da opinião pública, deixando-se levar pela pressão de amigos e aliados envolvidos nas acusações.
E aí se incluem desde o ex-ministro José Dirceu até, e principalmente, o presidente e o líder do PP - Pedro Corrêa e José Janene, que, segundo um observador, só não têm dormido com Severino porque dona Amélia não deixa -, passando pelo antecessor João Paulo Cunha e todos os que evitaram seguir o ex-deputado Valdemar da Costa Neto no gesto da renúncia, pela certeza da impunidade por meio da postergação do processo das cassações.
O movimento pró-Congresso ganha força na medida em que a Mesa Diretora se enfraquece por causa das posições de Severino e o colégio de líderes também se mostra politicamente capenga, pois boa parte de seus integrantes está na lista dos "procurados".
Não teriam, assim, a necessária autoridade moral para conduzir os procedimentos a partir da entrega do primeiro relatório parcial das CPIs à Mesa para exame e encaminhamento ao Conselho de Ética.
Nessa situação, o pró-Congresso tende a ocupar na prática o espaço de legitimidade deixado vago pelas circunstâncias negativas do comando formal da Câmara.
No meio de uma e de outra pressão, o presidente Severino Cavalcanti não terá margem para comprar brigas ou proteger apaniguados. Sob pena de se tornar, ele mesmo, réu em processo por quebra de decoro parlamentar.
Mera conseqüência
Não resta dúvida, a derrubada do veto presidencial a projetos de concessão de aumentos salariais a servidores do Legislativo tem mesmo um componente corporativo.
Mas pesou muito mais no resultado (com mais de 50% dos votos além do quórum exigido) a desarrumação completa do Executivo dentro do Parlamento.
Contribuiu sobremaneira a opção do presidente Lula por fazer do ato de governar um sinônimo de discursar; sem dedicação às questões da administração, não adianta Lula culpar a oposição porque a realidade será sempre adversa.
Quando da perda da votação do salário mínimo, Lula estava no Tocantins, também em cima do palanque, enquanto o governo apanhava no Senado.
Cisma cancelado
O movimento da ala oposicionista do PMDB para oficializar a divisão do partido ao meio na Câmara e marcar posição de oito senadores dissidentes da orientação governista foi devidamente cancelado.
No comando da suspensão do cisma, o ex-governador Orestes Quércia, também mentor da pré-candidatura do governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, à Presidência da República.
Embora milite há tempo - desde a eleição municipal - no campo da oposição pemedebista, Quércia não vê vantagem agora na divisão, uma vez que os governistas já não têm mais porto segundo aonde ancorar.
Resta-lhes, apenas, seguir a orientação do partido seja ele qual for; candidatura própria ou aliança com algum outro grande partido.
Novas normas
Estão quase concluídos os trabalhos da comissão especial constituída pelo Tribunal Superior Eleitoral para alterar normas de regulamentação do processo eleitoral.
Uma das idéias do relator do grupo, o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, é estabelecer que as doações para campanhas só possam ser feitas por meio de cheques ou de transferência bancária, não mais em dinheiro.
Everardo, aliás, acha que para dar "um jeito nisso aí" - leia-se, no festival de ilicitudes em que se transformou o ambiente político-partidário-eleitoral - não são necessárias modificações legais.
A tão falada reforma, na opinião dele, far-se-ia com eficácia apenas usando a legislação já existente. "Basta ligar os pontos e amarrar as pontas."