Governo e Estados negociam aumento de dívida, que está longe de chegar aos R$ 140 bilhões alardeados por aí |
O "MERCADO" FAZ lobby para reduzir a meta de inflação e os compulsórios (dinheiro que os bancos têm de deixar parado no Banco Central). Medidas nem de longe prioritárias, que tendem a aumentar o risco de gastos adicionais com juros, quando o problema central é o excesso de gasto do governo e o baixo nível de investimento público. Além disso, Estados querem fazer mais dívida. Discute-se dinheiro público grosso, e o Congresso se ocupa de Clodovil Hernandez.
O debate mais obscuro é o dos Estados. Em vez de um limite de endividamento equivalente à arrecadação anual, querem o dobro. A lei de refinanciamento da dívida estadual estipula que os governos não podem dever mais que o equivalente a sua receita anual. Mas a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) fixou o teto de endividamento em duas vezes a receita anual, embora os conceitos de dívida e receita sejam distintos nas duas leis, o que faz alguma diferença, caso a caso estadual. Os Estados querem se enquadrar na LRF.
Diz-se que o impacto da mudança de critério "pode chegar" a R$ 140 bilhões (de dívida extra). Tal conta parece simplória. Considera a soma de dívida e receita de todos os Estados. Mas Estados não arrecadam ou se endividam em conjunto.
Vários Estados em tese já podem fazer mais dívida, se o critério é a relação dívida/receita (devem menos que arrecadam por ano). Outros não poderiam fazê-lo nem pelo novo limite (Rio Grande do Sul e Alagoas). Além do mais, a dívida não seria feita de pronto: não haveria tanto crédito imediato, é preciso que alguém se disponha a emprestar aos Estados e que a União autorize o débito.
O assunto deve interessar mesmo a 10 Estados que devem de uma vez a duas vezes a sua receita (vide gráfico ao lado). A conta então cairia de R$ 140 bilhões para uns R$ 46 bilhões.
Problemas? Talvez desmoralizar a lei de refinanciamento e a LRF; permitir que governos mambembes estourem suas contas. E mais dívida e gastos reduzem o superávit primário do setor público: se Estados poupam menos, o governo federal teria de compensar a despesa extra.
Vantagens? Alguns governos, talvez São Paulo, Minas e Bahia, podem gastar melhor que o governo federal; os Estados estão muito amarrados. Liberar um pouco mais de crédito pode ainda permitir que governos, na prática, refinanciem a dívida. Isto é, caso consigam tomar empréstimos a juros menores que os devidos ao governo federal.
A política do caso é curiosa. Na hipótese de vingar o novo limite de dívida, Lula como que abriria uma linha de crédito de até R$ 6,7 bilhões para José Serra (PSDB-SP), de R$ 2,4 bilhões para Aécio Neves (PSDB-MG). E de R$ 11,1 bilhões para Jaques Wagner (PT-BA).
A política luliana tem sido de "pacificação" política geral e de favores setoriais para empresas e partidos. O que Lula 2 estaria cozinhando? vinit@uol.com.br