O Globo |
10/9/2008 |
O oposto dos subúrbios dos subúrbios (exurbs) ou dos subúrbios emergentes (exurbia), de que falei aqui recentemente, que reúnem cerca de 15% da população dos Estados Unidos em espaços pouco povoados nas franjas das grandes cidades, são as megalópoles, que concentram os avanços tecnológicos e o desenvolvimento cultural do mundo moderno. Ao contrário dos suburbanos, que procuram amplos espaços para morar mesmo sem serviços de lazer e cultura, os moradores das grandes megalópoles mundiais querem estar próximos de pessoas com os mesmos interesses e necessidades, e tanto pessoas quanto empresas ganham em produtividade com essa troca de informações e o acesso à tecnologia do conhecimento que só as grandes conurbações oferecem. O professor canadense Richard Florida, autor da tese de que a escolha da cidade onde uma pessoa vai viver é uma das mais importantes da vida moderna e define o tipo de pessoa que você é, destaca entre as 40 mais importantes megalópoles do mundo a conurbação entre Rio de Janeiro e São Paulo, a Riopaulo. Por sua vez, o economista brasileiro André Urani também está convencido de que não há sentido em pensar o futuro da região metropolitana do Rio de Janeiro separado do de São Paulo (e vice-versa). No livro "Trilhas para o Rio - Do reconhecimento da queda à reinvenção do futuro", pela editora Campus-Elsevier, recentemente lançado, ele analisa as razões da decadência do Rio e projeta as soluções para o futuro, na certeza de que o território entre as duas maiores cidades do país está sendo conurbado naturalmente. Recentemente, pela primeira vez foi fotografada a conurbação entre São Paulo e Campinas. A conurbação imaginada por André Urani abrange cidades dos três estados mais importantes do país, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, em direção a Campos, no Rio de Janeiro, a Campinas, em São Paulo, e a Juiz de Fora, em Minas Gerais. A "Megalópole Brasileira", ou M"bras, é formada por 232 municípios interligados por diferentes aspectos, e equivale a apenas 0,97% do território brasileiro. No entanto, tem 41,7 milhões de pessoas, quase 23% da população brasileira, 96% residentes em áreas urbanas, contra uma taxa brasileira de 81%. E é responsável por 35% do Produto Interno Bruto brasileiro, com renda domiciliar per capita cerca de 55% maior do que a média brasileira. Mas também, por representar um país ainda fortemente desigual, concentra boa parte dos pobres e indigentes do país. No prefácio que escrevi para o livro, onde estão registrados esses números, digo que a megalópole brasileira de Urani já chega preparada para o futuro, com uma taxa de analfabetismo que é cerca da metade da do país e, quando se fala de novas gerações, a diferença é ainda mais marcante: entre as crianças de 10 a 14 anos, a praga do analfabetismo está praticamente erradicada. Tem 18,6% do total de estabelecimentos de ensino superior do país e reúne 24% de seus universitários. No eixo Rio-São Paulo estão localizadas as principais instituições e organizações ligadas à pesquisa, tais como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Instituto de Pesquisa Energéticas e Nucleares (Ipen), o Laboratório Nacional de Computação Científica, a Fundação Getulio Vargas. Para Urani, o que está em jogo é, simultaneamente, o revocacionamento de nossas duas principais metrópoles para o século XXI e o próprio papel do Brasil no mundo. Ele lembra que São Paulo e Rio de Janeiro perderam, nas duas últimas décadas do século XX, as vocações que fizeram delas grandes metrópoles em meados do século passado. "De 1920 a 1980, o crescimento demográfico foi de 4,5% ao ano na RMSP e de 3,3% na RMRJ (a partir de 1954, SP supera o Rio em número de habitantes). Num contexto em que a economia da RMSP crescia espantosos 10% ao ano e a da RMRJ "apenas" 7%". De 1980 em diante, até 2005, as coisas mudaram drasticamente. Por um lado, o crescimento demográfico arrefeceu: caiu para pouco mais de 2% na RMSP e para 1,1% na RMRJ. Mas o mais espantoso, diz Urani, foi a freada econômica, muito mais brusca ainda: o crescimento anual médio do PIB caiu para 1,5% na RMSP e para 0,6% na RMRJ. Ou seja: nossas principais metrópoles se tornaram flácidas; passaram uma geração inteira encolhendo em termos de PIB per capita, ressalta. A Megalópole Brasileira seria, portanto, uma tentativa de encontrar um nicho de inserção de nossas principais metrópoles neste mundo globalizado do século XXI. "Alqueres (José Luiz Alqueres, presidente da Light, um dos idealizadores do projeto) e eu a chamamos de M"bras (e não, por exemplo, de Riopaulo - como o Florida) porque não queremos passar a impressão de que ela possa ser algo que se dê contra o resto do Brasil. Pelo contrário: será um esforço de recuperar um espaço para a vanguarda brasileira, um portal para a exportação dos conceitos e serviços brasileiros para o mundo". Um nicho a ser explorado, que vem sendo discutido no âmbito do programa "Rio além do petróleo", projeto do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), com o apoio do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP) e da Secretaria de Desenvolvimento Econômico do governo do Rio: a de sermos a "capital mundial da energia e da sustentabilidade", um centro de produção e disseminação de conhecimento e de realização de negócios nestas áreas. Para André Urani, "ninguém mais no mundo reúne as condições que a M"bras reúne para ocupar esse lugar, com suas reservas de petróleo, sobretudo agora, com as descobertas do pré-sal, seus biocombustíveis, suas usinas nucleares, suas empresas de energia elétrica (Eletrobrás, Furnas, Light, Ampla, Eletropaulo, CPFL), seus centros de pesquisa, seus 50 parques naturais, sendo cinco dos quais nacionais. |
Entrevista:O Estado inteligente
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