O presidente Lula e muitos de seus companheiros têm reclamado do que consideram quase uma conspiração da imprensa para publicar notícias ruins sobre o governo e o País. Mas pelo menos na semana passada, se houve conspiração, foi no sentido contrário, para publicar notícias boas na crucial área econômica. Foi uma farra. E tudo notícia de fato real, nada inventado. Assim: a economia está crescendo com inflação em queda; a renda das pessoas está em alta pela queda dos preços, pelo aumento do crédito e por reajustes salariais acima da inflação, estes permitidos pelo bom desempenho das empresas; as contas públicas permanecem sob forte controle; e as contas externas exibem desempenho exuberante, que reduz a vulnerabilidade do País a crises internacionais. O que querem mais? Está na ponta da língua: queremos crescimento mais vigoroso, com juros menores e real não tão valorizado; queremos investimentos públicos e privados em infra-estrutura; queremos mais reformas e menos impostos. Tudo verdade. O País precisa disso tudo. Mas não existe razão para se desprezarem os resultados efetivamente alcançados até aqui. Quando se avalia a situação de um país, é preciso observar quatro pontos fundamentais: crescimento, inflação, contas públicas e contas externas. Ora, neste momento, o Brasil tem um desempenho entre satisfatório e bom em todos os quatro quesitos. É raro. A inflação está desabando e convergindo para a meta deste ano, de 5,1%, resultado considerado impossível poucas semanas atrás. Isso se deve à política monetária superapertada do Banco Central (BC), que elevou e manteve alta a taxa básica de juros. O dólar barato teve peso notável nesse processo - devendo-se registrar, entretanto, que a taxa de câmbio sofre influência dos juros. Altos, eles atraem investimentos externos - e a entrada de dólares desvaloriza a moeda americana aqui dentro. Para resumir, o BC detectou um surto inflacionário, tocou juros na lua e jogou a inflação no chão. Poderia ter feito isso com juros menores e em menos tempo? Sim, respondem muitos economistas, com sólida argumentação. Mas o fato é que o BC pôs a inflação na trajetória das metas. Até a semana passada, era bastante disseminada a opinião de que o BC estava também matando o crescimento. Na quarta-feira, quando o IBGE divulgou os números do produto interno bruto (PIB) no segundo trimestre do ano, verificou-se que a economia crescera 1,4% em relação aos primeiros três meses. Anualizando esse número, isto é, supondo que a economia repetisse esse desempenho por quatro trimestres seguidos, teríamos um crescimento de 5,8% - uma sólida performance. Resumindo, no segundo trimestre, no auge do processo de alta dos juros, o País cresceu num ritmo perto dos 6% ao ano. É amplo o entendimento de que esse ritmo será menor neste e no último trimestre de 2005. Mas as previsões de crescimento para este ano estão com viés de alta, aproximando-se de algo como 3,5% de expansão real, em cima de um PIB que cresceu 4,9% em 2004. Portanto, é inequívoco: o BC domou a inflação mantendo um nível razoável de crescimento. De outro lado, as contas públicas foram mantidas sob controle, fazendo-se um superávit primário elevado para pagar parte da conta de juros. O argumento à esquerda, segundo qual o País não cresceria sem que o governo aumentasse os seus gastos, também dançou. Não é preciso falar das contas externas. O superávit no comércio externo, nos últimos 12 meses, já alcançou os US$ 40 bilhões, também contrariando expectativas. Portanto, o desempenho é satisfatório no quesito crescimento, bom nos fundamentos contas públicas e inflação e muito bom nas contas externas. Como se chegou a isso? Foi o longo processo de construção de uma política econômica, que começa em 1994 com o lançamento do real. Ao longo de 11 anos seguidos se avançou na mesma direção, a introdução de uma política assentada em princípios assim resumidos: não pode ter inflação, não pode gastar mais que arrecada e é preciso depender cada vez menos de financiamento externo. Refletindo essa idéia, a política econômica se baseia no tripé regime de metas de inflação, com autonomia operacional, na prática, do BC; superávit primário nas contas públicas para reduzir o endividamento, no quadro de uma Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF); e câmbio flutuante. Há, além disso, um fator institucional decisivo: o PT, que foi contra o real, condenou o superávit primário, votou contra a LRF e prometeu romper com o FMI, esqueceu tudo isso quando Lula assumiu o governo e simplesmente deu continuidade à política que nascera em 1994, com FHC. (É verdade que uma parte do PT continua reclamando da política econômica, mas não se vislumbra aí a proposição de qualquer alternativa séria.) Assim, a prática do governo Lula atribuiu um caráter suprapartidário, supra-ideológico, a essa política econômica, o que lhe confere sólida credibilidade e durabilidade. Por isso os indicadores financeiros e econômicos não se abalam com a crise política. Estão assentados em sólidos fundamentos, numa seqüência de 11 anos. É raro para nossa História recente. Tudo considerado, podemos retomar a questão do que queremos mais. É evidente que ter os juros mais altos do mundo não está correto. Idem para a carga tributária de 37% do PIB e para a dívida pública em torno dos 51% do PIB. Também parece claro que o real está valorizado. Mas essas questões podem e devem ser tratadas no âmbito da atual política. Os últimos resultados demonstram que essa política ortodoxa funciona. E, para quem acha que são resultados pífios para 11 anos de perseverança, é preciso notar duas coisas: primeira, essa política econômica não ficou pronta em 1994, mas começou a ser montada nesse ano e veio se formando em meio a peripécias e crises internacionais; segunda, os problemas econômicos brasileiros, da superinflação ao desarranjo das contas públicas, foram meticulosamente construídos por décadas a fio. Não é simples desmontá-los. Mas pelo menos já temos a pista de como fazê-lo. *Carlos Alberto Sardenberg é jornalista. Home page: www.sardenberg.com.br
| |
|
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
segunda-feira, setembro 05, 2005
Carlos Alberto Sardenberg* E cresce!
o estado de s paulo
Arquivo do blog
-
▼
2005
(4606)
-
▼
setembro
(497)
- A votação mais cara do mundo Bruno Lima Rocha
- LUÍS NASSIF Efeitos dos títulos em reais
- Batendo no muro LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
- Dirceu entre a inocência e a onipotência MARCELO C...
- ELIANE CANTANHÊDE Nova República de Alagoas
- CLÓVIS ROSSI O país do baixo clero
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO O ELEITO DE LULAL
- DORA KRAMER Agora é que são elas
- EDITORIAL DE O ESTADO DE S PAULO Despudores à parte
- João Mellão Neto Como é duro ser democrata
- Roberto Macedo Na USP, uma greve pelas elites
- EDITORIAL DE O GLOBO Cidade partida
- MERVAL PEREIRA O gospel da reeleição
- Luiz Garcia Juiz ladrão!
- MIRIAM LEITÃO Políticas do BC
- Raça, segundo são João Jorge Bornhausen
- Cora Rónai Purgatório da beleza e do caos
- Fundos e mundos elegem Aldo
- EDITORIAL DE O GLOBO Desafios
- A Derrota Política do Governo!
- MERVAL PEREIRA Vitória do baixo clero
- MIRIAM LEITÃO Sem medidas
- EDITORIAL DE O ESTADO DE S PAULO Atrasado e suspeito
- DORA KRAMER Muito mais do mesmo
- LUÍS NASSIF Indicadores de saneamento
- ELIANE CANTANHÊDE Vitória das elites
- CLÓVIS ROSSI A pouca-vergonha
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO NORMA ANTINEPOTISMO
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO DESVIOS SEMÂNTICOS
- Aldo vence, dá gás a Lula e esperança aos "mensale...
- JANIO DE FREITAS Dos valores aos valérios
- EDITORIAL DO JB A vitória da barganha
- AUGUSTO NUNES Berzoini foi refundado
- Se não se ganha com a globalização, política exter...
- Fome de esquerda Cristovam Buarque
- A valorização do real em questão
- EDITORIAL DE O ESTADO DE S PAULO A debandada dos p...
- EDITORIAL DE O ESTADO DE S PAULO Precisa-se de ger...
- Ineficiência fiscal e a 'Super-Receita' Maurício M...
- DORA KRAMER Adeus às ilusões
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO OS DEPUTADOS DECIDEM
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO MAIS DO MESMO
- CLÓVIS ROSSI Cenas explícitas de despudor
- FERNANDO RODRIGUES Uma Câmara submissa
- ELIO GASPARI Bicudo foi-se embora do PT
- LUÍS NASSIF A discussão do saneamento
- "Upgrade" PAULO RABELLO DE CASTRO
- EDITORIAL DE O GLOBO Gastamos mal
- EDITORIAL DE O GLOBO Chávez fracassa
- No governo Lula, um real retrocesso HÉLIO BICUDO
- MIRIAM LEITÃO Das boas
- MERVAL PEREIRA A base do mensalão
- A frase do dia
- EDITORIAL DE O ESTADO DE S PAULO Desculpas não bastam
- Jóia da primavera Xico Graziano
- Oportunidade perdida Rubens Barbosa
- DORA KRAMER Com aparato de azarão oficial
- LUÍS NASSIF Os caminhos do valerioduto
- JANIO DE FREITAS Esquerda, volver
- ELIANE CANTANHÊDE Todos contra um B
- CLÓVIS ROSSI A crise terminal
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO FRAUDES NO APITO
- Diferença crucial RODRIGO MAIA
- EDITORIAL DE O GLOBO Dois governos
- Arnaldo Jabor Manual didático de ‘canalhogia’
- MIRIAM LEITÃO Além do intolerável
- MERVAL PEREIRA Espírito severino
- AUGUSTO NUNES Os bandidos é que não passarão
- A crueldade dos humanistas de Lancellotti Por Rein...
- O Cavaleiro das Trevas
- Juristas Dizem Que Declarações DE DIRCEU São Graves
- O PT e a imprensa Carlos Alberto Di Franco
- A outra face de Lacerda Mauricio D. Perez
- Reinventar a nação LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
- VINICIUS TORRES FREIRE Urubus políticos e partidos
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO CHÁVEZ E A POBREZA
- AUGUSTO NUNES Os gatunos estão em casa
- MERVAL PEREIRA O fator Mangabeira
- João Ubaldo Ribeiro Mentira, mentira, mentira!
- MIRIAM LEITÃO Eles por eles
- DORA KRAMER Um perfil em auto-retrato
- EDITORIAL DE O ESTADO DE S PAULO Contraste auspicioso
- Gaudêncio Torquato O horizonte além da crise
- São Paulo olhando para o futuro Paulo Renato Souza
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO MOMENTO IMPORTANTE
- EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO DÍVIDA EXTERNA EM REAL
- CLÓVIS ROSSI As duas mortes de Apolônio
- ELIANE CANTANHÊDE Malandro ou mané?
- LUÍS NASSIF A reforma perdida
- Para crescer, é preciso investir em infra-estrutur...
- FERREIRA GULLAR Alguém fala errado?
- JANIO DE FREITAS Nada de anormal
- Lula também é responsável, afirma Dirceu
- Augusto de Franco, A crise está apenas começando
- Augusto Nunes Uma noite no circo-teatro
- Baianos celebram volta de Lula a Brasília
- Lucia Hippolito Critérios para eleição de um presi...
- MERVAL PEREIRA A voz digital
- MIRIAM LEITÃO O perigo é olhar
- FERNANDO GABEIRA Notas sobre os últimos dias
-
▼
setembro
(497)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA