Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, janeiro 08, 2007

PAÍS FECHA PACOTE DE AJUDA A BOLÍVIA, PARAGUAI E URUGUAI

8/1/2007
Sergio Leo

Bolívia, Paraguai e Uruguai serão alvo de um "pacote de bondades" do governo brasileiro, como parte do esforço do maior país sul-americano para reduzir as "assimetrias" na região, dar melhores condições de governo aos vizinhos e encorajar a integração do continente. O pacote inclui financiamentos e projetos de investimento para a Bolívia, facilidades de ingresso de mercadorias do Uruguai no Brasil e a discussão de compensações maiores ao Paraguai, pelo uso da energia de Itaipu.

A decisão, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi discutida em reunião reservada, quinta-feira, com seis ministros. O presidente exigiu que fossem eliminados, até a próxima reunião de cúpula do Mercosul, marcada para dias 18 e 19, no Rio, empecilhos burocráticos que travam a entrada de mercadorias dos vizinhos menores e dificultam o projeto de ajuda aos países pobres da região. "O Brasil não pode se comportar como um país pequeno", insistiu Lula, ao informar que não admite que entraves administrativos continuem esvaziando seus anúncios de medidas para beneficiar os vizinhos.

Não chegaram a ser pronunciados os nomes de George Bush e Hugo Chávez, mas as determinações de Lula ao ministério são um sinal evidente de que ele quer instrumentos mais eficazes para se contrapor à generosidade do venezuelano com a vizinhança, financiada com a receita de exportação de petróleo, e tentar neutralizar a atração exercida pelo mercado dos Estados Unidos sobre sócios como o Uruguai - que cobra do Mercosul liberdade para firmar um tratado de livre comércio com os americanos.

A Bolívia ocupou a maior parte da reunião de quinta-feira, quando se decidiu o mecanismo de engenharia financeira para "destravar" uma promessa de Lula ao presidente Evo Morales, o financiamento da compra de cem tratores (US$ 30 milhões) para o programa de desenvolvimento agrícola boliviano. Financiada pelo BNDES, uma parte da compra terá apoio do Proex Equalização, que cobre, a fundo perdido, a diferença entre os juros internacionais e as taxas brasileiras. Os bolivianos receberão, ainda, outras ofertas de financiamento e de investimentos.

Lula determinou que se atenda ao pedido de Morales para criação de uma fábrica de biodiesel em território boliviano. E vai oferecer ao governo boliviano apoio técnico para a reforma agrária local. O tom moderado adotado ultimamente pelos bolivianos nas negociações sobre gás com o Brasil encorajaram o governo brasileiro, que, até hoje, é criticado pela complacência com o cerco militar boliviano aos campos de gás bolivianos explorados pela Petrobras, quando Morales nacionalizou o setor, em maio.

"O Brasil sabe se fazer respeitar, e interessa a todos a estabilidade na região, a prosperidade da Bolívia", argumenta o assessor internacional do Planalto, Marco Aurélio Garcia, lembrando que, apesar das ameaças e atritos, foi garantido o fornecimento de gás ao Brasil, e a Petrobras teve autonomia para negociar com os bolivianos. A diplomacia argumenta que a cooperação "soberana" ajuda a fortalecer os elementos moderados na equipe de Morales.

Lula prepara "pacote de bondades" para vizinhos

Em relação aos paraguaios, já há a decisão política, no governo brasileiro, de aumentar as compensações ao país pela energia da Itaipu Binacional. Não há, porém, definição sobre como fazê-lo. A questão tem forte carga política no Paraguai, onde se acusa o Brasil de cobrar juros extorsivos à binacional e se alega que o país é obrigado a vender a energia que não usa de Itaipu a preço irrisório. A acusação, rechaçada pela administração de Itaipu, é mote eleitoral por lá.

"Há um aspecto sacrossanto em Itaipu: a energia que não for para o Paraguai tem de ir ao Brasil, é a essência do acordo para a usina", esclarece o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim. "Mas temos de encontrar uma compensação adequada ao Paraguai, e acredito numa solução que não prejudique o consumidor brasileiro."

Amorim comenta que o espírito integracionista do Planalto tem de chegar aos últimos escalões do governo, e exemplifica com a decisão, na reunião com Lula, de designar fiscais em tempo integral para a fronteira com o Uruguai, onde os uruguaios se queixam de retenção de cargas por falta de funcionários na alfândega brasileira. Lula ordenou ainda o fim das constantes retenções, por alegados motivos sanitários, dos embarques de água Salus, uruguaia - ironicamente produzida pela Ambev -, tema de constantes atritos entre os dois governos. "Quero servir água Salus na reunião do Mercosul", graceja Amorim. Outras medidas para Uruguai e Paraguai devem envolver o BNDES.

Lula sabe que nem todos os atos de seu programa para os vizinhos estarão prontos até a reunião de cúpula, mas quer as medidas, pelo menos "encaminhadas", segundo informa Garcia. "Vamos ter de trabalhar duro", comenta Amorim, claramente satisfeito por ver confirmada sua tese em favor de maior empenho para atender às queixas dos vizinhos menores. A reunião foi sugestão de Amorim, que, no dia 30, recebeu de Lula, no Planalto, o sinal verde para prepará-la. "O mais importante foi a mensagem do presidente, de que não se pode administrar sem ter uma percepção geopolítica dos interesses do Brasil na região", resume. "Todos ouviram claramente a mensagem e como se pretende ir adiante."

Todos, no caso, são Paulo Bernardo, do Planejamento, Guido Mantega, da Fazenda (representado, na reunião, pelo secretário-executivo, Bernardo Appy), a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, e os presidentes do BNDES, Demian Fiocca, e da Petrobras, José Sérgio Gabrielli (que foi acompanhado da diretora do programa de biodiesel, Graça Foster).

Ainda nesta semana será possível saber se as medidas em estudo pelo governo terão boa acolhida por bolivianos, paraguaios e uruguaios. Mas, ao realizar uma reunião de gabinete, três dias após a posse, só para debater um programa de ação com os países vizinhos, Lula dá um sinal claro do peso que dá ao tema, neste segundo mandato.

Arquivo do blog