Hugo Chávez não foi o único a fazer declarações extravagantes na recente reunião de cúpula do Mercosul. O mesmo ocorreu com o presidente Lula e seu chanceler.
Lula falou que “nunca existiu um clima político tão favorável para a nossa integração”, mas pode ocorrer exatamente o oposto do que ele disse: o Mercosul se tornar irrelevante. O chanceler condenou o “economicismo” e invocou a União Européia (UE) para justificar o ingresso da Venezuela por critérios políticos, afirmando que a geopolítica deu o tom na UE, uma meia-verdade.
O projeto de criação da UE amadureceu longamente. O pacifista Victor Hugo foi um dos primeiros a defendê-lo, em 1851. Ao fim da Primeira Guerra, a idéia já era proposta por governantes europeus. Depois da catástrofe da Segunda Guerra, a integração européia começou a vingar.
Em maio de 1948, líderes políticos reunidos em Haia no Congresso da Europa, incluindo Winston Churchill, resolveram que seus países deveriam ceder parte de sua soberania para viabilizar a integração. Anteviam a criação de organizações supranacionais para estabelecer normas aplicáveis a todos. Chávez provavelmente rejeitaria tal decisão.
A integração visava ao crescimento econômico, à segurança militar e à reconciliação duradoura entre a França e a Alemanha, que se haviam enfrentando em três guerras sangrentas nos séculos 19 e 20. O primeiro passo foi o Tratado de Paris (1951), pelo qual seis países - Alemanha Ocidental, Bélgica, França, Holanda, Itália e Luxemburgo - formaram a Comunidade Européia do Carvão e do Aço.
Em seguida veio o Tratado de Roma (1957), assinado pelos mesmos países. Criou-se a Comunidade Econômica Européia (CEE), a qual se ampliou ao longo dos anos. No início dos anos 90 eram 15 os seus membros. O processo se intensificou com a harmonização crescente das instituições européias. Todos adotaram o mesmo sistema tributário. Nos anos 70 passaram a coordenar suas políticas macroeconômicas, incluindo mecanismos de sincronização das taxas de câmbio.
A construção do espaço econômico comum se acelerou com a padronização de políticas públicas. Regras comuns se aplicaram aos múltiplos aspectos da vida econômica e social, de transportes a pesos e medidas. Nasceram o Parlamento Europeu e a Corte Européia de Justiça. A defesa da concorrência foi atribuída a um órgão supranacional.
Esse processo culminou no Tratado de Maastricht (1992), que estabeleceu a UE. A integração econômica atingiu o ápice com a criação da moeda única, o euro, e o Banco Central Europeu, supranacional e independente. Em 2002, deu-se o passo mais ousado, rumo à possível união política: o estabelecimento da Convenção sobre o Futuro da Europa com o encargo de elaborar uma constituição (ainda não aprovada) para a UE, então ampliada para 25 membros (hoje 27) com a entrada de países ex-comunistas.
Como se vê, na União Européia prevaleceram visões geopolíticas muito fortes, enquanto no Mercosul as razões econômicas parecem estar mais presentes. Na Europa, seus líderes fundadores estavam determinados a criar um bloco para se contrapor à ameaça que vinha da União Soviética e a eliminar o risco de outra guerra mundial. Apesar disso, ao contrário do que disse o chanceler, nenhum país se tornou membro da forma como a Venezuela entrou no Mercosul.
De fato, todos os novos membros se submeteram a complexas negociações e a um longo processo de convergência para compatibilizar suas instituições aos requerimentos econômicos, sociais e políticos da comunidade. Esse processo contribuiu para que a Espanha, Portugal e a Grécia acelerassem o caminho para a democracia.
Diferentemente do que disse Lula, a ideologia de Chávez e seu “socialismo do século 21” são incompatíveis com o Mercosul. Como ocorre na UE, a integração exige a combinação de economia de mercado e democracia.
A Venezuela não tem uma nem outra. Entre os retrocessos institucionais de Chávez está a futura eliminação da independência do banco central venezuelano, o que impediria eventual criação da moeda única na região.
Na verdade, não há ginástica retórica que justifique a maneira como a Venezuela se integrou ao Mercosul. Foi um erro crasso. Muito provavelmente, Chavez bloqueará acordos comerciais com os EUA e a Europa. Era importante integrar a Venezuela, mas não assim.
Entrevista:O Estado inteligente
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