Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 30, 2007

FERNANDO GABEIRA

Manual dos sobreviventes
O CONGRESSO brasileiro é um dos mais caros do mundo. É presidido por um homem que não quer largar o osso, perdidas todas as condições políticas de representá-lo.
Como explicar tudo isso? Calheiros começou abordando seu drama com categorias psicológicas. Um processo esquizofrênico. Passou em seguida para as categorias políticas: uma perseguição fascista.
Isso indica pelo menos que têm conhecimentos de psicologia e de política, embora os tenha manipulado. Por que resiste em deixar o cargo, depois de passada a hora?
Há muitos pontos que explicam essa resistência. Quem vive aqui sabe que as pessoas voltadas para o poder pessoal têm uma visão particular dele. Não consideram que o poder seja resultado do respeito e admiração de seu povo. Acham o contrário: uma vez tendo poder, admiração e respeito acabam se agregando como conseqüência.
Atribui-se a Henry Kissinger a frase: o poder é afrodisíaco. Tenho uma visão oposta: o poder é muito mais próximo de Tanatos do que de Eros. No entanto, ele engana.
Vi deputados reclamarem de solidão no cotidiano. Guindados à posição de ministro, sentiram-se subitamente interessantes. Não é nada pessoal; os cargos atraem elogios, afinidades, voltadas para o que simbolizam e o que podem dar de volta.
A resistência de Renan, execrado pela mídia, condenado pela opinião pública, contém uma dose de sabedoria. É expectativa de que as coisas se acalmem, novos temas subam às manchetes. Todos sabem que a mídia depende das notícias; não é, profissionalmente, uma cruzada moral. Novas notícias, novas manchetes.
Para isso existem intelectuais, embora também espécie em extinção. O único combate conseqüente contra o poder é a memória.
O que importa um julgamento futuro se as pessoas aceitam ser execradas no presente? O critério é o número de votos, a possibilidade de se manter no topo.
A verdade é esta: o Brasil é refém de uma categoria de políticos que está de costas para os anseios da opinião pública. Seu argumento é o de que a classe média é moralista.
Os pobres sim, esses o conhecem e vão consagrá-los nas urnas. Roriz encarna essa política. Alguns motoristas disseram claramente que votarão sempre nele: legalizou nosso terreno.
A magnitude da mudança não depende só da opinião pública. Será preciso uma ampla frente com os mais pobres, atraindo-os para uma nova concepção. É importante que vejam como direitos o que lhes é mostrado hoje como favor.

Arquivo do blog