O GLOBO
As semelhanças entre os momentos políticos que estamos vivendo e a crise de 54, que culminou tragicamente no suicídio de Getúlio Vargas, já foram apontadas por vários políticos, da situação e da oposição, cada qual fazendo as ilações que mais beneficiam sua tendência política. O deputado Aldo Rebelo, ex-coordenador político do governo, foi o primeiro a fazer o paralelo, sendo muito criticado por isso. Ele se referia às elites políticas, que comparou à UDN golpista daquela época. Já o senador Antonio Carlos Magalhães, quando fez a comparação, queria se referir ao "mar de lama" que a oposição vê entrando no Palácio do Planalto.
Mas pelo menos uma estratégia adotada por Vargas em meio à crise, provavelmente sugerida por seu ministro da Justiça Tancredo Neves, é a mesma de que o presidente Lula lançou mão neste momento: sair à frente da corrida presidencial.
O que parece a muitos uma alternativa política desarrazoada, surtiu efeito em certo momento da crise de 54, e só não teve êxito por que os acontecimentos foram atropelados pela tentativa de assassinar o líder da oposição Carlos Lacerda, que desencadeou a crise final. E está tendo algum resultado hoje, pelo menos na contenção dos adversários..
O ex-presidente do IBGE Sérgio Besserman, em sua tese de mestrado no departamento de Economia da PUC do Rio, analisou a política econômica no segundo governo Vargas (1951 a 1954) e registrou que, tal como agora, "os movimentos da conjuntura política realizavam-se com um horizonte temporal delimitado": as eleições parlamentares e para governador se realizariam em outubro de 54, e a sucessão presidencial seria em 55.
Vargas teve naquela ocasião, no entanto, um gesto demagógico a que o presidente Lula se recusou hoje: deu um aumento de 100% para o salário-mínimo a 1 de maio, por sugestão de seu Ministro do Trabalho João Goulart, o que atiçou a oposição contra seu populismo. Hoje, ao contrário, o presidente Lula atuou na Câmara para derrubar um aumento irresponsável do salário mínimo aprovado pela oposição no Senado.
Houve também uma outra similitude nos meses que antecederam a queda de Vargas: uma acusação de que Perón estava fazendo um acordo secreto com Vargas para formarem, juntamente com o Chile, uma aliança no Hemisfério Sul contra a influência dos Estados Unidos na região. Esse plano foi desmentido inicialmente, mas depois foi confirmado pelo ex-ministro do exterior João Neves da Fontoura, e a partir daí Vargas foi acusado de querer montar no Brasil uma república sindicalista, à exemplo do que fazia Perón na Argentina.
Hoje, há indícios de que o quase-ditador venezuelano Hugo Chávez tenta trazer Lula para um acordo desse tipo. O mais recente lance dessa aproximação foi o jantar com que Lula recepcionou Chávez na Granja do Torto, em momento especialmente tenso da crise política. Chávez saiu do jantar dizendo que havia um complô contra o presidente Lula, e vaticinou: na sua análise, sempre que surge na América Latina um governo popular que se contrapõe aos interesses americanos na região, esse governo é desestabilizado.
Essa análise maniqueísta de Chávez alimenta teses golpistas que não se justificam, à medida que todas as denúncias de corrupção que têm surgido nascem de dentro do esquema de alianças governamental, ou do próprio PT. Mas a tese de apressar a corrida presidencial tem dado frutos. O PSDB, que vê aumentar suas chances na corrida presidencial, já vive uma disputa interna aguerrida entre o prefeito de São Paulo, José Serra, e o governador paulista, Geraldo Alckmin, que, vendo o desembaraço cada vez maior com que Serra se movimenta nos bastidores do partido, confirmou pela primeira oficialmente esta semana que deseja concorrer à Presidência.
Ao mesmo tempo, e ao contrário do PFL, os tucanos fazem acordos com o governo nas CPIs e no plenário da Câmara para não tornar mais tenso o ambiente político. A derrubada do salário-mínimo só foi possível com a colaboração de deputados do PSDB, o que irritou muito o PFL, que comandara a revolta no Senado liderado por Antonio Carlos Magalhães e queria manter a posição na Câmara. O PSDB quer manter o governo enfraquecido até as eleições, e o PFL está com gosto de sangue na boca e mira no impeachment.
A tendência dos pefelistas é sair com candidato próprio no primeiro turno, ou tentar uma aliança com o PMDB. Isso por que os dois partidos acham que o PSDB está muito arrogante, se sentindo com prioridades para indicar um candidato a que os dois adiram. Por sua vez, o PMDB, eternamente dividido entre governistas e oposicionistas, tem o ex-governador Garotinho em campanha pelo país e dois ou três governadores no aguardo dos acontecimentos. Nas próximas semanas, a verticalização deverá ser derrubada no Congresso, e a partir daí, os partidos liberados para acordos regionais, é previsível que haja um grande número de candidatos a presidente na disputa de 2006. Ainda mais se as cláusulas de barreira forem mantidas em 5% dos votos nacionais, o que provavelmente acontecerá, pois dificilmente haverá tempo para a votação da reforma política completa que reduz para 2% essa barreira. Com isso, os pequenos partidos terão que se unir em federações e serão estimulados a lançar candidatos a presidente que lhes dêem visibilidade. PPS e PDT negociam o lançamento do senador Jefferson Peres ou do deputado Roberto Freire. O PSOL quase certamente lançará a senadora Heloisa Helena.
Todos esses movimentos políticos podem arrefecer o ímpeto da oposição. A não ser que, como dizia Ulysses Guimarães, sua excelência o fato venha a se impor, como aconteceu em 54 com o atentado da Toneleiros, e como está acontecendo agora, com a série de denúncias que não se sabe onde acabará.
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