Mas quem são a direita e a esquerda que estão hoje votando? Que grupos ou classes sociais as constituem? |
OS ELEITORES franceses escolhem hoje entre Nicolas Sarkozy e Ségolène Royal, entre a direita e a esquerda ou, como os dois candidatos insistem, tentando aumentar suas diferenças, sobre "dois projetos de nação". Quais seriam esses dois projetos?
Mais ordem e mais segurança, como querem os eleitores de Sarkozy, ou mais justiça e mais liberdade individual, como querem os de Ségolène? Essas demandas aparecem nas pesquisas e são suficientemente claras para mostrar que a diferença entre esquerda e direita continua viva e forte.
Se a esquerda se identifica com a busca da justiça social, ainda que com algum risco para a ordem, a direita privilegia sempre a ordem -uma ordem que, no caso da Europa, se identifica com a rejeição aos imigrantes.
A eleição se realiza em bases ideológicas, portanto, como é próprio de democracias avançadas, mas não é muito diferente porque a França é uma nação forte e coesa e porque em todas as nações os candidatos de direita e de esquerda já contam com seus eleitores cativos, não lhes restando alternativa senão disputar os do centro.
Mas quem são a direita e a esquerda que estão hoje votando? Que grupos ou classes sociais as constituem? A resposta a essa pergunta está em uma pesquisa TNS - Sofres publicada pelo "Le Monde" (25/4). Os eleitores, independentemente de fazerem parte de uma das três classes que estão presentes nas sociedades modernas -as classes capitalista, profissional ou trabalhadora-, votam em candidatos de todas as ideologias, mas podemos ver as tendências dominantes.
Sem surpresa, a direita é constituída principalmente por empresários e pela alta classe média profissional -as duas classes dirigentes no capitalismo contemporâneo: 37% dos empresários e comerciantes votam na direita contra 24% na esquerda; 31% dos profissionais votam na direita contra 23% na esquerda.
Já a classe média profissional formada pelas "profissões intermediárias" e pelos "empregados" vota prioritariamente na esquerda, embora as diferenças aqui sejam menos significativas: 31% das profissões intermediárias e 27% dos empregados votam na esquerda, contra, respectivamente, 28% e 25% que votam na direita. As classes sociais comportam-se, portanto, como esperado, mas as diferenças são pequenas. E como ficam os trabalhadores?
Votam principalmente na extrema-direita (26%), embora estejam presentes também na esquerda (24%). Os eleitores do velho Partido Comunista são tão fracos que não aparecem no quadro. O grande divisor, entretanto, é a idade: os jovens entre 18 e 25 anos votam principalmente em Ségolène Royal (34% contra 19%), enquanto os maiores de 65 anos preferem claramente Sarkozy (44% contra 21%). No Brasil, pelo critério idade, Ségolène estaria eleita; na França, os idosos pesam muito mais.
Quem vencerá as eleições? Sarkozy ainda é o favorito, pois hoje, na França, a direita é mais forte. E há um consenso de que a França está necessitando de reformas porque suas taxas de crescimento, embora boas, não são tão boas quanto as de seus concorrentes mais próximos: Grã-Bretanha e, mais recentemente, Alemanha.
Caso eleito, não se imagine, porém, que Sarkozy vá tentar instalar na França o modelo de capitalismo americano. Nem mesmo o modelo britânico será adotado, pois os franceses sabem que o modelo de capitalismo europeu é superior não apenas do ponto de vista social e político (é mais seguro, mais justo e mais democrático). É também mais eficiente que o americano: produz melhor qualidade de vida com menos trabalho.
O problema da França, porém, está no fato de que, na Europa, ela está ficando para trás porque deixou de fazer duas reformas fundamentais que outros países europeus fizeram: os países escandinavos adotaram a "flexissecuridade" -a combinação de flexibilidade de contratação de trabalhadores com maior segurança garantida pelo Estado; os britânicos, por sua vez -em seguida, também os escandinavos-, fizeram a reforma da gestão pública, ou reforma gerencial do Estado.
Os franceses sabem que o país precisa caminhar nessas duas direções. Com Nicolas Sarkozy? Eu preferiria que fosse com Ségolène Royal, que, além da indignação com a injustiça, conserva toda a sua feminilidade: para concorrer com os homens na política, não os imita. Não parece, porém, que as francesas se deram conta disso.
Os dois candidatos exageram quando afirmam que vão escolher entre dois projetos de nação. O projeto nacional francês não está realmente em discussão. Em uma nação bem-sucedida sob quase todos os pontos de vista, o que se está discutindo é como combinar melhor ordem com justiça, eficiência com segurança individual.