Se bem executado, o pacote para turbinar
o crescimento pode melhorar a eficiência
do Estado. Mas não a da economia
Julia Duailibi e Giuliano Guandalini
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou na semana passada seu tão aguardado plano para "destravar" a economia do país. Na presença de 23 governadores, além de ministros e lideranças políticas, Lula expôs as principais linhas de um programa que prevê uma injeção de 503,9 bilhões de reais em investimentos entre 2007 e 2010. Assim, crê a equipe econômica, o Brasil crescerá daqui para a frente 5% ao ano – o dobro do registrado nas últimas duas décadas. O eixo central são projetos de infra-estrutura, como a recuperação de estradas e portos, a construção de usinas hidrelétricas e a ampliação do acesso a água e coleta de esgoto. Embora preconize um aumento dos investimentos públicos, o governo mostrou que manterá rigor no combate à inflação e a trajetória cadente do endividamento público (ver projeções).
O plano tem poucas novidades. Boa parte das iniciativas nele previstas já é conhecida. É o caso, por exemplo, de obras na usina de Tucuruí ou da pavimentação da BR-230, que já apareciam no Avança Brasil, uma iniciativa similar anunciada pelo governo Fernando Henrique Cardoso em 1999. Mesmo sem ser integralmente inédita, no entanto, a iniciativa de Lula tem virtudes. Ela acerta, por exemplo, ao organizar ações estratégicas até então espalhadas entre as três esferas de governo e coordená-las com agentes privados. Com isso, cria uma agenda por meio da qual poderá fiscalizar e ser fiscalizado na perseguição de suas próprias prioridades. Não é pouca coisa, considerando o fracasso de outras iniciativas que se perderam no poço sem fundo da incompetência gerencial do Estado brasileiro.
O problema do programa petista é que ele confia demais no papel do Estado, mostra-se tímido quanto às principais urgências econômicas do país e é insuficiente para atingir seu próprio objetivo de elevar o potencial de crescimento do PIB. Não se apresentou nenhuma reforma estrutural que desse a ele segurança jurídica, liberdade ou folga tributária definitiva para apostar no país. Também não se falou uma palavra sobre a reforma trabalhista. E o que é pior: em vez de propor a reforma da Previdência, o governo lavou as mãos, preferindo criar um grupo de trabalho para estudar o assunto – em "governês", criar um grupo de trabalho significa enterrar de vez o assunto. Para se ter uma idéia da dimensão do problema, 42 bilhões de reais esvaíram-se pelo gigantesco ralo da Previdência no ano passado.
Por conveniência de marketing político, o plano recebeu um nome de batismo fácil de ser decorado – PAC, abreviatura de Programa de Aceleração do Crescimento. Pelas contas da ministra da Casa Civil e idealizadora do PAC, Dilma Rousseff, pelo menos 76% dos 503,9 bilhões de reais sairão dos cofres governamentais de alguma maneira – via recursos das estatais, do próprio Orçamento federal ou por meio dos empréstimos de bancos públicos. O valor surpreende, mas, felizmente, não reflete nenhuma decisão do governo de arrombar os cofres públicos. O presidente Lula "resistiu à tentação fatal da heterodoxia", nas palavras do ex-presidente do BC Carlos Langoni, e procurou preservar a arquitetura macroeconômica. Há, nesse sentido, medidas cautelosas de isenção de impostos para alguns setores, como informática e construção civil, além de regras para conter o progressivo avanço na despesa com o funcionalismo público.
As propostas mais controversas e passíveis de questionamento jurídico são uma indexação do salário mínimo ao crescimento do PIB (o que tende a pressionar ainda mais as contas da Previdência) e a utilização dos recursos do FGTS (uma poupança exclusiva dos trabalhadores) para a criação de um fundo de risco destinado a investir em obras de infra-estrutura. Nada que comprometa (de vez) o controle fiscal. Resta fazer com que as obras de infra-estrutura saiam do papel – missão que caberá à ministra Dilma. Com o PAC, o governo tem como meta elevar a taxa de investimentos para algo em torno de 25% do PIB, patamar apontado pelos economistas como necessário para que o país possa crescer a taxas de 5% ao ano. Há muito tempo os investimentos permanecem estagnados em torno de 20% do PIB, nível insuficiente para destravar a economia.
Em resumo, trata-se de um plano que poderá até organizar a vida do Estado, mas não reduzir seu peso de elefante. O país esperava algo mais ambicioso e menos crente no papel do governo como condutor da vida das pessoas e das empresas. Se o PAC tem mesmo méritos, só se saberá quando e se for executado.
Alan Marques/Folha Imagem |
Foto Alan Marques/Folha Imagem |