Entrevista:O Estado inteligente

sábado, setembro 10, 2005

augusto nunes Severino já vai tarde

jb


A abertura da óperabufa foi concebida pelo ministro José Dirceu: o chefe da Casa Civil convenceu o presidente itinerante e o comando do PT de que o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh merecia ser presidente da Câmara. Era o nome dos sonhos para os interessados em mais fissuras na sempre volátil "base aliada".

O advogado Greenhalgh foi um corajoso e competente defensor de presos políticos (e, no caso Celso Daniel, esbanjou eficácia na tarefa de atrapalhar investigações). O político Greenhalgh é só mais um deputado. Ruim de voto, avesso a sorrisos e pouco efusivo, consolidou no Congresso a imagem de arrogante. Para Dirceu, arrogância é firmeza. Para os demais parlamentares, arrogância é arrogância. E é pecado mortal.

A escolha equivocada anabolizou a embrionária dissidência liderada pelo petista mineiro Virgílio Guimarães. (Pouquíssimos sabiam que fora ele quem apresentara Marcos Valério a Delúbio Soares.) Se não vencesse, ao segundo turno decerto chegaria.

Assim pensavamos deputados que subestimaram o tamanho do baixo clero" – um balaio que junta novatos atarantados, anônimos de carteirinha, oportunistas irremediáveis, trombadinhas de terno e gravata, ressentidos fundamentais. Chegara a vez de Severino, pressentiu a turma.

Único e eterno arcebispo do baixo clero", o deputado pernambucano Severino Cavalcanti sempre estivera a poucos centímetros da cadeira do presidente da Câmara. Quando entrou na disputa de 2003, era o primeirosecretário da Mesa. Parece pouco. É um cargo e tanto.

O presidente manda muito, claro. Mas cabe ao primeiro-secretário tomar decisões que rendem simpatias, reverências, gratidão e, sobretudo, votos. Quem ocupa o cargo administra os contratos da Câmara. Esses trunfos levariam Severino ao coração do poder. E, agora, à derrocada.

Chegou ao segundo turno com os votos do "baixo clero". Chegaria à presidência com o apoio de dezenas de deputados do PSDB e do PFL. Quando a corrida ficou restrita a Greenhalgh e Severino, mesmo oposicionistas sensatos cederam à tentação de fuzilar politicamente o governo Lula. Os disparos atingiram o alvo. Mas provocariam efeitos muito mais devastadores na Câmara.

Fruto do cruzamento da incompetência do governo com o oportunismo da oposição, Severino tornou-se o terceiro nome na linha sucessória presidencial. Logo se acertou com Lula, que presenteou o novo amigo com um emprego federal para um severino júnior. O negociante não conseguiu "aquela diretoria da Petrobras que fura poços", mas alugou o Ministério das Cidades. E alojou no Tribunal de Contas da União o ex-deputado Augusto Nardes, incapaz de avaliar honestamente uma conta de luz.

O fim iminente de Severino só pode ser festejado por deputados que lhe negaram o voto. Que se calem os que, hoje arrependidos, ajudaram a humilhar o Brasil.

A boa vida do ilustre ladrão

Já no começo do tiroteio na CPI dos Correios, uma bala perdida atingiu a testa do delinqüente Glênio Guedes, que agia sob a camuflagem de procurador da Fazenda Federal. Investigações policiais comprovaram que o ilustre funcionário consolidara prósperos vínculos com Marcos Valério e chefões do Banco Rural, cujos interesses o Carequinha de Minas ajudava a administrar.

Com pareceres orientados pelo critério da pilantragem, o procurador livrou o banco de pesadas multas impostas pelo Banco Central. Foi premiado com afagos de emirados árabes e uma propina de R$ 902 mil. Mas o país inclemente com pobres que furtam xampus é misericordioso com ladrões ilustres. Pouco preocupado com a sindicância que examina o caso, Guedes gasta o produto do roubo.

Palmas para a Ala dos Mineiros

Foi um bom começo o relatório parcial montado em conjunto pelas CPIs dos Correios e do Mensalão. Num país aviltado pela impunidade afrontosa e pelo cinismo corporativista, é estimulante o desfile dos 18 do Cofre na avenida que termina no cadafalso. É a comissão de frente do bloco da pilantragem. Fez bonito.

Mas nem sequer chegaram à área de concentração destaques muito vistosos e alas indispensáveis. A platéia aguarda com especial ansiedade, por exemplo, a grande Ala dos Mineiros, criada em 1998 por Marcos Valério (foto a esq.), o maior maleiro do Brasil. Seu principal destaque é o tucano Eduardo Azeredo (à dir.).

Governador em busca da reeleição, Azeredo foi amparado por R$ 10 milhões valerianos. Hoje líder do PSDB no Senado, merece brilhar no carro alegórico que abriga Paulo Abi-Ackel, filho do relator Ibrahim. O garoto também viajou no valerioduto. A Ala dos Mineiros tem enredo próprio. Celebra o Banco Rural.

Gatilho de estimação

O Órgão Especial do Ministério Público de São Paulo finalmente fez justiça: afastou do quadro de promotores, definitivamente, o homicida Thales Ferri Schoedl. Em janeiro, o promotor substituto de 26 anos, em férias numa praia, reagiu a tiros a supostas provocações formuladas por um grupo de jovens. Matou um e feriu outro. Quem comparece armado a um luau em Bertioga não tem maturidade nem equilíbrio necessários ao exercício da profissão.

A exclusão do criminoso é o lado bom da história. O ruim escancara a face escura do corporativismo. No Conselho com mais de 30 integrantes, o afastamento do gatilho de estimação foi aprovado pela diferença de um voto. Numerosos eleitores acharam que Thales merecia continuar no Ministério Público. Levianamente, sustentaram que matou em legítima defesa. Corporativismo é isso aí.

Paulo Maluf passou anos dizendo que quem descobrisse alguma conta em seu nome num banco estrangeiro poderia ficar com a bolada. Como a Polícia Federal está chegando lá, o Cabôco anda curioso. Quer saber o nome do delegado que descobriu a fortuna depositada por Maluf no exterior. E cumprimentar o xerife que vai virar milionário.

Foi outra a cena do crime

No domingo passado, ao comentar a derrubada clandestina de prédios históricos em Minas, o colunista identificou corretamente o vilão e o alvo do ataque. Mas trocou a cena do crime: foi em Belo Horizonte – não em Ouro Preto – que ocorreu o delito arquitetado pelo bispo Edir Macedo, pastor maior da Igreja Universal do Reino de Deus. Ao saber que quatro casarões pertencentes à organização estavam prestes a ser tombados pelo Patrimônio Histórico, Edir ordenou o ataque de surpresa.

Reduzidos a pó, os casarões abriram espaço para um grande estacionamento. Foram demolidos em poucas horas. Preocupado com o futuro dos devotos, o bispo não perde tempo com coisas do passado. Consumado o crime, o governo mineiro promete endurecer a legislação. Até lá, deveria desapropriar um templo de Macedo e transformá- lo em museu.

Síndrome de Haydée

Haydée, personagem da novela Am ér ica int erpretada por Cristiane Torloni, é uma milionária que sofre de cleptomania. A doença, que induz seus portadores a furtar compulsivamente, só afeta ricos. Pobres estão proibidos de contrair moléstia tão refinada. Pequenos furtos bastam para remetê-los à cadeia como ladrões.

Os beneficiários do valerioduto têm procurado escapar do castigo com explicações tão consistentes quanto um prédio de Sérgio Naya. Deveriam inspirar-se na figura de Haydée e declarar-se cleptomaníacos. Não são gatunos. São doentes. Não merecem um catre. Qualquer divã de psicanalista pode livrá-los da compulsão para roubar.

Trabalhe, ministro

"Estamos passando das eras dos discursos para a era da prática", avisou o presidente Lula na festa de inauguração da Rodovia Interoceânica. É improvável que o campeão do improviso interrompa a discurseira. O Brasil já se sentiria homenageado se todos os ministros tratassem de concentrar-se em ações importantes e tarefas urgentes. Saraiva Felipe, por exemplo, assumiu há semanas o Ministério da Saúde. Indicado pelo PMDB, tem o tempo consumido pela montagem da equipe.

O resto pode esperar. O governo ainda não definiu a política de saúde, programas essenciais estão em frangalhos, o combate à Aids cessou e faltam remédios para portadores do vírus da hepatite C. No Rio, faltam remédios e sobra incompetência. O Ministério e a Secretaria de Saúde talvez queiram resolver o problema pela via radical: a eliminação física dos pacientes.

Gritos do silêncio

Sempre independentes, e cada vez mais inventivos, os jurados do Yolhesman Crisbelles decidiram que certos silêncios também valem taça. Falantes incuráveis não se calam: continuam mandando recados relevantes sem usar a voz. Apoiado nessa tese, o júri premiou a eloqüente mudez de Marta Suplicy. Pelas frases que não diz há três meses, Marta leva a taça.

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