Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, setembro 15, 2008

Pobres com petróleo Carlos Alberto Sardenberg*

O barril de petróleo foi negociado abaixo dos US$ 100 na semana passada e tudo indica que pode cair ainda mais. O mundo todo está crescendo menos e, pois, gastando menos energia - esse é o fato principal. Mas é impossível antecipar qual será a cotação ao final deste ciclo de baixa, sobretudo num mercado sujeito a movimentos geopolíticos, além dos furacões.

Na década de 70, o petróleo foi de US$ 15 para US$ 40, para voltar aos US$ 15 nos anos 80. Se a história se repete, o barril poderia voltar aos US$ 60 de janeiro de 2007, quando se iniciou o último ciclo de alta, que quase chegou aos US$ 150.

A queda nos anos 80 resultou de uma combinação de recessão, inflação e descobertas de novos campos de petróleo. Pois temos tudo isso de novo, mas em grau menor. A inflação de hoje nem de longe se parece com a devastação que foi nos anos 70 e 80. Idem para a recessão, hoje mais uma desaceleração.

Quanto às descobertas de óleo, são menos numerosas e, sobretudo, muito mais caras - como é o caso do óleo brasileiro na camada pré-sal. O produto está em locais difíceis. Além disso, faltam equipamentos e profissionais, por isso mesmo com preços em alta forte.

Eis por que companhias petrolíferas começam a rever seus projetos. Na semana passada, a francesa Total, que prospecta nas águas profundas do litoral de Angola, informou que esse petróleo não será comercial se a cotação cair abaixo dos US$ 70. Na conta, a empresa considera uma taxa de retorno de 12,5%.

A Petrobrás não revela qual preço torna comercial o óleo do pré-sal. Gente do setor tem falado em US$ 60/US$ 70, número não admitido por diretores da estatal. Estes dizem confiar em ganhos de produtividade para reduzir os custos de extração. Ou seja, eles entendem que não apenas vão superar o enorme desafio da exploração em águas muito profundas - algo que nunca se fez antes -, como farão isso criando novas tecnologias e métodos de exploração.

É uma boa aposta, claro, mas de risco razoável, pois a Petrobrás já desenvolveu capacidade nessa área. De todo modo, ainda não dá para estimar preços e rentabilidades, embora fique claro que o processo todo será muito caro e demorado.

Tudo considerado, é mesmo possível que o pré-sal torne o Brasil um país rico, mas isso não será simples. Vai ser preciso tomar decisões sábias para explorar o petróleo a custos e prazos razoáveis, e serão decisões complexas.

Por exemplo, é interessante a idéia de aproveitar o óleo para criar aqui uma indústria de navios, plataformas e equipamentos de exploração. Mas é evidente que demora mais e sai mais caro do que recorrer a parques industriais já consolidados em outros países.

Será uma escolha: recolher logo o dinheiro do petróleo, com equipamentos importados, ou esperar o avanço dos fabricantes nacionais.

E quanto ao ganho que as reservas darão ao País, só haverá mais informação quando o governo fizer as primeiras licitações para a exploração no pré-sal. Uma coisa é quanto o dono acha que vale; outra é o que o mercado está disposto a pagar.

É por isso que há países pobres com riquezas naturais e países ricos não abençoados pela natureza, como Japão e Coréia do Sul. Também já se disse aqui: Israel, sem petróleo, tem quase o dobro da renda per capita da Arábia Saudita, dona das maiores reservas do mundo. Tudo depende das decisões políticas.

Estatização nos EUA - A intervenção do governo americano nas megaagências hipotecárias Fannie Mae e Freddie Mac só não foi uma estatização no sentido estrito porque não houve compra nem desapropriação das ações. Mas é uma estatização porque o governo assumiu o controle total das companhias, podendo até dissolvê-las ou vendê-las. E tudo com amplo apoio. Na verdade, raramente a ação de um governo teve apoio tão amplo quanto essa decisão de Washington. Houve apenas um tipo de crítica: talvez a medida não seja suficiente para conter a enorme crise financeira; talvez tenha demorado. Mas, quanto ao pacote em si, aplauso total.

Não deixa de ser curioso. No país do liberalismo, onde se pratica a economia de mercado no seu grau mais avançado, o governo estatiza duas enormes companhias financeiras e recebe apoio local e global.

Como interpretar? Alguns, como a ministra Dilma Rousseff, entenderam assim: é para todo mundo ver que isso de mercado e liberalismo é só da boca para fora, ou do país para fora. Quer dizer, vale para os outros, não para os EUA.

Outros viram diferentemente: não há nada de novo nesse episódio. Como sempre, há falhas de mercado ou problemas causados por uma má regulação econômica. É função do governo sanar esses problemas, mas não para se substituir ao mercado.

Em resumo, Fannie Mae e Freddie Mac eram muito grandes para quebrar. Os custos da intervenção são menores do que o custo de não intervir.

E tudo bem com o mercado: saneadas, as agências serão reprivatizadas.

Quanto ao fim do liberalismo, só se for mesmo nos EUA. Porque aqui, até o governo do PT aderiu às privatizações.

Comprem Brasil - Se você quer comprar ações de empresas de países emergentes, para onde deve ir? Para o Brasil, recomenda o banco de investimentos Morgan Stanley, em relatório divulgado sexta-feira. E se você quer investir em títulos de renda fixa? No Brasil, recomenda outro banco de investimento, o Deutsche.

Outra notícia interessante da semana passada: enquanto os papéis da Vale sofriam, a China, principal cliente da Vale, anunciava recorde de importação de minério de ferro em agosto. E a companhia brasileira negocia aumentos de preços.

Muitas vezes, a negociação de papéis nas bolsas passa ao largo da situação real das empresas. Por isso as ações, às vezes, ficam incrivelmente baratas.

*Carlos Alberto Sardenberg é jornalista
Site: www.sardenberg.com.br

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