Esta é a mais perigosa crise econômica de nossa era. Ela tem ingredientes explosivos: um presidente fraco, uma falta de liderança no país mais poderoso do planeta e o pior desmonte do mercado já visto em 80 anos. O retrocesso da negociação ontem foi mais um flagrante da fraqueza da liderança. Mas a chance que a economia tem é de que a democracia a salve, ao melhorar um projeto cheio de defeitos.
Mesmo num dia que termina tão complexo quanto o de ontem, é na democracia que se pode apostar. A proposta inicial, apresentada nos jardins da Casa Branca por quatro cavalheiros com cara de Apocalipse, na sextafeira passada, era, na visão do governo, para ser aceita sem discussão. Ela era controversa do ponto de vista econômico e insustentável do ponto de vista político e jurídico. A negociação está melhorando o projeto.
O surpreendente retrocesso de ontem à noite, quando tudo parecia já acertado, tem uma explicação simples: é a disputa eleitoral entrando num tema que deveria ter estado acima desse conflito. E não foram os democratas que fizeram o jogo político-partidário, mas os republicanos.
A reunião, descrita pelos participantes à imprensa americana como “conflituosa”, deixou o assunto ainda suspenso no ar.
Os democratas vinham dizendo o tempo todo: é problema dos republicanos, eles têm que votar e nós ajudamos a aprovar. O que Bush e o secretário Henry Paulson ouviram do líder republicano, na reunião, é que seus “conservadores” não aceitavam o acordo.
O candidato democrata, Barack Obama, então, quis saber de Paulson se era possível conciliar os interesses dos conservadores, respeitando os pontos fundamentais já acertados. Paulson não soube dizer. O líder republicano, John Boehner, disse que precisava consultar os republicanos durante a noite para saber até onde iriam. Nesse ponto, a conversa desandou. Os democratas disseram que, se os republicanos não conseguiam se entender, eles não iriam se comprometer com acordo algum.
Democracia tem dessas coisas, a negociação é penosa, demanda tempo e liderança.
Liderança, é o que ficou claro, os republicanos não têm: nem Bush, nem McCain conseguiram demonstrar isso ontem. Aliás, o que se disse da reunião foi que McCain teve uma participação pífia.
O senador Christopher Dodd, democrata, presidente do Comitê Bancário do Senado americano, que tem sido peça-chave nestas negociações, relatou que, durante a reunião, a Casa Branca tratou o acordo como um plano de emergência para McCain, afastando os democratas do processo, que se encaminhava para ser mais democrata que republicano.
Se foi isso, é o pior erro que o governo poderia cometer.
A hora era de Bush não ser partidário. Ele tinha que agir como magistrado, até para salvar seu resto de mandato. Os republicanos querem um plano alternativo que cria um seguro hipotecário fornecido pelo governo, no lugar da compra de ativos hipotecários dos mutuários.
Segundo Dodd, se a proposta adotada por Paulson for a dos republicanos, a negociação teria de começar novamente.
São os republicanos que governam, é deles o projeto supostamente salvador cheio de defeitos, eles convocaram uma reunião na Casa Branca, lá eles se desentenderam e não cooperaram, porque queriam usar o momento para fortalecer seu candidato e se distanciar de um presidente impopular.
Só para lembrar uma declaração de Bush em maio: “Nós podemos ter confiança nas fundações de longo prazo da nossa economia.” Na quarta à noite, ele disse que a economia inteira estava em perigo. O pronunciamento do presidente Bush era a cena de um homem que sabe que seu poder está se esvaindo, mas quer usar o que sobra dele para evitar o pior.
Esqueceu de organizar sua própria tropa e, por imperícia, a quinta-feira terminou confusa, depois de um dia que tinha sido de alívio.
A oposição democrata teve que ir para a mesa de negociação, porque virar as costas para o bilionário projeto de resgate seria perigoso.
Ela poderia ser acusada como culpada pelo cenário catastrófico. Saiu-se bem no processo negociador ao mostrar que não concordava com o projeto e que só o aceitaria com aperfeiçoamentos.
As mudanças que incluíram eram boas: mais fiscalização; um programa para as grandes vítimas, os mutuários; mais garantias para o contribuinte; parcelamento da liberação; mais poder ao Congresso.
Mas faltava o consenso dos republicanos.
O processo de negociação deixou seqüelas. Uma delas é que o presidente do mais poderoso e independente banco central do mundo está enfraquecido. Ben Bernanke deixou sua posição de condutor da política monetária para entrar num corpo-a-corpo no Congresso, em defesa de um projeto do Executivo; enfrentou tiroteio de parlamentares de ambos os partidos.
O arrogante Henry Paulson do primeiro dia foi perdendo a pose ao longo da semana. Mas os dois grandes perdedores da noite foram Bush e McCain, que protagonizaram um impasse por não conseguirem exercer liderança sobre seu próprio partido. O acordo ficou mais distante, na noite de ontem, do que estava à tarde.
Mas a madrugada e a
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