Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 09, 2007

A USP sob controle dos invasores

Na última terça-feira, o reitor da Unicamp e presidente de turno do conselho dos reitores das três universidades estaduais paulistas, José Tadeu Jorge, fez uma observação que resume perfeitamente a sucessão de equívocos - do governo e das autoridades acadêmicas - no trato da afrontosa ocupação da Reitoria da USP. Ao protesto contra os decretos do governador José Serra, tidos como atentatórios à autonomia universitária, os ocupantes agregaram um rol de reivindicações as mais díspares. Seis dias antes, com um atraso revelador da escassa sensibilidade política do Palácio dos Bandeirantes diante do desassossego dos docentes daquelas instituições, Serra finalmente acedeu aos seus pedidos para editar um decreto declaratório que dissipasse as dúvidas suscitadas pelos dispositivos legais que deram origem ao problema e reiterasse formalmente o seu compromisso com a independência acadêmica e administrativa do sistema estadual de ensino superior.

Era apenas previsível, como este jornal assinalou no editorial A truculência premiada, que os invasores do centro de gestão e símbolo da maior universidade brasileira não se dariam por satisfeitos com o sensato gesto do governador e decidiriam manter a ocupação iniciada 27 dias antes. Melhor teria feito ele se comunicasse aos reitores e professores com quem dialogava que o texto esclarecedor só seria publicado depois que os baderneiros se retirassem da Reitoria. Infelizmente, assim não entendeu Serra, e tudo continuou na mesma. Foi o que levou o reitor da Unicamp a opinar, contra a realidade dos fatos e com inexplicável complacência, que seria necessário “um certo tempo para que as pessoas (os invasores) entendam o decreto do governador”. Isso aconteceria, profetizou, no final desta semana, quando, tendo visto a luz, “as pessoas” cairiam em si e dariam por finda a impune violência. Faltou combinar com elas.

Ontem, 36º dia da ocupação, os invasores decidiram permanecer na Reitoria pelo menos até o próximo dia 16, quando se realizará no local um encontro de estudantes “para discutir o ensino público no País”. Decerto a sua atuação no preparo do momentoso evento ajudará os invasores a espantar o tédio, para o que já hão de ter servido shows musicais, festa junina, participação no protesto punk, na Avenida Paulista, contra a reunião do G-8 - e para o que servirá a adesão à parada do orgulho gay.

O que fazer com o ócio é problema deles. O problema de São Paulo é a certeza de que o seqüestro da Reitoria só terminará quando e como os seqüestradores quiserem. Por esse deboche, as responsabilidades do governador José Serra e da reitora Suely Vilela são inegáveis. O primeiro se comporta como um manietado observador dos acontecimentos. Acusa os invasores, cobra dos universitários que combatam a ocupação - e diz que ela “já cansou”.

De seu lado e desde a primeira hora da crise, a reitora mostrou despreparo, incoerência, falta de senso da liderança e da autoridade indissociáveis do exercício do cargo. Acertadamente, pediu e obteve da Justiça a reintegração de posse da Reitoria, apenas para desmoralizar o mandado concedido, ao não fazer nada com ele, enquanto a prepotência se eternizava. Sujeitou-se a uma dezena de “negociações” com os invasores, quando deveria saber de antemão que negociar naquelas condições só poderia resultar no que resultou: numa vitória para os invasores. Numa ocasião, segundo transpirou, os invasores disseram ao secretário de Justiça, Luiz Antonio Marrey, que desejavam a presença da reitora na reunião seguinte, com o que ela concordou. Em dado momento do encontro, o secretário estranhou que os alunos só se dirigissem a ele. Os alunos “esclareceram” que a reitora estava ali só “para ouvir” - e ela não se retirou de pronto. Só na segunda-feira passada, em nova e aparentemente derradeira reunião, a reitora vinculou a manutenção das concessões já feitas à desocupação do prédio.

O balanço é desalentador. Duas ou três centenas de alunos, com o apoio de outros tantos professores e da tropa de choque dos funcionários, nenhum dos quais correndo qualquer risco, assumem o controle absoluto de uma instituição do porte da USP. Enquanto isso, a maioria silenciosa da comunidade acadêmica permanece em silêncio, com exceção de um pequeno grupo que ensaia um ou outro protesto que primará pela inocuidade.

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