Fazendeiro acusado de encomendar a morte
da freira Dorothy Stang é absolvido pelo júri
Ary Souza/O Liberal |
Vitalmiro Bastos (camisa branca) comemora com advogados o resultado do julgamento |
Há três anos, o assassinato da freira Dorothy Stang, então com 73 anos, mostrou ao mundo o estágio primitivo de algumas regiões do país. Executada com seis tiros, todos à queima-roupa, em Anapu, no sudoeste do Pará, Dorothy, uma americana naturalizada brasileira, era uma fervorosa defensora da Amazônia. Antes de ser morta, ela tentava implantar um projeto de desenvolvimento sustentável em uma área conflagrada pela disputa de terras entre fazendeiros e grileiros. O caso ganhou repercussão internacional e, talvez por isso, teve uma elogiável ação das autoridades envolvidas. Pouco mais de dois anos depois do crime, dois pistoleiros, o intermediário e os dois mandantes do assassinato já estavam presos e condenados a penas que variavam de dezessete a trinta anos de cadeia. Na semana passada, porém, um novo julgamento absolveu o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, apontado como o mandante do crime. O que explica a absolvição?
Carlos Silva/Imapress |
Dorothy Stang: seu trabalho incomodava os fazendeiros |
Ao se distanciar da natural sensação de impunidade e do sentimento de indignação, torna-se possível saber o que ocorreu – mesmo que ainda assim se torne difícil aceitar o veredicto. A lei penal brasileira prevê que pessoas condenadas a mais de vinte anos de prisão sejam automaticamente submetidas a um novo júri – a forma torta que se encontrou para prevenir erros judiciais flagrantes. O fazendeiro Vitalmiro beneficiou-se da lei. Sua defesa ganhou tempo para derrubar as frágeis evidências contra ele. No primeiro julgamento, uma das principais testemunhas de acusação era Amair da Cunha, que confessou ter sido o intermediário entre o fazendeiro e os pistoleiros que mataram a freira. Ele contou aos policiais que teria recebido 50 000 reais de Vitalmiro como pagamento pela contratação dos assassinos. No julgamento da semana passada, Amair mudou radicalmente sua versão. Disse que fora coagido por policiais a envolver o fazendeiro na trama. O tribunal do júri considerou que, à luz do novo depoimento e na ausência de provas adicionais do envolvimento de Vitalmiro, a absolvição se tornou inevitável.
Por que a principal testemunha contra o fazendeiro mudou sua versão inicial? A polícia do Pará não acredita na tese de arrependimento e abre novas frentes de investigação. A mais óbvia é tentar descobrir se a família do contratador de pistoleiros Amair da Cunha recebeu dinheiro do fazendeiro agora absolvido. Há indícios de que recebeu 100 000 reais às vésperas do segundo julgamento. Ouvido pela polícia, Vitalmiro confirmou a entrega do dinheiro, mas justificou-a como sendo resultado da compra de gado e terras da família de Cunha. Amair foi condenado a dezoito anos de prisão. O pistoleiro que executou a freira pegou pena de 27 anos. O fazendeiro Vitalmiro, absolvido da acusação de ser o mandante do crime, está livre.