O Brasil e a Alemanha estão negociando um amplo acordo de cooperação energética que inclui todas as áreas de energia renováveis e não renováveis e reestrutura o acordo nuclear de 1975. Um texto já está sendo analisado na Alemanha. O problema é que o assunto nuclear é considerado tão sensível na atual coalizão de governo alemão que a divulgação de que o tema está sendo avaliado pode provocar reações.
Depois de reuniões entre os dois lados, o Brasil preparou um rascunho do texto do acordo e enviou neste mês de maio para a Alemanha.
Ainda não tem resposta.
No texto preparado após uma negociação entre vários ministérios brasileiros, está escrito que Angra III ainda espera uma decisão do governo brasileiro.
Tenho cópia dos textos; tanto do rascunho do acordo, quanto da nota técnica, e a recebi de fontes externas ao governo brasileiro. Depois confirmei sua autenticidade com fontes governamentais.
O escopo do acordo é amplo e vai a todos os campos de energia — hidráulica, eólica, solar, geotérmica, das marés, biocombustível (seja etanol, biodiesel ou a segunda geração do combustível de biomassa), petróleo e gás, carvão, nuclear e hidrogênio.
No parágrafo VIII, está escrito que “as partes contratantes vão apoiar atividades de pesquisa conjunta e desenvolvimento de iniciativas de tecnologias de propulsão, incluindo no setor aeronáutico, observando a necessidade de garantir participação eqüitativa de companhias dos dois países nesses projetos”.
No artigo XI, as partes contratantes asseguram que vão continuar cooperando no campo de geração da energia nuclear para fins pacíficos em inúmeras modalidades: “segurança nuclear; administração e destino final do lixo atômico; licenciamento de usinas; manutenção; operação de longo prazo e gestão do envelhecimento da unidade II da usina nucelar Almirante Álvaro Alberto (Angra II); manutenção, operação de longo prazo, gestão do envelhecimento da unidade III da usina nucelar Almirante Álvaro Alberto (Angra III), em caso de sua operação ser decidida pelo governo brasileiro; fornecimento do material, equipamentos e serviços necessários para a operação segura da unidade III da usina nuclear Almirante Álvaro Alberto, em caso de sua operação ser decidida pelo governo brasileiro.” Não é ainda o texto negociado, garante uma fonte do governo. É um texto escrito pelo Brasil, a pedido da Alemanha, após as negociações iniciais. Esse “em caso de a operação ser decidida” foi um acréscimo feito a pedido do Ministério do Meio Ambiente, que tem reservas ao uso da energia nuclear.
Esse acordo de 32 anos tem uma história cheia de altos e baixos. Continua no sonho de alguns, odiado por outros e, a cada cinco anos, um dos dois lados tenta acabar com ele. Mais polêmico é este assunto lá na Alemanha. Por pressão dos verdes, a Alemanha decidiu, tempos atrás, sair da área nuclear, interrompendo o programa de construção de novas usinas e vendendo a empresa de energia para a francesa Areva, líder mundial na área de construção e manutenção de usinas nucleares, bem como em produção de combustível nuclear. Portanto, eles estão num processo de sair da energia nuclear. Tão sensível é o tema que, normalmente, na formação da coalizão governamental, eles escrevem todo o compromisso num acordo formal.
No item sobre energia nuclear, não conseguiram chegar a um acordo. A negociação com o Brasil tem opositores dentro do governo alemão.
Aqui o tema é controverso também, tanto que o acordo com a Alemanha previa, em 1975, a construção de dez usinas, e só foi construída Angra II (Angra I foi fornecida pela americana Westinghouse). Porém, com todas as voltas que o mundo dá, o aquecimento global periga reabilitar a energia nuclear. Hoje o próprio ambientalismo é dividido a respeito do tema. Devagar, as autoridades brasileiras voltaram a falar de nuclear. Esta semana, no Fórum Globonews, o ministro Paulo Bernardo disse que o Brasil tem que discutir a construção de novas usinas.
Só que o governo brasileiro está muito mais avançado do que se sabia. O texto desse acordo, mesmo sendo um rascunho, mostra isso. Além disso, a Eletronuclear começou a fazer audiências públicas para licenciar Angra III.
O texto diz o seguinte: “O acordo entra em vigor mediante troca de notas, tão logo quanto possível”, mas fontes externas ao governo informam que a intenção é que entre em vigor já no segundo semestre. Uma nova reunião entre as partes está marcada para julho.
Se for assinado o acordo, será por 15 anos, renovável automaticamente por mais 15 anos.
Na nota técnica, fala-se da necessidade de a Alemanha continuar prestando assistência porque, afinal, o Brasil instalou uma usina com durabilidade de 60 anos, e tem equipamentos para outra usina. A nota detalha os aspectos da cooperação com cada uma das empresas na área nuclear, seja a Nuclep, Eletronuclear, Cnen e INB. Na conclusão, informa: “Nós acreditamos que o acordo nuclear Brasil-Alemanha atingiu muito dos objetivos estabelecidos no tempo da assinatura.” Diz que continuam existindo “oportunidades de cooperação” e “compromissos entre as partes”.
Marcio Zimmermann, o possível novo ministro de Minas e Energia, quando secretário de planejamento, defendeu a necessidade de o país ter oito usinas nucleares até 2030. Angra III, se for construída, ficará pronta em 2013 e produzirá 1.350MW, exigindo investimentos de R$ 1,8 bilhão. Se o Brasil for adiante com a idéia de construir outras usinas, terá que procurar novos parceiros que tenham continuado no ramo.
Provavelmente, a França.
Entrevista:O Estado inteligente
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