Os projetos em questão tratam de temas diversos, como formação de professores; definição das categorias que integram os "profissionais da educação"; regras para os planos de carreira dos professores e os demais profissionais da educação básica; normas para a eleição dos diretores de escola; criação de benefícios para os professores, como um ano sabático a cada sete anos de exercício profissional; fixação do 14º salário para os professores da educação básica, criação de um currículo nacional para o ensino básico; e aumento da carga horária mínima no ensino básico, entre outros temas.
Muitas dessas propostas são meritórias e algumas poderiam teoricamente vir a impactar positivamente a qualidade da educação. Não é o caso, porém, da maioria delas, preocupadas apenas em aumentar benefícios e gastos, o que não necessariamente melhora os resultados do processo educativo, como já foi sobejamente demonstrado em pesquisas nacionais e internacionais.
As motivações dos agentes que movem esse processo são diversas. Os que o fazem por ideologia ou visão de mundo centralizadora se dividem em dois grupos: os que pensam encontrar no processo de federalização a solução para os inaceitáveis índices de qualidade da educação pública de nível básico em nosso país e os que enxergam nele uma oportunidade de impor a todo o País conteúdos curriculares eivados de seus próprios valores ideológicos.
As razões que movem os representantes das corporações de profissionais da educação e dos sindicatos são muito mais pragmáticas e oportunistas. Busca-se tirar proveito da benevolência com que os projetos relativos a benefícios para professores são encarados no Congresso e do fato de o governo federal não "pagar a conta", para obter vantagens de carreira que muito dificilmente seriam aprovadas nos Estados e municípios, onde as questões orçamentárias e financeiras seriam necessariamente consideradas. Some-se a isso um tipo de atuação das entidades sindicais que visa, de modo ostensivo, ao constrangimento dos parlamentares para que votem sempre favoravelmente a suas propostas.
O governo federal adota uma atitude oportunista e irresponsável. O Ministério da Educação (MEC) não é autor de nenhuma dessas proposições. A própria lei do piso nacional para os professores foi decorrência de adição colocada no Congresso à proposta de criação do Fundeb e as modificações introduzidas na Câmara dos Deputados no projeto de lei original do governo são o que contraria mais gravemente a Constituição. Entretanto, uma vez aprovadas essas leis, o presidente simplesmente as sanciona, sem ligar para os aspectos formais ou para as conseqüências financeiras para Estados e municípios.
Salvo o caso de países totalitários, não há experiência no mundo de um país tão vasto e diverso que tenha um sistema educacional unificado. Em geral, isso é próprio de países unitários, e não federativos, com população e número de escolas muito inferiores aos nossos. Nos grandes países de ordenamento democrático prevalece um sistema descentralizado, baseado ou não nas unidades federativas, e com certa coordenação por parte da autoridade nacional.
A preocupação crescente com a qualidade da educação no mundo todo tem levado muitos governos nacionais nos países descentralizados a criarem mecanismos de estímulo e cobrança aos agentes encarregados da gestão do sistema público de educação. Em nenhum caso, porém, está se propondo a centralização do sistema, como alguns advogam no Brasil. A razão é simples: seria impossível gerir com competência e qualidade sistemas tão gigantescos como os que viriam a ser constituídos. O prejuízo ainda maior para a qualidade da educação seria um mero corolário.
Até meados dos anos 1990, nosso sistema de ensino básico era realmente disperso e até contraditório em muitos aspectos. A partir de 1995, foram a criação do Fundef - o fundo de desenvolvimento do ensino fundamental -, de um lado, e a implantação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Básico (Saeb), de outro, que iniciaram o primeiro esforço realmente sério de coordenação da política de educação básica por parte do MEC. A isso se somou, nos anos seguintes, a fixação das diretrizes curriculares para todos os níveis da educação básica. Ou seja, o esforço para estabelecer certa coordenação nas políticas para o ensino básico em nosso país por parte do MEC é muito recente.
Hoje, a própria sociedade se conscientizou da necessidade de cobrar metas e resultados dos sistemas de ensino e o próprio Ministério adotou essa postura. É preciso aprofundar essa linha com vigor e nunca substituí-la por uma aventura centralizadora que estaria fadada ao fracasso.