Alberto Tamer*
E deu no que deu. Em nada. Não houve, nem haverá nunca, acordo com a União Européia e os EUA. Doha morreu, está enterrada e não aceita visitas. Morreu porque estava condenada desde o início. Eles não querem o que nós queremos e nós não queremos o que eles querem. Chato, para nós, mas não para eles, os países ricos. Nunca pensaram em ceder nada, porque não precisam. Não vivem de exportações agrícolas, matérias-primas, mas de produtos industriais.
CINISMO E BRIGA DE BOTEQUIM
O que não se esperava era tanto cinismo e grosseria. Líder na baixaria, a representante comercial americana, Susan Schwab, gargalhou quando os correspondentes falaram na possibilidade de uma retomada do diálogo em próxima reunião dos presidentes.
Madame Marianne Fischer Boel, comissária agrícola da comunidade, só perdeu para Bush a taça da hipocrisia. Disse que 'este era um péssimo dia para o comércio mundial, que perdeu muitas oportunidades'. Ela mesma deve estar felicíssima, pois é de uma rica família de agricultores. Parece, até, que planta... rosas subsidiadas.
Mas a taça ficou mesmo com Bush. Ele disse que está desapontado, e apontou o dedo em riste para a Índia e o Brasil.
EUA JÁ HAVIAM DECIDIDO
Em 22 de março, esta coluna informou sobre uma reunião de Bush com seu alto escalão econômico antes de sua vinda ao Brasil. Nesse encontro, Susan Schwab o convenceu de que os EUA não deveriam adotar nenhuma nova política de liberalização comercial. Decidiu-se não alterar nada, ficar em banho morno, dizendo que estavam dispostos a negociar, mas não cedendo mais nada. Bush veio ao Brasil e confirmou essa política. Dissemos, na coluna, que ele iria dizer sim e ela, não.
Foi o que aconteceu. Todo sorriso, ele deu tapinhas cordiais nas costas de Lula, enquanto Susan, quase grosseira, dizia não a tudo. Não muda. E ponto final. Um ponto final decidido, que seguiu caminho até o enterro final em Potsdam, onde a União Européia bateu os últimos pregos no caixão de Doha.
NÃO PARA O MERCOSUL
Quanto à União Européia, a única novidade foi que abandonou o multilateralismo e partiu para acordos bilaterais. Com o Mercosul? Ora, o Mercosul... é um anão comercial. Segundo plano. Não, em plano nenhum. Ficamos no banco de reserva. E foi a sensível cultivadora de rosas que afirmou, na quinta-feira: 'O Mercosul não pode esperar nada de nós, além do que oferecemos aqui, em Potsdam'. Só que não ofereceram nada.
CONGRESSO FECHA PORTAS
Como se não bastasse tudo isso, na terça-feira, a Comissão de Agricultura da Câmara dos Representantes, que estuda a reforma agrícola americana, decidiu propor que a política agrícola permaneça inalterada por 5 anos. Eles propuseram também um aumento dos subsídios agrícolas ao algodão, mesmo tendo sido condenados pela OMC. OMC? Mas, para eles, o que é isso?
CHEGA? NÃO CHEGA
E agora? Vamos aos bilaterais? Ora, não é que o Itamaraty diz que agora tem pressa? O ministro Roberto Azevêdo, subsecretário-geral para Assuntos Econômicos e Tecnológicos do Ministério das Relações Exteriores, embarcou para Genebra informando que 'atacará' na volta a agenda de possíveis acordos do Mercosul. Só que madame Boel, a das rosas, já disse 'não vem, porque não tem'.
Pressa, agora? Após mais de 4 anos de política do blablablá? Pressa após a pasmaceira comercial do governo FHC? Dois ex-embaixadores, Rubens Barbosa e José Botafogo Gonçalves afirmaram que em questão de comércio exterior o Brasil ainda não sabe o que quer. E o setor privado também não, acrescenta Botafogo. Só está reclamando agora que o dólar despencou, o juro está alto e o mercado está mais competitivo?
CHEGA. NÃO CHEGA, NÃO
Brasília não pode tentar reinventar a realidade. E se o Mercosul não quiser? Ora, senhores de Brasília. Vamos mudá-lo! Não violentamos as regras quando admitimos a Venezuela como membro de uma hora para outra? E então? Vamos ficar xingando de medrosos os europeus e os americanos?
Vamos mudar regras, romper barreiras, ao mesmo tempo que, complementarmente, como todo mundo, impomos taxas protetoras, para criar uma verdadeira política comercial que contemple os setores que exportam e atrair investimentos voltados para o comércio exterior.
Temos que nos transformar urgentemente em uma poderoso pólo exportador. Há alguma humilhação à soberania nacional produzir, exportar, criar empregos, renda, crescer? Pobre Japão, que vive disso...
JÁ DISSEMOS E REPITO A FRASE:
Aumentar as exportações é também uma questão de política social, pois, criando empregos à mão cheia, iremos reduzir a dependência do pobre trabalhador brasileiro do assistencialismo do Estado. E, por favor, senhores de Brasília, parem de xingar a Europa e os EUA. Eles estão defendendo seus próprios interesses.
E nós? Por que não fazemos isso com atos, em vez de ficar esperando à toa um novo acordo que já morreu há muito tempo? Vamos., vamos! E, sabe, imagino eles me dizendo, em Brasília, pô, Tamer, não empurra, não, que eu caio sozinho...
É... Ufa! Haja paciência.
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