Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 23, 2007

MILLÔR


Repito um velho conselho, cada vez mais válido, sobretudo pro Congresso: "Quando alguém gritar Pega Ladrão, finge que não é com você".


Doutor, somos todos doutores!

Aos neocultos (tão perto dos semi-alfa)

Aos neocultos, essa gente que quando está conversando com você ao telefone não dispensa o celular e, com um clique do dedo, corresponde, com o mais amplo conhecimento, a qualquer assunto de que você fale, eu digo: "Cuidado, nem tudo é Google no mundo da cultura". Tem também a Wikipédia (risos).

Como esses googles da vida são apenas transcrições sem critério. Eles jogam na tela como informação confiável tudo o que encontram sobre pessoa ou assunto. Mas não ensinam você, googlista, a "processar". E é aí que está a cultura. Uma pessoa com poucos dados culturais pode ser interessantíssima, enquanto uma pessoa cheia de informações geralmente é uma chata que despeja tudo o que tem na cabeça sem qualquer formulação – processamento – pessoal.

Isso faz, só por exemplo, com que o senhor Aldo Rebelo (lembram dele? Já teve seus quinze dias de glória) pense que entende de lingüísticas porque estudou um pouco de análise lógica no pleno do PCB (Palácio Clube Bilhares). Mas quer saber o que é uma análise realmente lógica, dr. Aldo? O senhor conhece a frase de Machado de Assis que ele colocou na entrada da ABL: "Esta é a glória que fica, eleva, honra e consola".

Eu sei, dr. Aldo, é querer muito. Mas agora o senhor sabe. Então vamos fazer uma análise, esta, sim, lógica. Os verbos que adjetivam (pode? Pode) a frase não têm a menor hierarquia, gradação. As palavras foram postas ali porque foram postas ali, ponto.com.

Agora veja esta frase de Camões, que escrevia direitinho: "A disciplina militar prestante não se aprende, senhor, na fantasia. Mas vendo, tratando, e pelejando". A hierarquia das palavras, a gradação, é perfeita. Vendo. Tratando. E pelejando. Uma coisa atrás da outra, quando se fala de uma proposta, no caso ação militar. Ver primeiro. Depois conjeturar o que se vai fazer. Só então a porrada, o ir pro pau – pelejar.

É assim que se usam as palavras. Pra quem pretende usá-las e sobretudo a quem pretende legislar o uso delas, dr. Aldo.

Veja o exemplo no uso de expressões populares. Como estas, altamente criativas: "Foi comer capim pela raiz. Vestiu o pijama de madeira. Fechou o paletó".

Veja agora, atente pro sentido das frases e veja que a ordem deve ser cuidada pra valorizar o sentido das frases:

1 ­ Fechou o paletó (o momento em que o cara bate as botas, estica as canelas).

2 ­ Vestiu o pijama de madeira (o cara já está morto, dentro do caixão, o sentido é claro).

3 ­ Foi comer capim pela raiz (ele já está lá, protegido nos sete palmos de terra, que estão reservados a todos vocês que não optaram pela cremação).

Não tem de quê, dr. Aldo.

Ainda se pode citar Lenin?
"O que é um assalto a um banco diante de um banco?"
Millôr Fernandes,

Arquivo do blog